São Paulo, sexta-feira, 09 de fevereiro de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

A "revolução democrática" e o BC

Documento da "refundação petista" é retórica, pleito de cargos ou quer mesmo virar a política de Lula pelo avesso?

UMA PARTE importante do petismo acredita que o próximo Congresso do partido vai preparar o PT para "um período de inserção na revolução democrática em curso". Quer um PT mais "comprometido com a construção de uma visão republicana, radicalmente democrática e socialista" para o país. É o teor do documento escrito pelo pessoal mais ou menos ligado a Tarso Genro, candidato a ministro da Justiça, que queria "refundar o PT" e levou um pito de seus confrades para não ir muito a fundo.
É o trololó de sempre, para quem nunca leu programas e documentos do PT e possa ficar impressionado com a retórica, embora de fato pareça doido alguém escrever que há uma revolução democrática em curso -e acreditar no que escreve. Assinam o documento dezenas de autoridades petistas, militantes e intelectuais ligados ao partido.
Segundo o documento, quais seriam, na área econômica, as "ações estratégicas de larga influência na revolução democrática" que renovariam o PT e, pelo que se depreende do texto tortuoso, ajudariam o governo Lula a "promover seu programa de governo democrático"? "Um novo padrão de gestão monetária e cambial pelo Banco Central", "ampliação do Conselho Monetário Nacional" e "controle de entrada e saída do capital".
Entre gente mais pueril nas finanças, houve ontem fofocas de que o PT publicara na internet "um manifesto contra a política monetária". E daí? Nada. Uma bobagem reage a outra. Mais divertido é que uma "estratégia de revolução democrática" parece depender de que Lula acorde invocado e tire Henrique Meirelles e cia. do Banco Central.
O Banco Central vai continuar o que está fazendo. Não vai intervir mais em câmbio e não vai mudar o modo de avaliar o ritmo da queda da taxa de juros. Se forem obrigados a mudar, vão embora. O grosso da política do BC não foi determinado pelo BC, mas por Lula, assessorado por Antonio Palocci. Os atuais integrantes do BC estão nos seus postos porque, grosso modo, eles mesmos e o governo concordam que são aptos ou inclinados a implementar tal política -pode haver discordâncias marginais e de ênfase a respeito de suas atitudes e decisões. Mas essas diferenças marginais na atuação do BC não mudariam o câmbio ou os juros. A política monetária, assim como o resto da política econômica, é, na prática, de autoria de Lula, ou serve aos objetivos políticos do presidente Lula e seu entorno imediato.
Pode-se argumentar ainda que as tendências comerciais e financeiras mundiais determinam largamente as decisões de política econômica e seus resultados, sobre o que não há menção no documento petista. Alterar fundamentalmente a presente "inserção global" do Brasil demandaria muito mais do que mudar a política monetária. De resto, tal mudança provocaria de imediato, ao menos, convulsão social e política.
Trata-se, pois, de um choque ainda maior com toda a estratégia de Lula.
O documento negociado por Tarso Genro é o mais moderado dos manifestos petistas. Mas tem algum objetivo a não ser a disputa pelo comando do partido e por cargos no governo? Ou eles estão mesmo a dizer que é preciso virar pelo avesso Lula e toda a sua política até agora?


vinit@uol.com.br

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