São Paulo, domingo, 07 de novembro de 2004

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Inadimplente, pioneiro aguarda certificação

DO ENVIADO AO PARÁ

O mineiro Antônio Leite, 39, comandou a primeira experiência de concessão florestal em terra pública no Brasil, um contrato para a extração de madeira na Floresta Nacional do Tapajós, em Belterra (PA). Hoje dirige uma empresa pioneira, a Maflops, que faz manejo florestal em terras de assentados do Incra, dando infra-estrutura (estradas e casas) aos colonos em troca de direitos exclusivos de exploração. O resultado? "Estou no Serasa."
Leite deve cerca de R$ 1 milhão à Cemex, madeireira de Santarém que financiou a constituição da Maflops e que compra quase toda a madeira que ele extrai no assentamento Moju, perto de Belterra. Fez compras de maquinário e insumos com cheques pré-datados, que foram devolvidos. Com a greve do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), não pôde transportar madeira da floresta para a serraria para ser vendida.
"Como eu não tenho garantias reais, porque trabalho com maquinário alugado, não consigo financiamento do Basa [Banco da Amazônia]."
Mesmo com os percalços financeiros, a Maflops, aguarda a certificação pelo FSC, que deve ocorrer no ano que vem.
O sistema de produção da Maflops é único na Amazônia. A empresa é uma prestadora de serviços, que aluga máquinas, extrai as árvores e faz a intermediação da venda da madeira entre associações de colonos dos assentamentos Moju 1 e Moju 2 e a Cemex.
Cada assentado tem um lote de 100 hectares, dos quais pode desmatar 20 para agricultura. A Maflops maneja a madeira nas reservas legais. Além de comprar a madeira, a empresa constrói e mantém estradas no assentamento e ajuda a delimitar os lotes.
Pela madeira, os colonos recebem cerca de R$ 16 mil a R$ 18 mil, dependendo do quão abençoada for a sua floresta para espécies de valor comercial. "Já teve gente que ganhou R$ 40 mil", afirma Leite, cuja presença no assentamento ajudou a frear os madeireiros clandestinos -o que já lhe rendeu várias ameaças de morte.
O problema é que, dentro do sistema de manejo, cada área precisa "descansar" até 30 anos para que a floresta se regenere. Nesse meio-tempo, o dono do lote precisa viver de outra coisa. "Ganhamos R$ 10 mil com madeira e estamos investindo em uma plantação de cacau", diz Socorro Pacatuba, 41, presidente de uma das nove associações de assentados que têm acordo com a Maflops.
A empresa tem quatro programas de renda para os colonos: mecanização de lavouras, especialmente arroz, extração de óleo de andiroba -uma andirobeira derrubada vale R$ 70 pela madeira, mas seu óleo rende R$ 125 ao ano-, plantação de curauá, fibra que é a nova vedete da indústria automobilística, e apicultura.
O sistema Maflops está tendo sua expansão para outros locais da Amazônia estudada pelo Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). Por ser inédito, não se enquadra em nenhuma linha de crédito dos bancos. O que é um problema para Leite.
"Não quero nada de graça, mas, já que estou fazendo o que o Estado deveria fazer, só queria que os bancos me atendessem como atendem os plantadores de soja."


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