São Paulo, terça-feira, 07 de maio de 2002

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ARTIGO

Fundo "urubu" atrai ira global

DO "FINANCIAL TIMES"

Os fundos de investimentos conhecidos como "urubus" vêm atraindo a ira da comunidade internacional por estarem solicitando o pagamento pleno das dívidas dos países pobres mesmo em caso de moratória. O Banco Mundial está preocupado com a possibilidade de que os fundos de investimento recorram à Justiça para receber o que lhes é devido. O Instituto de Finanças Internacionais, associação mundial de instituições financeiras, pediu uma estratégia judicial mundial para bloquear essas atividades. No último domingo, o chanceler do Erário (ministro das Finanças) britânico Gordon Brown deixou claro que apóia medidas de repressão aos "urubus".
A desaprovação a esse tipo de comportamento se baseia em três preocupações legítimas. Primeiro, os países mais pobres não dispõem dos recursos para combater processos judiciais e, assim, em lugar de recorrerem aos tribunais, preferem pagar suas para o limitado número de credores que se recusam a aceitar programas de reestruturação de dívidas. Os programas são solapados se a assistência fornecida pelos governos dos países ricos termina transferida a credores do setor privado e advogados, e não ao povo dos países em desenvolvimento.
Segundo, as ações de uns poucos credores podem retardar um acordo de reestruturação da dívida que interessa a outros credores. Terceiro, as ações dos "urubus" contra os acordos de reestruturação ameaçam bloquear qualquer progresso rumo à adoção generalizada de procedimentos mais ordeiros para lidar com a falência de governos devedores.
Mas reprimir os fundos de investimento "urubus", como sugerido por Brown, é um equívoco; esse tipo de instituição pode oferecer liquidez adicional aos mercados de dívida por meio da compra de títulos de dívida soberana de países problemáticos, quando existe pouca demanda por eles de outra maneira.
O esclarecimento dos direitos legais de credores individuais é uma abordagem muito mais promissora. Existem poucos precedentes, mas emergiu um consenso jurídico em torno de uma decisão -considerada incorreta- de um tribunal de apelações da Bélgica, em um caso contra o Peru em 2000, no sentido de que o governo peruano não tinha o direito de favorecer certos credores que haviam aceitado um plano de reestruturação da dívida. O consenso atual é que a decisão foi uma interpretação errônea das cláusulas padronizadas nos contratos de bônus do governo. Os credores e a comunidade internacional precisam garantir que os países pobres recebam assistência jurídica em futuros processos desse tipo.
As ações dos fundos "urubus" uma vez mais colocam em destaque a necessidade de uma abordagem mais ordeira com relação aos processos de falência de governos devedores. Nada deveria impedir esses fundos de adquirir títulos de dívida de países com problemas, mas não deveria ser permitido que eles mais tarde bloqueiem acordos de reestruturação de dívidas que permitiriam que os países pobres mantivessem o serviço de suas dívidas em dia e reconquistassem o acesso aos mercados internacionais.


Tradução de Paulo Migliacci


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