São Paulo, terça-feira, 08 de agosto de 2006

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BENJAMIN STEINBRUCH

Os limites da parcimônia

ESPALHA-SE aos poucos, quase subliminarmente, a idéia de que a economia está em recuperação e entrará naturalmente em vôo de cruzeiro no futuro próximo, com a instalação de um novo ciclo de desenvolvimento sustentável.


O discurso da estabilidade não levará a lugar nenhum se não for acompanhado da busca pelo crescimento


Essa idéia advém de um pensamento conservador, segundo o qual tem sido correta a manutenção das elevadas taxas de juros dos últimos anos e sua redução deve continuar em ritmo lento e gradual para não comprometer o projeto que venera a estabilização de preços e relega o desenvolvimento ao segundo plano.
Em dois momentos, essa idéia se manifestou explicitamente. O primeiro foi quando o Banco Central divulgou a ata da última reunião do Copom. Uma frase chamou a atenção pela ortodoxia: "A preservação de importantes conquistas no combate à inflação [...] poderá demandar que a flexibilização adicional da política monetária seja conduzida com maior parcimônia".
Com essa frase e a expressão "maior parcimônia", o BC deixou claro que está incomodado com o ritmo que ele mesmo vem impondo à redução da taxa de juros básica da economia. Deduz-se, portanto, que o corte da Selic na próxima reunião do Copom deverá ser, na melhor das hipóteses, de 0,25 ponto percentual -não mais de 0,5 ponto, como ocorreu nas reuniões anteriores.
O segundo momento foi quando a Fundação Getúlio Vargas divulgou a sondagem conjuntural referente a julho. Apurou-se que a indústria de transformação utilizou no mês passado 84,5% de sua capacidade instalada. Para os olhares dos que veneram a estabilização e desprezam políticas focadas em desenvolvimento, esse índice, o mais alto desde julho de 1985, é um claro sinal de que pode haver pressão sobre os preços industriais -e inflação generalizada- se a economia continuar a crescer no ritmo atual, que é pífio.
A revista "The Economist" publica semanalmente, nas suas últimas páginas, uma tabela com os principais dados macroeconômicos de 32 países considerados emergentes, ou seja, companheiros do Brasil na luta pelo desenvolvimento.
A colocação do Brasil nesse ranking é um vexame muito maior do que o suportado pelo país na Copa do Mundo da Alemanha. Acredite se quiser, o Brasil é o lanterna nessa corrida para o crescimento. Está em 32º lugar, numa lista em que se destacam países da ex-União Soviética, Argentina, Venezuela e, naturalmente, os novos tigres asiáticos China, Índia e Hong Kong.
Manifestar conformismo com essa posição e acreditar que um novo ciclo de desenvolvimento pode ser criado a partir de geração espontânea é quase um desprezo à inteligência alheia. O país precisa há muito tempo e continua precisando de uma vigorosa intervenção do Estado para despertar o espírito empreendedor do setor privado, com investimentos pesados em infra-estrutura e estímulo a setores estratégicos da economia.
É lamentável constatar, por exemplo, que a campanha eleitoral já vai longe e nenhum dos candidatos importantes colocou na mesa um programa com metas de crescimento. Caem em solo infértil, por exemplo, propostas lúcidas como a do economista Yoshiaki Nakano, que defende o estabelecimento de metas para a expansão do PIB e a geração de empregos tão claras quanto as fixadas para a inflação. Essa ação passaria por um corajoso ajuste fiscal feito com redução de despesas, uma política de apreciação cambial para dar ainda mais impulso às exportações e, naturalmente, um corte dos juros, que ainda são no Brasil os mais altos do mundo, com exceção dos da Turquia.
A esta altura do campeonato, com o Brasil ocupando a lanterna, assustar-se com uma simples taxa de utilização da capacidade da indústria é uma atitude até mesmo covarde. O discurso da estabilidade foi muito importante em anos passados e deve ser mantido, mas não levará o país a lugar nenhum se não for acompanhado de uma postura obstinada em busca de crescimento econômico. Há limites para a parcimônia.
BENJAMIN STEINBRUCH , 52, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
bvictoria@psi.com.br


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