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ARTIGO
Volks ou Ford: como resolver o dilema do ajuste?
HÉLIO ZYLBERSTAJN
Os recentes acontecimentos no
ABC estão mostrando as duas trajetórias entre as quais muitas empresas brasileiras deverão optar
neste ano de 1999. Duas montadoras, a Volkswagen e a Ford, diante
de um problema parecido (a necessidade de promover um grande
ajuste nas despesas com mão-de-obra), escolheram dois caminhos
muito diferentes. A primeira desistiu de demitir e negociou um acordo inédito no Brasil, reduzindo a
jornada e os salários e vinculando
o crescimento futuro da remuneração ao aumento da produção. A
segunda desistiu de negociar e partiu para a demissão em massa.
Ambas reduziram suas folhas de
salário. Mas o custo e o efeito foram muito diferentes.
A Volks preferiu o ajuste gradual. Com o acordo, conseguiu diminuir parcialmente a folha e se
comprometeu a não demitir. Em
compensação, num horizonte de
cinco anos, haverá programas de
demissão voluntária todos os anos,
bem como o desligamento automático dos aposentados. No longo
prazo, a empresa terá ajustado o
tamanho do seu quadro às suas necessidades. No curto prazo, porém, terá que suportar uma folha
maior do que gostaria.
A grande inovação do acordo da
Volks foi a introdução do conceito
da remuneração condicionada: os
salários serão recompostos quando o mercado se reaquecer e as
vendas aumentarem.
A Ford, ao contrário, escolheu o
caminho do ajuste rápido. De uma
só vez, enviou cartas de demissão a
2.800 empregados, o equivalente a
aproximadamente 41% do quadro
da planta Anchieta. Começa o ano
de 1999 com uma folha bastante
aliviada. Em compensação, está
enfrentando uma borrasca: os sindicatos, a opinião pública e, eventualmente, o próprio governo cobrarão a empresa por esse comportamento. Sua imagem ficará,
provavelmente, bastante comprometida.
A Volks escolheu uma linha mais
cara do ponto de vista financeiro,
porém mais aceitável do ponto de
vista social. A Ford escolheu a outra via e está pagando um preço
enorme pela opção mais barata.
Como explicar essas diferenças?
Será a Volks o "mocinho" e a Ford
o "bandido"?
A explicação não deve ser essa.
Afinal, as duas empresas têm, nas
suas matrizes e também aqui no
Brasil, uma longa tradição de negociação e de convivência com os
sindicatos. Há uma outra explicação, mais plausível: para a Ford,
simplesmente, talvez não fosse
possível assumir o custo financeiro da solução gradual. O "caixa"
falou mais alto que o "social".
Como nenhuma das opções é
boa, seria melhor não ter que escolher. Mas a conjuntura macroeconômica indica que muitas empresas brasileiras terão que enfrentar
essa escolha. Para uma grande parte delas, infelizmente, a opção
Ford será a mais atraente, pois elas
não têm a mesma visibilidade da
grande multinacional americana
nem têm um compromisso muito
grande com seus empregados. É
preciso evitar que isso ocorra.
Uma medida simples, que poderia induzir à opção Volks, seria a
de permitir que uma parte da remuneração mensal (algo como
20% a 30%) pudesse flutuar conforme o desempenho da empresa.
Com a remuneração mensal flexibilizada, as empresas não precisariam demitir, pois as folhas se ajustariam automaticamente à conjuntura econômica. Muitos acordos à
la Volks seriam assinados, salvando muitos empregos.
Isso poderia ser feito rapidamente, com uma pequena modificação
da medida provisória da participação nos lucros ou resultados
(PLR). Como se sabe, hoje, a PLR
só pode ser paga semestralmente.
Se pudesse ser paga mensalmente,
uma parte da remuneração mensal
estaria atrelada ao desempenho da
empresa, proporcionando as bases
legais e os incentivos econômicos
para acordos que preservem empregos. Seria uma boa ajuda para
resolver o dilema do ajuste pela
opção menos ruim.
Hélio Zylberstajn, 53, é professor da FEA-USP e
pesquisador da Fipe, onde coordena o Programa
Mediar - Informações, para a mediação estratégica entre trabalho e capital (www.fipe.com/mediar).
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