São Paulo, sábado, 07 de setembro de 2002

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EM TRANSE

FMI exige pela primeira vez do Brasil a criação de norma legal obrigatória, sob pena de suspender os desembolsos

Fundo aprova socorro com cláusula inédita

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

A Diretoria Executiva do FMI (Fundo Monetário Internacional) aprovou ontem o pacote de socorro de US$ 30,4 bilhões para o Brasil por meio de um acordo que estende até junho de 2003 um esforço fiscal próximo de 3,88% do PIB (Produto Interno Bruto) e cria condições inéditas para que o país receba os desembolsos do novo empréstimo.
A aprovação ocorreu durante sessão em que os diretores-executivos do Fundo (representantes dos países membros do FMI) debateram o processo eleitoral, a relação entre a dívida pública e o PIB e o ajuste da balança comercial brasileira.
Os diretores ficaram satisfeitos com a garantia, relatada a eles pela gerência da instituição, de que os quatro principais candidatos à Presidência estão dispostos a manter os termos do acordo caso sejam eleitos. No entanto, ninguém fez referência ao fato de que as assessorias econômicas dos candidatos terem se rebelado, na quinta-feira, contra cláusulas do novo acordo que diziam desconhecer. Segundo esses assessores, vários pontos do novo acordo não foram mencionadas pelo presidente Fernando Henrique Cardoso aos candidatos durante reunião que o presidente promoveu no dia 19 de agosto para relatar a eles o resultado das negociações.
O Memorando Técnico de Entendimento entre o governo brasileiro e o FMI foi divulgado na quinta-feira à noite no Brasil e ontem em Washington. Ele contém novidades, tanto para esse ano quanto para 2003.
No campo das reformas estruturais, o acordo exigiu que o governo promova a "edição" de uma "medida legislativa" transformando o PIS, que é um imposto sobre o faturamento, num imposto sobre valor agregado.
É a primeira vez que o FMI exige do Brasil a criação de uma norma legal obrigatória, sob pena de suspender os desembolsos. Essa exigência, chamada de "critério de desempenho estrutural", já era feita há anos em acordos do FMI com outros países emergentes.
O acordo não esclarece se essa exigência encerrou-se na semana passada com a simples edição da medida provisória 66 - que mudou a base de cálculo do PIS-, ou se o Fundo também exige que o Congresso transforme essa medida provisória em lei.
Indagado sobre o assunto, um funcionário do Fundo ligado às negociações esquivou-se da pergunta. Segundo ele, trata-se de um detalhe insignificante porque todos os partidos já teriam demonstrado apoio a essa reforma.
O acordo também contém várias novidades no campo fiscal.
Além de elevar a meta de superávit primário até dezembro de 2002 de 3,75% para 3,88% do PIB, o acordo prevê a extensão desse novo esforço fiscal até junho de 2003, durante o primeiro semestre do próximo governo. No entanto, o objetivo continua sendo atingir um superávit acumulado de 3,75% em setembro do próximo ano.
Diferentes versões sobre esse patamar de 3,75% são a raiz da principal controvérsia entre o candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, e o governo. Desde junho, Lula diz estar comprometido com um superávit primário "máximo" de 3,75%. Coincidentemente, esse é o patamar anunciado pelo FMI logo após o anúncio do acordo, em agosto - só que no sentido inverso. Segundo o Fundo, os 3,75% são o patamar "mínimo" de esforço fiscal, e não o máximo.
Indagado sobre essa divergência, o funcionário do FMI disse que a meta de superávit acumulado para 2003 continua sendo de 3,75%, mas que, em nenhum momento o FMI comprometeu-se a não elevá-la.
Segundo ele, o FMI irá verificar, trimestralmente, se a meta será suficiente para equilibrar a relação entre a dívida e o PIB. Novos aumentos do superávit ao longo do ano não estão descartados.
Outra novidade do acordo foi a exclusão dos papéis do governo do cálculo de reservas brutas, reduzindo um pouco as vantagens da elevação do poder de fogo do BC para atuar no mercado de câmbio. Esse poder foi fortalecido pelo novo programa ao determinar a redução de US$ 15 bilhões para US$ 5 bilhões do piso líquido das reservas internacionais.
LEIA MAIS sobre FMI e os candidatos no caderno Eleições


Leia a íntegra do Memorando Técnico de Entendimento do Fundo na Folha Online
www.folha.com.br/022481



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