São Paulo, terça-feira, 07 de outubro de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Tiro no "pé no freio"!


Antes, os emergentes eram os primeiros a entrar e os últimos a sair da crise; agora, eles podem fazer o contrário

A DECISÃO mais importante que o país terá de tomar nos próximos dias será certamente sobre o jeito brasileiro de enfrentar as conseqüências da crise financeira internacional, que ontem chegou a um nível inimaginável, com reflexos dramáticos no mercado local. Como se poderia esperar, já se levantam as vozes de sempre, hostis a políticas de desenvolvimento, para aconselhar o governo a pisar no freio e a reduzir o crescimento da produção interna.
O que essas vozes sugerem, portanto, é que tranquemos a porta e fiquemos amedrontados debaixo dos cobertores até que o tempo melhore lá fora. Essa atitude é imprópria, porque contraria o bom-senso e ignora o novo papel que os países emergentes assumiram na economia global. Se o mercado internacional já vai impor uma desaceleração da produção interna, por meio da redução do comércio global, é natural que se tente compensar essa desaceleração com estímulos ao mercado interno. Ao fazer o contrário -pisar no freio-, o governo vai maximizar os efeitos da crise externa.
É óbvio que esses estímulos devem ser criados sem loucuras e sem exageros. Inflar gastos correntes do governo, por exemplo, como vem sendo feito com reajustes salariais do funcionalismo, está fora de propósito. Mas é inadmissível pensar em redução de investimentos públicos, principalmente aqueles que geram mais empregos e aumentam as condições competitivas da economia brasileira pela melhoria da infra-estrutura. Igualmente, não se pode descuidar do crédito a setores básicos, como a exportação, a agricultura e outros que não impactam muito as importações, como a construção civil, para não agravar o déficit em conta corrente.
A seqüência dos fatos se encarregou de mostrar que o medo da inflação de demanda, que justificou os últimos aumentos absurdos na taxa de juros, era exagerado. Agora, com os países ricos à beira da recessão, esse discurso não faz mais nenhum sentido. A ameaça da volta do dragão da inflação virou piada. No fim de setembro, segundo pesquisa da FGV (Fundação Getulio Vargas), cinco em sete capitais brasileiras registraram deflação.
Outro ponto fundamental nesse debate é entender que, sem ilusões megalômanas, quando passar a crise aguda dos mercados, o Brasil e outros emergentes terão a responsabilidade de dar uma contribuição importante para a economia internacional. Eles não terão o poder de impedir a retração das economias do Primeiro Mundo, mas sua colaboração tem a ver com uma situação nova no cenário econômico mundial.
Nas crises anteriores, os emergentes eram os primeiros a entrar e os últimos a sair. Agora, eles têm a possibilidade de serem os últimos a entrar e os primeiros a sair.
Tanto quanto o pacote americano aprovado na semana passada, as medidas internas, ainda que imperfeitas, devem ser voltadas para restaurar o crédito e preservar ao máximo o crescimento da produção e do emprego. Quem acha que isso é menos importante, certamente não refletiu sobre os horrores da depressão dos anos 1930 e suas conseqüências para a sociedade do século 20, entre elas a Segunda Guerra Mundial.
O Brasil já tem um enorme mercado interno. A população de classe média, incluída na sociedade de consumo, passa de 110 milhões de pessoas, e outros 70 milhões estão aí para serem agregados a esse grupo.
Não se pode admitir que o ímpeto empresarial de investir e fazer crescer os negócios seja sufocado pelo discurso do "pé no freio". Seria um tiro no pé.

BENJAMIN STEINBRUCH, 55, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br



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