São Paulo, terça-feira, 08 de janeiro de 2002

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OPINIÃO ECONÔMICA

Emprego, a guerra santa

BENJAMIN STEINBRUCH

Pergunte a um economista quais são as consequências do desemprego e ele certamente fará um discurso mais ou menos assim: a destruição de postos de trabalho reduz o poder de compra da população, o que resulta em redução do crescimento econômico, estagnação e até recessão. O desemprego também tem impacto negativo direto na distribuição de renda e no próprio equilíbrio fiscal do governo. Com a queda da renda, caem também as receitas do governo e da Previdência Social. Em resumo, a redução de postos de trabalho compromete o desenvolvimento de um país.
Esse discurso é obviamente correto, mas está longe de apresentar a face mais dramática do desemprego para a sociedade. O Brasil de hoje, que se prepara para eleger o novo presidente da República, precisa se sensibilizar muito mais com os efeitos destruidores do desemprego para as pessoas e para as famílias.
Os homens do governo e os próprios empresários do setor privado têm a obrigação de se imaginar no lugar de alguém sem emprego na atual sociedade brasileira, que praticamente não oferece nenhuma proteção ao desempregado.
Um pai ou uma mãe de família sem emprego não podem ser olhados apenas como um número. Eles perdem totalmente a dignidade humana e a cidadania, uma vez que ficam impossibilitados de honrar seus compromissos sociais, oferecer alimentação saudável aos filhos e de cuidar de sua saúde e educação.
Os bons homens e mulheres brasileiros sem emprego são levados a se sentir como párias da sociedade, vítimas da desesperança. Na sociedade capitalista, o desemprego de longa duração, que ocorre hoje no Brasil, deteriora o ambiente familiar, afasta amigos, leva à solidão, ao alcoolismo e, algumas vezes, até ao suicídio. Esta é a cruel realidade.
Você, leitor, que chegou até este trecho deste artigo, pode eventualmente considerar meu discurso demagógico. Nesse caso, você provavelmente nunca sentiu na carne o desemprego de longa duração. Tente imaginar, então, uma situação prática. Quem fica sem emprego no Brasil não perde apenas o salário mensal, mas também inúmeros direitos e benefícios concedidos atualmente aos empregados: INSS, contagem de tempo para a aposentadoria, depósitos no PIS e no FGTS, férias remuneradas, convênio de assistência médica, auxílio-refeição, seguro de vida em grupo, adicionais por tempo de serviço, creche para os filhos, ambulatórios etc. O limitado seguro-desemprego existente no Brasil está longe de suprir todas essas perdas.
O efeito destruidor do desemprego obriga o governo a olhar a questão com o cuidado e a urgência que ela merece. É preciso entender o que está acontecendo no âmbito mundial neste início de século e de milênio.
A verdadeira guerra santa não é a do Afeganistão. É a guerra do emprego. No fundo, o que se discute em fóruns internacionais como OMC, Alca e Mercosul não é o comércio, mas a criação de postos de trabalho. Trata-se de saber quem vai ganhar uma guerra em que exportar significa emprego e importar, desemprego.
Nesse aspecto, é uma ótima surpresa o trabalho do ministro do Desenvolvimento, Sergio Amaral. Seu empenho no estímulo aos setores competitivos e exportadores, contra a opinião de muitos, indica que ele captou a importância de entrar na guerra do milênio para vencer. O Brasil vai iniciar uma série de negociações bilaterais e multilaterais neste ano, com países da América Latina, China, União Européia e no âmbito da Alca. O sucesso nessas negociações vai significar empregos; o insucesso, desemprego.
Exportar é a forma mais rápida de criar empregos. Mas há que se olhar também para outras soluções tradicionais de estímulo a setores absorvedores de mão-de-obra, como turismo, construção civil e agricultura. Quando essas ações são relegadas ao segundo plano, como infelizmente ocorreu nos últimos anos, salta aos olhos uma característica que não fica bem a nenhum governo: insensibilidade social.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.

E-mail: bvictoria@psi.com.br



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