São Paulo, domingo, 08 de abril de 2007

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Aneel segura reajuste e distribuidoras têm perda de R$ 412 mi

Após pressão política, agência represa aumento de tarifa para distribuidoras de MS e MG; consumidor deve pagar com correção

Origem do problema é o processo de revisão tarifária da Enersul e da Cemig; investidores privados criticam posição da Aneel


HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) cedeu a pressões políticas, decidiu represar reajuste de tarifa e deu calote de R$ 412 milhões nas distribuidoras Enersul (MS) e Cemig (MG). Com a decisão da agência, o consumidor teve um reajuste menor, mas deverá ser chamado a pagar a conta depois, com juros.
Durante a semana que antecedeu o reajuste, os diretores da agência foram procurados, entre outros, por políticos como o governador de Mato Grosso do Sul, André Pucinelli (PMDB), e o senador Delcídio Amaral (PT-MS). Eles pediam que a agência "congelasse" a tarifa da Enersul, uma vez que a concessionária já vende a energia mais cara do país.
A pressão surtiu efeito -a Aneel não congelou, mas decidiu não aplicar uma regra que ela mesma havia criado em 2003 e represou entre cinco e seis pontos percentuais no aumento das concessionárias Enersul e Cemig. Dessa forma, os reajustes, que poderiam chegar a 12% para consumidores residenciais, ficaram entre 3,5% (Enersul) e 6,5% (Cemig).
A decisão da agência alarmou investidores privados. "Ficamos assustados. A Aneel foi alvo de pressão política, e o que nos surpreendeu foi que ela cedeu. O que é grave é que a agência está mudando o critério", disse Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, que reúne os principais investidores privados no setor elétrico, entre eles o Energias do Brasil, proprietário da Enersul e controlado pela EDP (Energias de Portugal).
"A Aneel deu um passo para trás, colocou uma cortina preta na transparência", disse Sales. Ele ressaltou que a agência reguladora deixou também de computar no cálculo da tarifa os custos com a implantação do programa Luz para Todos -programa do governo federal que tem como meta levar energia a todo o país.
Segundo Sales, ao deixar de fazer o reajuste correto, a Aneel dá um sinal equivocado ao mercado e ao consumidor. "Isso obscurece a percepção da sociedade em relação ao custo da energia. Nada é de graça."
Na avaliação da Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), com a decisão da Aneel, na prática, é como se o consumidor tivesse ido ao mercado e tomado um empréstimo, que ele terá que pagar depois, com juros. "A decisão da Aneel é um erro porque não resolve o problema, joga ele para a frente. O consumidor terá de pagar o valor, corrigido", disse Luiz Carlos Guimarães, presidente da associação.
Segundo ele, houve frustração com a posição da agência reguladora. "A nossa expectativa era que a Aneel tivesse condições de resistir às pressões e aplicasse a regra", disse.
Guimarães reconheceu que a tarifa é alta, especialmente para uma área de concessão com o perfil da Enersul (com baixa densidade populacional), mas que essa questão precisa ser resolvida de outra forma, possivelmente com uma subvenção ao valor cobrado.
Ele destacou que boa parte da tarifa é composta de impostos e encargos. O diretor de regulação da Enersul, José Simões Neto, evitou criticar a posição da agência, mas deixou claro que, do ponto de vista da concessionária, há direito sobre o que não foi repassado. "Nossa avaliação é que o regulador fez sua avaliação e nós temos que nos submeter", disse. Simões Neto é ex-superintendente de Regulação Econômica da própria Aneel.

Origem do problema
A origem do problema é o processo de revisão tarifária da Enersul e da Cemig, que aconteceu em 2003. No processo de revisão tarifária, a Aneel analisa a estrutura de custo e o retorno do investimento de cada concessionária. Após essa análise, é definido um valor para a tarifa, que remunere adequadamente o investidor e garanta o equilíbrio econômico-financeiro da concessão.
Após essas análises, a Aneel chegou à conclusão de que a tarifa da Enersul deveria subir 50,81%, e a da Cemig, 44,41%. Para amenizar os efeitos do reajuste que calculou, a Aneel decidiu conceder aumento menor -31,53% para a Enersul e 32,59% para a Cemig- e parcelar a diferença em quatro anos.
Em 2003, quando decidiu não reajustar a tarifa nos percentuais tecnicamente necessários de acordo com os cálculos feitos no processo de revisão, a agência reguladora informou às concessionárias que as parcelas anuais dos valores não repassados seriam corrigidas.
A última parcela, no entanto, não foi paga para evitar altas maiores na tarifa. O total para as duas distribuidoras é R$ 412 milhões. A agência se comprometeu a pagar em 2008.


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