São Paulo, sábado, 09 de fevereiro de 2008

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LUIZ AWAZU PEREIRA DA SILVA

Desafio com a crise financeira

É arriscado generalizar declarações fiscais expansionistas, pois o nosso problema é outro

A ATUAL crise financeira global não deve nos levar nem ao catastrofismo nem ao excesso de otimismo. Vamos, provavelmente, enfrentar incertezas, volatilidade, boas e más notícias com pânicos e euforias temporárias nas Bolsas. Mas devemos manter exatamente a nossa atitude prudente e pragmática. O lado "positivo" da atual crise pode ser o de reforçar nossa credibilidade e reflexão sobre nossos desafios de longo prazo.
Primeiro analisando friamente as implicações para o Brasil da crise nas economias do G7: a "arte" dos bancos centrais do mesmo G7 está sendo calibrar a flexibilização monetária e a imprescindível recapitalização de seus bancos com um apoio fiscal contracíclico para evitar recessão e inflação. Mas é arriscado generalizar declarações fiscais expansionistas, inclusive de organismos internacionais, pois o nosso problema é outro.
1) Nosso sistema financeiro é sólido, bem capitalizado, não comprou ativos "subprime" e é bem supervisionado. 2) Temos um impulso contratado de demanda interna forte, fortalecido pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e seus efeitos cumulativos. Porém 3) nossas expectativas e índices de inflação apresentaram elevação, em parte conseqüência da alta global dos preços de alimentos. E 4) temos um ajuste natural de nosso superávit comercial que poderá traduzir-se, a prazo, em relativa depreciação do real, pressionando a inflação. Estamos preservando o crescimento com inflação controlada que já temos e melhoramos as regras prudenciais nos nossos bancos, com medidas para precificar melhor o risco. Devemos controlar o nosso gasto fiscal corrente, aprimorando qualidade e eficiência. Reduzimos a dívida pública, ajudando, assim, o trabalho de ancoragem de expectativas das nossas autoridades monetárias.
Em seguida, consolidando nossa credibilidade econômica: um sinal de leniência com a inflação pode diminuir o investimento privado, hoje robusto, e o investimento estrangeiro direto e em nossos ativos financeiros, agravando a diminuição de nosso superávit de conta corrente. Isso poderia provocar um ajuste mais abrupto no câmbio, com conseqüências potenciais sobre os preços domésticos. Outros sinais necessários devido à não-prorrogação da CPMF foram rápidas medidas fiscais que mantêm a meta de superávit fiscal primário em 3,8% do PIB (Produto Interno Bruto), elevam apenas dois tributos (IOF e CSLL) e, sobretudo, cortam despesas de R$ 20 bilhões. Estamos agora detalhando com o "bisturi" os cortes finos de despesas, em sintonia com o Congresso.
Finalmente, a crise externa é uma oportunidade para debater reformas estruturais de longo prazo como sistema tributário, carga fiscal, Previdência, regulação de alguns mercados, em que se espera um mínimo de consenso suprapartidário. Já temos exemplos de reformas microeconômicas com bons resultados e consenso: crédito consignado, setor imobiliário etc. Precisamos mais: o projeto de reforma tributária, o cadastro positivo, normas contáveis e aumento via PAC do investimento com concessões e PPPs (Parcerias Público-Privadas). Implementar em tempo hábil as nossas reformas estruturais microeconômicas é a melhor garantia para uma inserção ainda melhor do Brasil no mundo globalizado com China, Índia e outros competidores que surgirão. Nossa democracia é forte e sábia o suficiente para travar debates políticos impiedosos e ao mesmo tempo construir as áreas de consenso para fortalecer as bases do desenvolvimento com justiça social do país.


LUIZ AWAZU PEREIRA DA SILVA é chefe da assessoria econômica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.


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