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São Paulo, domingo, 07 de setembro de 2003

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BALANÇO NEGATIVO

Fracasso nas negociações para salvar empresa poderá afetar a economia de cidades de SC, PR e RS

Dívida de R$ 1 bi leva Chapecó ao colapso

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Depósito vazio onde eram guardados produtos congelados da Chapecó; empresa pode ser vendida ou transformada em cooperativa


MARI TORTATO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CHAPECÓ

Com quase R$ 1 bilhão em dívidas, a indústria de alimentos Chapecó interrompeu há quatro meses a produção de seus cinco frigoríficos. Antes da interrupção, porém, 7 milhões de frangos morreram por canibalismo em aviários na região de Chapecó (cidade de Santa Catarina onde fica a sede do grupo).
Sem dinheiro para comprar ração, a direção da empresa omitiu a crise financeira dos parceiros e estimulou a produção de ovos nas incubadoras, distribuindo os pintinhos de um dia para os aviários.
"[A direção do grupo] seduziu os parceiros a acreditar que haveria solução imediata para a crise, quando não tinha mais crédito nem para comprar ração", diz o presidente do Sindicato dos Criadores de Aves de Chapecó, Valdemar Kovaleski. A operação "abafa" teria tido a ajuda dos políticos da região, sob o argumento de que era preciso evitar o colapso.
Quarta maior produtora do país de suínos, frangos e derivados num passado recente, a Chapecó joga dentro de oito dias as últimas cartas para driblar o risco de ter uma história de 50 anos apagada.
Os controladores da empresa -liderados pelo grupo argentino Macri (dono de 65,31% das ações do grupo), junto com dois bancos credores (ABN Amro e Fator)- tentam até o próximo dia 15 convencer o grupo francês Dreyfus a comprar a marca.
O fracasso das negociações pode significar o desemprego de 5.000 pessoas e o desaparecimento da atividade pecuária de suíno e frango de 2.000 propriedades espalhadas pelo oeste de Santa Catarina e do Paraná, e na região de Santa Rosa, no Rio Grande do Sul.
O grupo Dreyfus aceita assumir a indústria pagando R$ 175 milhões. O atual diretor-presidente da empresa, Celso Schmitz, 60, disse à Folha que o capital imobilizado da Chapecó está cotado em R$ 290 milhões.
Antes disso, porém, os acionistas da Chapecó terão de convencer os bancos credores a fechar um acordo que prevê o deságio de 90% nas dívidas da empresa.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) está no topo da pirâmide dos bancos que não recebem da Chapecó há mais de um ano. Tem a receber R$ 500 milhões. O BNDES também é dono de 29,65% das ações do grupo.

Omissão de informação
O prefeito de Chapecó, Pedro Uczai (PT), confirma o acordo entre sete prefeitos, fornecedores da região e os gestores da empresa para segurar a informação da crise -até que os frangos começaram a se matar.
Ele é acusado por vereadores de oposição de ter enganado a sociedade com uma campanha de mídia que anunciava a "salvação da Chapecó" em maio. "Foi propaganda enganosa", afirma Márcio Ernani Sander (PP).
Um dos líderes da articulação que apela ao presidente Lula por uma solução política de sobrevivência da Chapecó, Uczai diz que seus adversários submetem o interesse social da questão ao da disputa partidária.
Segundo o prefeito, ele não espera do BNDES o papel de "hospital" da Chapecó, mas acha que o banco tem como garantir financiamento ao grupo Dreyfus. "O BNDES não vai colocar nem mais um real na Chapecó", diz.
A segunda alternativa discutida é a transformação da empresa em cooperativa, e a terceira, o fracionamento do complexo. Em 2001, a Chapecó faturou R$ 683 milhões e, em 2002, R$ 659 milhões.

Histórico
O frigorífico Chapecó existe desde 1952. O pioneiro do empreendimento foi o empresário Plínio Arlindo De Nez, político influente na região, já morto.
Em 1997, seu herdeiro Plínio Arlindo de Nez Filho (o Maninho) foi afastado do comando da empresa após uma renegociação de dívidas. Hoje, está envolvido em negócios de artigos esportivos, entre Florianópolis, Joinville e Chapecó. Procurado pela Folha, não quis dar entrevistas.
O grupo Macri entrou na Chapecó em novembro de 1999, quatro meses após fechar um acordo com o BNDES. Assumiu uma dívida que caiu de US$ 285 milhões para US$ 147 milhões (com o dólar cotado a R$ 1,95) depois do socorro do banco de fomento.
"Quando o grupo Macri assumiu, quis enfeitar tanto a noiva acreditando que iriam achar um noivo [sócio] de imediato, mas essa noiva custou muito caro e só aparecia noivo pobre", diz o agropecuarista Edir Tauffer, 54.
Com quatro aviários com capacidade para 16 mil frangos por lote, Tauffer ainda espera a promessa da Chapecó de pagar R$ 8 por dia de indenização aos parceiros parados, receber por oito lotes ainda pendentes e zerar um investimento de R$ 68 mil nos barracões de aves, que a empresa exigiu que fizesse neste ano.
Kovaleski diz que a maioria dos produtores não quebrou com a paralisação porque mantém produção diversificada nos sítios e fazendas. "Mas teve gente vendendo bergamota [tangerina] nas ruas de Xaxim [sede da unidade de abate de frango] para pagar a conta de energia."


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