UOL


São Paulo, terça-feira, 08 de abril de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

Os cem dias de Lula

No essencial, os cem primeiros dias do governo Lula foram bastante positivos. Temia-se o descontrole na economia, e não ocorreu. Afinou-se o discurso na área econômica, agiu-se com cautela até excessiva, mas se desarmaram os mercados e agora estão sendo colhidos os resultados, com queda do risco Brasil e do dólar.
Para tanto, contribuiu o compromisso com as reformas, reiterado por Lula.
Na frente externa, houve feitos relevantes, de firmar a imagem internacional de Lula, especialmente após os encontros de Davos e Porto Alegre e a iniciativa de criar o grupo dos amigos para a Venezuela.
No plano político, as votações da semana passada -apesar de temas mais fáceis- demonstraram capacidade de articulação do PT e um estilo bastante empregado pelo ex-ministro José Serra -de politizar as discussões em vez de partidarizar. O reconhecimento aos partidos de oposição que votaram o projeto demonstra esse estilo, que é bastante eficaz.
Com cem dias de governo, não se deve esperar muita coisa, a não ser visão estratégica clara sobre para onde se pretende caminhar. É por aí que se deve analisar o governo. Desse ângulo, há problemas claros.
O primeiro, o do loteamento de cargos, um amplo retrocesso em relação ao governo anterior. O modelo anterior -criticável- consistia em lotear alguns ministérios e funções, mas entre partidos. O ministro entrava, levava alguns assessores, mas mantinha-se o funcionalismo operando. Agora, em muitos ministérios e estatais, ocorreu ampla contratação de correligionários e sindicalistas para cargos comissionados, significando um retrocesso.
O segundo ponto tem sido a ausência -até agora- das políticas a serem adotadas pelas diversas áreas. Não há um projeto de governo claro, que possa subordinar as ações dos diversos ministérios. Dizer que o projeto nacional é de inclusão social quer dizer pouca coisa. A não ser as políticas sociais propriamente ditas, inclusão social costuma ser decorrência de modelos de desenvolvimento. E qual o modelo que se pretende? Não está claro.
Critica-se acertadamente o fato de o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) ter deixado de lado a visão setorial ou se comprometido em demasia com privatização deixando de lado a visão estruturante da economia. Mas qual o modelo entra em seu lugar? Nesse modelo, qual o papel da grande empresa nacional, da multinacional, das empresas de alta tecnologia -pouco geradoras de mão-de-obra?
Projeto nacional pressupõe uma articulação entre banco de desenvolvimento, outros bancos públicos, área de ciência e tecnologia, universidades (quem é que cuida delas?). E, por enquanto, essa articulação não existe, porque o conceito por detrás dela ainda não existe, ou não foi suficientemente explicitado.
A noção de gestão e de planejamento estratégico precisam ser aprofundados, para que o governo tenha uma bandeira mobilizadora e tenha ferramentas capazes de colocar as idéias em prática.

E-mail - LNassif@uol.com.br


Texto Anterior: Imposto de renda: Saiba declarar compras por leasing
Próximo Texto: Habitação: Governo dá R$ 1 bilhão para financiar imóveis
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.