São Paulo, terça-feira, 08 de fevereiro de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA

Bye, bye empregos

BENJAMIN STEINBRUCH

Que diferença faz um ano! Tirei essa frase exclamativa de um texto da jornalista Flavia Sekles, correspondente do "Jornal do Brasil" em Washington. É muito feliz. Demonstra a estupefação de quem olha para trás e observa uma fotografia da economia brasileira tirada em janeiro passado. Naquele início de ano, o Banco Central havia tido três presidentes em uma semana, a política cambial mudara radicalmente e o real se desvalorizava de forma assustadora.
Diante desse quadro, previa-se a catástrofe para 1999: a inflação explodiria e o país se atolaria numa recessão profunda, com queda superior a 5% no Produto Interno Bruto. Esse sacrifício seria consequência da desvalorização do real, medida que, em contrapartida, estimularia fortemente as exportações e desestimularia as importações. O resultado seria um superávit comercial estimado em até US$ 11 bilhões, suficiente para o país equilibrar suas contas externas.
Um ano depois desse momento tenebroso da recente história da economia brasileira, é muito curioso observar como a realidade se encarregou de desmentir a todos. Os pessimistas de plantão, que previam o caos inflacionário e a recessão, foram contrariados porque os preços subiram apenas moderadamente e porque a economia até conseguiu um ligeiro crescimento. Os governistas incorrigíveis, que apostavam no efeito favorável da desvalorização cambial para a produção de um grande superávit no comércio externo, tiveram de engolir a confirmação de um déficit de US$ 1,19 bilhão.
Por que tudo isso aconteceu? Que lições podemos tirar desse episódio?
A inflação não disparou por uma série de fatores. O principal deles foi a forte reação dos agentes econômicos contra o repasse dos aumentos de custos. Lembro-me de que, no primeiro semestre do ano passado, setores do comércio e da indústria relutaram em aceitar aumentos de preços, numa demonstração de que a velha indexação, que tanto realimentou a inflação brasileira nas últimas décadas, está finalmente dizendo adeus.
As razões pelas quais frustraram-se as previsões sobre o superávit comercial também são conhecidas: queda dos preços das commodities, aumento do petróleo importado e reação defasada ao incentivo dado pela desvalorização cambial.
Tudo isso é passado. As exportações vão reagir neste ano. A recuperação será forte e já começou, a julgar pelos contratos de exportação de manufaturados firmados com clientes estrangeiros para o primeiro trimestre.
O que mais preocupa são as importações. Agora que vamos retomar o crescimento econômico, é hora de ficar de olho nas importações. Devemos ter uma política liberal nessa área? Sim, porque as importações podem atuar positivamente para estimular o crescimento. No passado recente, o país abriu suas fronteiras para combater a inflação. Foi correto, mas isso também é passado. Repetir a política agora pode ter o efeito de uma bomba atômica para a indústria e para a oferta de empregos.
Nos Estados Unidos, a economia mais liberal do mundo, as decisões sobre importações são tomadas de forma tripartite, pelo governo e pelos sindicatos de trabalhadores e empregadores. A entrada de produtos que possam causar prejuízos à indústria local e aos empregos é impedida por meio de cotas e outros mecanismos. Que tal copiar a fórmula?
Não temos também uma política aduaneira adequada para um país do tamanho do Brasil. Há certas coisas que precisam ser ditas claramente: contrabandos entram por todos os poros. Da mesma forma que um consumidor pode comprar um televisor em Miami e recebê-lo em casa, um importador pode encomendar um contêiner de mercadorias e colocá-las no mercado com relativa facilidade.
Outra deficiência: não controlamos adequadamente a entrada de produtos subfaturados. Nos Estados Unidos, as universidades preparam livros constantemente atualizados com especificações e preços de milhões de produtos manufaturados produzidos no mundo. Lá, a possibilidade de alguém importar um produto subfaturado é mínima.
Não advogo o protecionismo para a indústria brasileira. Não é disso que se trata. Sugiro uma atenção redobrada com as importações neste ano de retomada da economia brasileira. Nada precisa ser inventado, basta copiar o que se faz nos Estados Unidos e em outros países. Sem isso, as importações, que podem funcionar como instrumento de crescimento, acabarão se tornando um elemento inibidor da nossa economia. E lá se vão nossos empregos.


Benjamin Steinbruch, 45, empresário,é presidente dos conselhos de administração da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio Doce.
E-mail: bvictoria@psi.com.br


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