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OPINIÃO ECONÔMICA
Infra-estrutura, desafio de tirar o sono
BENJAMIN STEINBRUCH
Os candidatos a presidente
da República que quiserem
ter uma noite de insônia podem
acessar o site da Confederação
Nacional da Indústria
(www.cni.org.br) e examinar o
documento "A Indústria e o Brasil: Uma Agenda para o Crescimento". O trabalho apresenta a
visão do setor industrial sobre temas prioritários que o país deve
enfrentar para retomar um vigoroso crescimento econômico, sem
o que não haverá paz social por
aqui.
Qualquer um que chegar ao fim
das 152 páginas do documento terá de concluir que não é fácil governar bem o Brasil. São enormes
os desafios que esperam pelos próximos presidentes, mesmo tendo
o país já alcançado a velha ambição nacional da estabilidade de
preços.
Não pretendo me fixar nas propostas do documento. Quero apenas destacar um de seus capítulos, o que detalha a situação da
infra-estrutura do país, praticamente destruída ao longo dos últimos anos por conta de políticas
que impediram investimentos.
Excluídas as obras realizadas
pela iniciativa privada, especialmente na área das telecomunicações, quase nada se fez na última
década para produzir energia,
construir e manter estradas e portos, bem como para expandir o
saneamento básico. Em consequência desse descaso, segundo
estimativa dos técnicos que elaboraram o trabalho da CNI, o presidente que tomará posse em 1º de
janeiro de 2003 terá de investir
cerca de R$ 140 bilhões em quatro
anos se quiser superar o déficit
hoje existente em matéria de infra-estrutura.
Essa cifra pode ser um pouco
exagerada. Com a participação
do setor privado, em alguns casos,
é possível alcançar bons resultados sem tanta sangria de recursos
públicos. De qualquer forma, ao
viajar pelo país, qualquer leigo
enxerga a deterioração nessa
área.
Não temos ferrovias modernas,
que seriam essenciais para o
transporte barato de mercadorias
num país continental. A malha
existente é resultado da fusão de
várias ferrovias antigas, muitas
ainda do tempo do Império. Os
trilhos cortam os morros em ziguezague e movimentam cargas
precariamente, a uma velocidade
média de tartaruga, de 15 km por
hora, em comparação com 40 a 50
km em países como Canadá e Estados Unidos.
Mais de 60% de nossas rodovias
pavimentadas estão em estado
deficiente de conservação. Para
sua recuperação, conservação e
expansão serão necessários recursos da ordem de R$ 18 bilhões nos
próximos quatro anos, mesmo
tendo em conta a possibilidade de
parcerias com a iniciativa privada. A solução via privatização, já
ensaiada nas regiões mais ricas,
tem imposto um pesado ônus ao
transporte por causa do encarecimento dos pedágios. Em São Paulo, depois da privatização, o pedágio cobrado dos caminhões já
aumentou 340%, com evidentes
problemas para o custo do frete e
para a competitividade dos produtos nacionais.
As hidrovias, num país cortado
por milhares de rios, praticamente não existem. Apenas 1% da
movimentação total de cargas se
faz por esse meio. Os portos marítimos são ineficientes e caros. Debatem-se com elevados passivos
trabalhistas e burocracia do processo aduaneiro.
Nossas companhias aéreas sofrem a concorrência predatória
das rivais internacionais, operam
com déficits monumentais e têm
parcas perspectivas de recuperação devido à ineficiência, à tributação excessiva, à falta de capital
e ao mercado escasso.
Na área da energia, tomamos
um susto homérico com o racionamento do ano passado. Fomos
salvos pela misericórdia de são
Pedro. Depois que as chuvas vieram, adiaram-se programas
emergenciais de termelétricas e
outras fontes geradoras de energia elétrica. Um plano lançado
em fevereiro de 2000, que previa a
construção de 43 usinas térmicas
até 2003, não saiu do papel. Para
ficarmos livres de novos sobressaltos, segundo a estimativa da CNI,
seria preciso investir R$ 55 bilhões
em quatro anos.
O saneamento básico é uma calamidade nacional. A concessão
de serviços à iniciativa privada,
embora isso nem sempre represente solução, está parada porque
falta uma definição legal sobre a
titularidade das empresas de saneamento. Ou seja, não se sabe
ainda se os donos desses serviços
são os Estados ou os municípios,
indefinição que obviamente impede a concessão da operação ao
setor privado. Enquanto isso, não
há investimentos no setor e 52%
dos municípios permanecem sem
serviço de coleta de esgoto, com
reflexos diretos na mortalidade
infantil e na saúde pública. Cerca
de 65% das internações hospitalares de menores de dez anos decorrem de doenças causadas pela
precariedade das condições do saneamento.
Se o próximo presidente da República quiser focar sua atuação
no crescimento econômico, precisa desde já começar a perder o sono com os problemas da infra-estrutura. Não haverá um novo ciclo de expansão da economia sem
maior geração de energia, sem recuperação das vias de transportes
e sem aplicações maciças de recursos em saneamento. Tudo isso
é básico para atrair os investimentos nacionais e estrangeiros
que vão sustentar essa nova fase
de crescimento, uma demanda legítima e incontestável da sociedade brasileira.
Benjamin Steinbruch, 47, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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