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LUÍS NASSIF
As bandas feitas para dançar
Na semana passada escrevi
sobre a Orquestra Tabajara e seu líder Severino Araújo,
de longe a maior banda brasileira dos tempos modernos. Ousaria dizer de todos os tempos se
tivesse informações suficientes
sobre as orquestras de Fon Fon,
Vicente Paiva e Custódio Mesquita.
De qualquer modo, a Tabajara foi o retrato mais fiel de um
modelo interessantíssimo que
tomou conta da música instrumental brasileira nos anos 50 e
60: as orquestras da era pós-Glenn Miller.
Os cassinos trouxeram a influência das "big bands" norte-americanas. Dos anos 50, no
plano internacional sobressai
um som mais edulcorado, de
Ray Coniff e Percy Faith.
Mas as bandas dos anos 40
acabaram exercendo uma influência curiosa na América Latina, quando sua formação incorporou os ritmos latinos, especialmente a extraordinária influência de Cuba e, em segunda
instância, do México.
O mambo e o cha-cha-cha dominaram os salões, especialmente nos anos 50. A influência
vinha de Xavier Cugat, de Peres
Prado, em cuja banda tocou
meu amigo seu Luigi, que foi
barman do Maksoud Plaza.
No Brasil a expressão máxima
foi a Orquestra Tabajara. Foi
um período rico em orquestras,
como a do harpista Luiz Bordon, do saxofonista Moacir Silva, que se apresentava como
"Bob Fleming", do grande Zé
Menezes e seus "Velhinhos
Transviados", e de formações
provisórias usando nomes estrangeiros ou típicos, como
"Violinos Ciganos" e correlatos.
Naquele tempo era chique usar
nomes cubanos ou mexicanos.
Danças
As danças de salão ainda predominavam, herdeiras da tradição dos cassinos.
Dentre os conjuntos feitos para dançar, dois se sobressaíram
amplamente, o de Valdir Calmon, no Rio de Janeiro, e o de
Silvio Mazzuca, em São Paulo.
Tenho a impressão de que, em
nenhum outro período da história, se vendeu tanto música instrumental como naquele, em
grande parte graças aos dois,
mais Severino Araújo.
Valdir Calmon era pianista
mineiro de Rio Novo, onde nasceu em 1982. Em 1936 seguiu para a Meca, Rio de Janeiro, com
carta de apresentação para o
flautista Benedito Lacerda.
No início da carreira tocou
nas rádios Guanabara e Transmissora, e ajudou a divulgar as
obras de Ataulfo Alves e Wilson
Batista.
Desistiu da música quando a
mãe morreu e foi servir no Batalhão de Guardas da Presidência
da República na Segunda Guerra Mundial, tendo como companheiro de caserna Dick Farney. Voltou à música e a partir
de 1944 integrou o elenco da rádio Globo.
Estreou em disco em 1951, justamente gravando boleros. Mas
seu grande salto foi anos depois
quando se mudou para as Emissoras Associadas e passou a participar de programas diários
"feitos para dançar", com narração de Luiz Jatobá, o maior
locutor brasileiro da história.
Recordes
De 1955 a 1967 a série "Feitos
para Dançar", com seus solos de
piano, bateu recordes de venda.
O lançamento de 1957 vendeu
cem mil exemplares.
Seu maior sucesso é o "Na Cadência do Samba", com Luiz
Bandeira, que se tornou o hino
do futebol brasileiro ao servir de
abertura para o programa Canal 100, de Carlos Niemayer, o
maior registro do futebol brasileiro do período.
Calmon faleceu em 1982.
A contraparte paulista da história é o pianista e arranjador
Silvio Mazzucca, nascido em
1919, e que se notabilizou com
sua série de discos "Bailes de
Formatura", que ainda provocam suspiros saudosos nos marmanjos, tanto pelas músicas como pelas formandas.
Mazzucca é típico herdeiro da
influência musical italiana do
Bexiga, onde passou a infância.
Em 1932 começou a atuar na
Orquestra de Nicolino Leocatta,
em um clube da Major Diogo. E
também se inebriou com os ritmos cubanos.
Em 1938 ingressou na Tupi,
atuando como solista de piano
e, depois, tornando-se conhecido por seu vibrafone.
De 1950 a 1960 foi contratado
exclusivo da rádio Bandeirantes, do inesquecível João Saad. E
não houve som que o superasse
em todo o interior do Estado de
São Paulo.
Mazzucca está forte e rijo.
Transição
Peguei o final desse período.
Na minha adolescência, nos
bailes de interior a velha guarda
do mambo jambo foi sendo gradativamente substituída por
conjuntos como o Super Som
TA, o 3 do Rio, o inigualável
Modern Tropical Quintet, que
tinha como crooner minha amiga Sara.
As velhas orquestras ainda sobrevivem aqui e ali. Tem o
Maestro Duda de Recife, e a do
saxofonista Ivanildo, que ainda
vai me obrigar a ir a Maceió só
para conhecê-lo.
Mas os sons comerciais das velhas orquestras, mesmo vistos
meio de lado pelos puristas da
época, ajudaram muito na sobrevivência e na modernização
da música popular brasileira
instrumental, a que antecede e
amplia o alcance dos nossos
"canários".
E-mail - lnassif@uol.com.br
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