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ÍNTEGRA
Leia abaixo o discurso da transmissão de cargo de Gustavo Franco para Armínio Fraga na presidência do BC
"O governo segue o seu rumo, e eu, o meu"
Leia a íntegra do discurso de Gustavo Franco na
transmissão do cargo de presidente do Banco Central a
Armínio Fraga.
Seis anos de trabalho: um balanço
Gustavo H. B. Franco
"As qualidades permanentes -ou a filosofia- que
me parecem ser a base para o trabalho em bancos centrais são, na verdade, um triunvirato:
(a) Continuidade e tudo o que se aplica a experiência
e ao cultivo de uma visão de longo prazo;
(2) Competência e tudo o que implica um alto grau
de profissionalismo e uma deliberação e comunicação
cuidadosa; e (3) Integridade e tudo o que isso implica
em transparência e simples honestidade."
Paul Volcker. Retirado de "The Future of Central
Banking: the tercentenary Symposium of the Bank of
England". F. Capie et al. (eds.), Cambridge University
Press, 1994, p. 344.
1. Saudação: Excelentíssimo senhor ministro de Estado da Fazenda, meu amigo Pedro Malan, excelentíssimo senhor presidente do Banco Central do Brasil, doutor Armínio Fraga, demais ministros e secretários, digníssimos senhores parlamentares e liderança, demais
autoridades, colegas do Banco Central, novos e velhos,
senhoras e senhores.
2. Comecei a trabalhar no governo em maio de 1993,
de início, como secretário-adjunto de Política Econômica, em seguida, a partir de outubro de 1994, no Banco
Central do Brasil, primeiro como diretor de assuntos
internacionais, e depois, a partir de agosto de 1997, como presidente desta Casa. Trabalhei com três presidentes do BC -Pedro Malan, Pérsio Arida e Gustavo Loyola- e quatro ministros da Fazenda: FHC, Rubens Ricupero, Ciro Gomes e Pedro Malan.
3. Foram seis anos extraordinários e, na partida, dentre os soldados da primeira hora, os pioneiros que se
aglomeraram em torno do então ministro da Fazenda,
hoje presidente da República -os companheiros Edmar Bacha, Winston Fritsch, Clovis Carvalho, Eduardo
Jorge- nenhum de nós jamais poderia imaginar que
chegaríamos onde chegamos.
4. Há muito o que dizer sobre o que se passou nesse
período, por isso eu lhes peço licença para uma fala um
tanto longa, mas que, espero, não será monótona. Acho
importante recuperar algumas passagens importantes
desses últimos anos, não apenas para identificar posturas, progressos e compromissos, e homenagear e agradecer a pessoas e equipes, mas também para entender
os desafios e as motivações para as mudanças recentes
nas políticas de juro e de câmbio. Creio que o nosso futuro depende muito do modo como seremos capazes de
avaliar essa nossa experiência recente.
A função pública
5. Antes de mais nada, todavia, como é comum em
um momento de despedida como este, quero iniciar
com algumas palavras sobre o modo como eu vejo o
exercício da função pública.
6. O trabalho no setor público pode ser tremendamente distorcido e nocivo ao próprio público, se o indivíduo que o executa tem como objetivo perpetuar-se no
emprego. Por isso, sempre tive a minha passagem nessa
cidade como transitória, e minha experiência no governo, como passageira. Eu nunca quis ser um profissional
de governo, da política. Nunca fixei residência nessa cidade, nunca participei de suas solenidades e dos aspectos cerimoniais das rotinas do poder.
7. Sempre gostei de pensar que eu sou apenas um
brasileiro comum, um professor universitário dentre
tantos que acompanham a economia, as idas e vindas
da políticas, e que se aborrece, como qualquer pessoa,
com os retrocessos da economia, com a corrupção, a
inépcia administrativa, para não falar do egoísmo, da
vaidade e da intriga, infelizmente tão cultivados em alguns círculos do poder.
8. Eu apenas tive o privilégio, a extraordinária oportunidade de vir para uma posição de responsabilidade,
na qual podia realmente ajudar a mudar as coisas e
construir um país melhor para os meus filhos. Um sonho simples de qualquer brasileiro que quer ajudar seu
país. O presidente Fernando Henrique e o ministro Pedro Malan me deram esta extraordinária oportunidade,
essa incrível e fascinante responsabilidade, e a eles serie
grato pelo resto da vida.
* 9. Em resposta a esse chamamento, eu me entreguei
ao trabalho com todas as minhas energias. Jamais fugi
de responsabilidades ou deixei de contrariar potentados econômicos quando isso era necessário. Como disse, em uma outra ocasião, recentemente, na nota que li
em 13 de janeiro, não se tem noção de quanto é desgastante e solitária a defesa de princípios, a execução de
políticas impessoais, voltadas para a maioria, frequentemente confrontando interesses poderosos e despertando ressentimentos. A defesa da moeda traz benefícios a maiorias silenciosas e desorganizadas, cuja voz
raramente se faz ouvir.
No começo, todavia, era o caos
10. Tudo parecia perdido em maio de 1993: o ministro FHC era o quarto em menos de oito meses e vinha
depois de diversas situações vexaminosas para os ministros que o precederam. Os níveis de aprovação do
governo eram então os piores de toda a nossa história
recente. Estávamos a um ano e pouco das eleições presidenciais, e prontos para repetir, de forma piorada, a tragédia da hiperinflação de 1989.
11. O déficit público estava não apenas inteiramente
fora de controle, mas também registre-se que o governo
de então não atribuía qualquer importância à questão
fiscal, tida como obsessão de tecnocratas que, como se
ouvia dizer na ocasião: era gente que entendia de números, mas não de gente. Um bordão, diga-se de passagem, tradicionalmente usado para o mal, vale dizer,
contra o erário.
12. As reservas internacionais ainda estavam em US$
25 bilhões, mas o nosso sistema financeiro estava corroído por dentro de formas ainda difíceis de perceber
num ambiente de alta inflação. Os Estados estavam praticamente todos em atraso com suas dívidas contratuais, assim como suas concessionárias de energia: não
tínhamos feito ainda a lei 8.727, e as privatizações estavam paralisadas ou paralisando em face das conhecidas
restrições do então presidente da República, hoje governador de Minas, ao processo de privatização.
13. Além disso, a sociedade se mostrava aterrorizada,
pela sucessão de choques econômicos. A falta de credibilidade era monumental, e merecida, pois o governo
não governava, não tinha projeto nem idéia do que fazer.
14. Foi assim que começamos a trabalhar em 1993.
* 15. Seis anos depois, são muito fáceis os exercícios
sobre o "antes e depois". Qualquer um é capaz de apresentar, como lhe convém, os indicadores econômicos,
as mudanças, na forma que melhor enfatize suas preferências. As comparações serão sempre controversas,
pois cada cidadão tem o seu ponto de vista. Democracia
é e será sempre diversidade. E, para saber se melhoramos mesmo, as democracias têm mecanismos decisórios muito claros: eleições, nas quais prevalece o ponto
de vista da maioria. A julgar pelos resultados, o Brasil
aprovou os rumos seguidos, e em duas ocasiões.
* 16. Mas o caminho foi longo e difícil.
17. Minha lembrança mais significativa (e emblemática) dos primeiros tempos foi a aprovação quase unânime pelo Congresso (com um único voto contrário do
então deputado Gustavo Krause) da chamada Lei Paim
(os senhores se lembram do deputado Paulo Paim e
suas propoostas salariais mirabolantes?). Pois em julho
de 1993 seu projeto de lei, aprovado na íntegra, era o
passaporte carimbado para a hiperinflação.
18. Um comentarista de costumes, diretor de cinema,
disse na ocasião, muito a propósito, que a "hiperinflação é um grande desejo nacional. Não há outra explicação para a derrota permanente da razão (...) Há 400
anos o Brasil é um país que foge dos fatos. O país se esquiva de seus crimes, dá a volta em seu destino predatório e vai dourando a pílula de sua origem patrimonial e
oportunista (...) Há um desejo de um grande erro cósmico que nos redima" (Arnaldo Jabor "A hiperinflação
é nossa última esperança", em "Brasil na Cabeça". Rio
de Janeiro: Siciliano, 1995, p. 73).
* 19. Pois bem, nessa ocasião, nós estivemos a 20 centímetros da hiperinflação. Para quem não se lembra, a
contragosto, o presidente Itamar Franco vetou a Lei
Paim e, com o propósito de produzir uma outra, conduziu um experimento de diálogo com representantes da
sociedade organizada conhecido como a Agenda Brasil,
coordenada por mim e pelo hoje ministro da reforma
agrária, meu amigo Raul Jungman. E mais uma vez ficou demonstrado que nosso problema não era como
não é o de cooptar interesses organizados, mas o de envolver a sociedade maior, inorgânica, excluída, não representável, no processo de estabilização, o que conseguiríamos depois, com a URV.
As primeiras iniciativas
20. Em junho de 1993, quando publicamos o PAI
(Plano de Ação Imediata), estávamos dando os primeiros passos desse processo que os economistas chamam
de ajuste fiscal, processo que significa fazer o Estado caber dentro de suas próprias fronteiras, e nada, naquele
momento, parecia indicar que haveria apoio para isso.
Apenas o ministro FHC não se cansava de repetir: o caminho se faz caminhando.
21. O Conselho Monetário Nacional, apesar da obrigação legal de se reunir mensalmente, não se reunia havia quase um ano. Tínhamos mais de cem votos a deliberar. Nunca tinha havido tamanha paralisia por parte
das autoridades monetárias.
22. Para ter uma idéia do grau de anomia imperante,
foi preciso que o CMN aprovasse uma resolução (de número 1.996), nessa histórica reunião de 29.06.93, para
esclarecer que uma lei valia, e não era uma lei qualquer,
era a lei 7.492, Lei do Colarinho Branco, que veda aos
bancos os empréstimos a seus controladores e confere
dois a seis anos de reclusão aos transgressores.
23. Por algum motivo, entendia-se que essa norma
não valia para bancos estaduais e também para os federais, o que, obviamente, se constituiu em um manancial
de descontrole fiscal, além de crime. O descalabro parou com a resolução 1.996, mas ninguém foi preso. E a
aplicação dessa lei aos bancos federais ainda não se dá.
24. Nessa ocasião já contávamos com o doutor Pedro
Malan no Banco Central, que, em outubro, me convidou para assumir a diretoria de Assuntos Internacionais desta Casa. Já contávamos também com o doutor
Andre Lara Rezende para concluir as negociações da dívida externa e o doutor Persio Arida para o BNDES.
25. Logo adiante, em 7 de dezembro de 1993, o ministro da Fazenda encaminhou ao presidente da República
a Exposição de Motivos 395, trazendo os principais elementos do programa de estabilização que estávamos
desenhando.
26. Falávamos amplamente de alguns temas novos
-realismo orçamentário, déficit potencial, rigidez orçamentária causada pelas vinculações de receita, repressão fiscal e inflação como um imposto. E, principalmente, falávamos, e temos falado desde então, que o
Brasil tem uma doença fiscal, que, se não for tratada,
nada vai funcionar, não haverá crescimento, nem justiça social, nem equilíbrio externo, e que a inflação é esplêndido anestésico do qual será muito difícil o país se
livrar. A EM 395 dizia textualmente: "Infelizmente não
há atalhos. A estabilização definitiva é um programa de
transformação de mentalidade que toma tempo e requer coerência e persistência de todos. A ansiedade por
resultados imediatos é compreensível, mas altamente
perigosa (...) é justamente o imediatismo que impede
que o caminho mais longo da estabilização seja trilhado
com a coerência e persistência necessárias" (parág.
138).
27. Nosso diagnóstico era que, na engenharia do
ajuste fiscal, o primeiro problema a ser atacado devia
ser o das vinculações de receita.
* 28. A vinculação de receita é a forma mais direta e
perversa de apropriação corporativa de um recurso público. É a maneira pela qual o Estado concede a uma atividade, autarquia ou empresa a exclusividade no uso de
determinada receita. O texto da Constituição ilude o cidadão, estabelecendo uma vedação à vinculação de impostos, mas ressalva as partilhas de receitas com os Estados e municípios e o percentual de 18% para a educação (art. 167, IV). A vedação não alcança as contribuições e as taxas, o adicional de frete para o FMM, os encargos sobre a folha de salários que financiam o Sistema
"S" e seus magníficos prédios de mármore, assim como
os impostos criados para os gastos das estradas, a
CPMF que se destina à saúde, e por aí vamos. As exceções são a regra. Todo o dinheiro público parece já ter
dono.
29. Por isso propusemos na EM 395 uma emenda
constitucional cirando o Fundo Social de Emergência,
um mecanismo que nada mais era que um sistema para
desvincular receitas, e desvincular é fazer público o dinheiro público.
30. Reparem que, até hoje, mesmo depois de o FSE
ter sido renovado mais de uma vez, trocado de denominação (para FEF) e perdido alguns de seus elementos,
ainda permanece viva a queixa dos prefeitos e governadores. Ou seja, a primeira de todas as medidas do ajuste
fiscal, aquela que permitiu o início de tudo, em vez de se
tornar permanente com todas as honras, ainda se vê
questionada, como algo que foi roubado dos municípios e devesse ser devolvido.
A revisão constitucional que não houve
31. É interessante lembrar que nessa EM 395, de 1993,
o ministro da Fazenda oferecia ao presidente da República, além da Emenda Constitucional criando o FSE,
uma série de outras emendas a ser apreciadas durante o
processo de Revisão Constitucional então em aberto.
Dentre essas estavam emendas versando sobre: (1) O federalismo fiscal; (2) A reforma tributária; (3) O realismo orçamentário; (4) A reforma administrativa; (5) A
modernização da economia (a ordem econômica); e (6)
A reforma da Previdência.
32. Tudo estava lá.
33. Tudo isso podia ter sido feito na Revisão Constitucional de 1993, por votação unicameral, em maioria
simples, em seis meses. Mas nada foi feito. A única
emenda importante que conseguimos passar foi a do
FSE, Emenda Constitucional de Revisão n. 1, de
01.03.1994.
34. Que extraordinária oportunidade nós perdemos
aí! Na verdade, que decisão infeliz essa de não prosseguir com a Revisão... de quem terá sido?
35. O constituinte de 1998 certamente se permitiu alguma ousadia, porque sabia que cinco anos depois haveria uma revisão, quando os exageros poderiam ser
corrigidos e os inúmeros experimentos ali inseridos seriam verificados quanto a sua viabilidade. Tudo muito
próprio para uma nação em processo de construção de
seu ordenamento jurídico e institucional, tanto no plano político quanto econômico.
36. Mas como a revisão constitucional não aconteceu, o governo seguinte teve de ocupar a maior parte de
seu mandato corrigindo a Constituição, por meio desse
martírio das duas votações em cada uma das Casas,
com quórum qualificado, com intermináveis deliberações em comissões, o uso e o abuso da salvaguarda dos
DVS, ritos que fariam sentido apenas em países nos
quais a mudança constitucional é rara, mas onde as
constituições têm vários séculos de idade e foram longamente decantadas e testadas. Esse definitivamente
não é o nosso caso.
37. Quanto tempo perdido, quanta energia desperdiçada.
38. A situação é caricata quando se trata dos 12%, um
dispositivo para o qual "demos um jeito" de uma norma constitucional "não colar". Coisas do Brasil. Mas é
trágico quando se trata de assuntos referentes à administração pública e à Previdência, pois, como disse o excelentíssimo senhor presidente da República, no seu célebre discurso do Itamaraty em outubro passado: criou-se uma incompatibilidade entre os desejos da sociedade
expressos na Constituição e que se traduzem em despesa pública, e as possibilidades de atendê-los com os recursos que a própria sociedade deu ao Estado por meio
de impostos.
A coalizão inflacionária
39. Essa incompatibilidade entre desejos e possibilidades existe há muitos anos e tem sido resolvida pela inflação, a qual, não tenhamos dúvida, é uma violência do
Estado contra o cidadão, que, todavia, desfruta (ou desfrutava?) no Brasil de uma surpreendente tolerância.
* 40. O Brasil tem sido o berço de extraordinárias
"teorias" sobre o modo como a inflação era inevitável,
estruturalmente gerada pelo conflito distributivo, inerente ao capitalismo periférico ou à luta de classes. Mas
nunca uma criatura de um governo irresponsável vivendo além de seus próprios meios.
41. Quanta gente não vinha pedindo um pouquinho
de inflação? E, ao mesmo tempo, mostrando uma hipócrita surpresa no tocante às origens dos nossos índices
absurdos de desigualdade social? Como se ninguém
soubesse que a inflação é um imposto sobre o pobre e
que a aplicação continuada de um imposto como esse
apenas poderia produzir a pior distribuição de renda do
mundo.
42. Como é que fomos aceitar um desenvolvimento
econômico tão injusto durante tanto tempo? E como é
que não percebemos que a injustiça se produz pela inflação e pela irresponsabilidade fiscal?
* 43. A resposta a essas perguntas pode ser formulada em termos relativamente simples: fomos tão longe
com a inflação porque ela resolvia problemas que as
nossas incipientes instituições, ou a nossa imperfeita
representação política, não eram sequer capazes de
anunciar. Por omissão, ou de maneira tácita, tributou-se o pobre para se construir a indústria sem que ninguém tivesse de propor abertamente esta forma de financiamento. A solução era muito ruim do ponto de
vista distributivo, mas tinha um atrativo político extraordinário: não havia como atribuir as culpas senão
de forma abstrata ao Estado e ao capitalismo, à ganância dos oligopólios, à irresponsabilidade dos sindicatos,
aos atravessadores, ou às perdas internacionais.
44. Por mais supérfluo que pareça, a atribuição de
responsabilidade é essencial para o processo decisório.
A inflação é imoral, mas um mal do qual todo político é
capaz de se distanciar. Mesmo que se possa debitar o
déficit público genericamente aos políticos, nenhum
deles individualmente pode ser responsabilizado pelo
déficit, que resulta do conjunto de suas ações.
45. Com a Lei de Responsabilidade Fiscal, recém-proposta, o governo Fernando Henrique Cardoso procurará inverter os termos do problema individualizando no administrador a responsabilidade pela boa condução das finanças públicas. Não se trata apenas da licitude do ato administrativo, matéria própria dos Tribunais de Contas, mas da responsabilidade pelo equilíbrio
financeiro do Estado. São definidas várias modalidades
de Crime de Responsabilidade Fiscal e é prevista, inclusive, a pena de reclusão para diversos tipos de condutas,
tais como: "quebrei o Estado (ou o banco do Estado),
mas fiz meu sucessor", "usei os títulos emitidos para
precatórios para outros fins, socialmente mais importantes" ou "não vou pagar compromissos do meu antecessor porque isso compromete os meus planos de investimento", ou coisas do gênero...
46. É sintomático e preocupante estarmos agora assistindo manifestações contrárias à Lei de Responsabilidade Fiscal. É um absurdo que a irresponsabilidade
fiscal se torne postura política, que seja reivindicada como direito do governante. Ao que parece, pagar as contas e honrar compromissos é, na mente desses senhores, alguma forma inferior de governar. Aparentemente, toma-se de forma equivocada o paradigma de JK: o
bom governo seria o gastador, o realizador, o fomentador, não importa que não pague as contas.
* 47. Ocorre que estamos vivendo um momento diferente, onde as possibilidades do Estado-empresário são
nulas, e que temos de fazer o caminho de volta, pagar as
incríveis contas deixadas pelos "realizadores" e "fomentadores" do passado, e não há mais lugar para a irresponsabilidade fiscal.
48. O desenvolvimentismo fundado na irresponsabilidade fiscal se esgotou e levou este país a um impasse: o
progresso baseado em papel-moeda se tornou tragédia,
pois a inflação não é mais combustível do desenvolvimento, mas apenas veneno.
* 49. Não se trata de uma tragédia marxista associada
ao colapso do modo capitalista de produção, ou às contradições da globalização. É uma tragédia mais rasteira,
e anterior ao próprio Marx, e que aparece com mais clareza no Fausto. Um intérprete moderno de Goethe enxerga no pouco conhecido terceiro ato da tragédia, que
se passa num canteiro de obras, "um modelo fáustico
de desenvolvimento" ... que "criará uma nova síntese
histórica entre poder público e poder privado, simbolizada na união de Mefistófeles, o pirata e predador privado, que executa a maior parte do trabalho sujo (com
seu oportunismo, sua exaltação ao egoísmo e infinita
falta de escrúpulos, ajusta-se com perfeição a certo tipo
de empresário capitalista), e Fausto, o administrador
público, que concebe e dirige o trabalho como um todo". (Marshall Berman: "Tudo que é sólido desmancha
no ar: a aventura da modernidade", São Paulo: Companhia das Letras, pp. 71-73).
* 50. O desenvolvimentismo fundado na irresponsabilidade fiscal e na inflação, tão falso, quanto tentador
para o Soberano. Falso como a prosperidade produzida
pela emissão desenfreada de papel-moeda, que, na imagem de Goethe, construída a partir da experiência dos
Assinats franceses, que testemunhou, são "espectros de
papel, fantasmas impressos e assinados aos quais corresponde um valor falso como os Tesouros que Mefistófeles imagina enterrados sob o solo do Império". (Pietro Citati Goethe, São Paulo: Cia. das Letras, p. 234).
51. A saúde da moeda deve ser, portanto, um princípio fundador do próprio Estado, e que, uma vez consignada em nosso ordenamento jurídico, oferece importante salvaguarda para a cidadania contra possíveis
abusos perpetrados pelos governantes. Por isso o Brasil
precisa de um BC independente e voltado para a defesa
do poder de compra da moeda nacional.
52. A inflação não é de esquerda, ou progressista,
nem a estabilidade uma causa reacionária. Parte da nossa esquerda parece achar que a inflação é um substituto
para a Revolução, pois se apresenta como um mecanismo que extrai recursos da sociedade em benefício de
um Estado que se imagina benigno e puro que vai então
corrigir as injustiças do mundo. Não se percebeu a incompatibilidade a longo prazo entre Democracia e inflação, pois numa democracia não pode haver taxação
(inclusive e principalmente através da inflação) sem representação.
53. Já a direita sabe que a inflação é reacionária, que
concentra a renda e transfere recursos do pobre para o
Estado, mas profissionalizou-se em canalizar esses recursos para os ralos que alimentam as suas clientelas. A
direita tem pudor, embora lhe falte vergonha na cara,
que é outra coisa muito diferente: bate-se pela inflação
de formas mais sutis, como, por exemplo, através da
desvalorização da moeda, porque ela reduz os salários,
empobrece o país em benefício de quem tem domínio
sobre seus preços, ou seja, quem tem poder de mercado,
rendas e posses em moeda estrangeira. A direita sabe o
que está fazendo quando se bate pela desvalorização.
54. Em 1993, quando apenas preparávamos o terreno
para o Plano Real, já íamos descobrindo, na prática, que
a inflação tinha fortes apoios à Direita e à Esquerda, ou
seja, que tinha como base uma poderosa coalizão de interesses que era preciso derrotar.
A URV e o Real.
55. Seguindo-se à EM 395, nosso grande desafio foi o
de transformar num instrumento legal e operacional os
conceitos da EM.
* 56. A experiência dos membros da equipe era muito variada, incluindo economistas formuladores e uma
vasta gama de funcionários públicos com a experiência
dos outros planos e capazes de identificar as armadilhas
que tinham apanhado a outros andando nesta mesma
estrada. São muitos os nomes e os talentos que participaram nesse processo de concepção das medidas que
criaram o Real. Muitos estão aqui sentados, diversos
permanecem anônimos, a despeito de contribuições
fundamentais para uma construção tão complexa e detalhada, onde todas as engrenagens devem funcionar
perfeitamente.
57. Foi extraordinária a experiência da concepção do
sistema bi-monetário afinal tornado público na MP 434
de 28.02.1994, criando a URV (depois lei 8.880), a qual,
todavia, quase não saiu do papel. Na reunião ministerial de 27 de fevereiro de 1994, as pressões no sentido do
populismo salarial e do controle de preços foram enormes. Mas prevaleceu o bom senso.
58. O Real foi, de fato, criado aí, em 28 de fevereiro.
Nesta MP era criada a URV, "dotada de curso legal para
servir exclusivamente como padrão de valor monetário" (art. 1, caput), sendo a URV parte integrante do sistema monetário nacional, portanto, "uma moeda de
conta", mas que teria poder liberatório, ou seja, a propriedade de servir como meio de pagamento, apenas
depois de emitida, quando passaria a chamar-se real
(art. 2). São poucos os que festejam o aniversário do real
em 28.02 -me ocorre o jornalista Joelmir Betting. Estamos, no presente momento, já dentro do sexto ano do
Real, que se iniciou no sábado retrasado.
* 59. A URV foi uma experiência de reforma monetária como nenhuma outra nesse planeta. Teve elementos
da experiência alemã do Rentenmark de 1923, das propostas de OTNização nascidas no Brasil, mas nunca
executadas. Mas foi única: nenhuma outra reforma teve
esta magnitude ou envolveu um processo voluntário de
adesão tão amplo, envolvendo a redenominação voluntária de cada obrigação pecuniária conforme a vontade
das partes.
* 60. A URV era o coração de um empreendimento
dificílimo: conduzir um plano de estabilização sem
choques, confiscos, caneladas, e atrair a sociedade a
aderir voluntariamente a um esquema que resultaria
vantajoso para a coletividade. Era uma solução de mercado para um sério problema de decisão coletiva, e onde o respeito à lei e à dignidade do cidadão sempre foram nossas "cláusulas pétreas"...
61. O sucesso da URV foi o sucesso da Democracia,
da economia de mercado e da racionalidade coletiva de
um povo, que buscava maneiras de rejeitar o flagelo da
inflação, a Lei de Gerson e a pilhagem dos recursos públicos. Por isso, os quatro meses de vigência da URV foram um reencontro da sociedade brasileira com um de
seus mais importantes e mais combalidos valores: a
moeda, a capacidade de transmitir poder de compra
para o futuro, a capacidade de vislumbrar horizontes. A
restauração da moeda era um reencontro com um futuro que parecíamos ter perdido.
Políticas de câmbio e juros no início do Plano Real.
62. Apesar de bem-sucedido, o processo de reengenharia da moeda através da URV estava construído sobre bases fiscais extremamente precárias, e as remarcações de preços nas vésperas da entrada em vigor da nova moeda foram fortíssimas. A partir de primeiro de julho, a URV ficaria para trás e o destino do Real passaria
a depender dos nossos próximos movimentos. Qual seria a inflação do primeiro mês, já na nova moeda, qual o
grau de desindexação posterior, tudo isso ia depender
da atuação do BC, em particular das políticas de juros e
câmbio. O avião havia decolado, era preciso pilotar e
começamos com uma combinação simples, quase de livro-texto: juros altos, ou seja, política monetária apertada, e câmbio flutuante.
63. A história é conhecida. Essa combinação de políticas foi extremamente bem-sucedida em produzir um
bom começo para o Real.
* 64. Tivemos deflações nos índices de "ponta" (incluindo a cesta básica, que caiu 4% em julho e outros
4% em agosto), a desdolarização, e inflações nos primeiros meses pequenas o suficiente para garantir o sucesso do plano. As margens de sucesso, nos primeiros
meses, eram baixíssimas, mas nós conseguimos navegar com sucesso nesses caminhos muito estreitos, e
conseguimos uma excelente decolagem.
65. Como seria a decolagem do Real se começássemos com uma política monetária frouxa e uma desvalorização cambial? Eu lhes digo, seria um desastre. Toda a
experiência da URV seria desperdiçada, todo o preparativo seria perdido, e a próxima chance de estabilizar
estaria, provavelmente, muito longe, depois das eleições, com um outro governo.
66. Exatamente por isso não se pode aceitar este argumento tão comum dentre os derrotados pelo sucesso
do Real, que houve um "erro" nas políticas de câmbio e
juros no início do Real. Erro coisa nenhuma. Se algum
"erro" houve foi o de ter dado certo de uma maneira
muito clara aos olhos da população, e rápido o suficiente para desarmar uma série de projetos pessoais de poder já em estado avançado de construção.
67. Em julho e agosto de 1994 a oposição tinha uma
ampla liderança nas pesquisas eleitorais, e já se preparava para governar. Eles não poderiam deixar de se irritar com a sucessão de acertos da política econômica,
deixe-me sublinhar isto, os acertos da política de juros e
câmbio, acertos tão contundentes que fizeram o Real
um sucesso com extraordinária rapidez e viraram completamente o cenário eleitoral.
68. A oposição foi massacrada na eleição de 1994, e
com ela também massacrada a tese de que as políticas
de câmbio e juros eram erradas e insustentáveis, e o
Real era um plano eleitoreiro. Se alguém errou na avaliação das políticas de câmbio e juros foram esses zangados economistas da oposição, cujos diagnósticos terminaram por colocar seus partidos na exótica posição
de defender a desvalorização cambial, ou seja, um caso
raro de partidos de esquerda que defendem políticas
que resultam em arrocho salarial.
Perdas internacionais.
69. As opiniões emitidas sobre política cambial naquela altura, principalmente da parte de alguns profissionais da política, tiveram para mim um "muso" inspirado, um craque em matéria de oportunismo político,
um inigualável talento para a criação de falsas conspirações, um conhecido caudilho gaúcho, com larga militância no Rio de Janeiro.
70. Eu explico. No começo de 1986, quando o país foi
surpreendido pelo Plano Cruzado, e não havia um brasileiro que não estivesse disposto a enrolar-se na bandeira nacional para defender o plano, este senhor declarou-se contrário ao Cruzado. Era o único. A única voz
dissonante a afirmar, com aquela sua gestualidade retumbante de patriota inconformado, sempre a alertar
para calamidades, e a denunciar interesses inconfessáveis, que o Cruzado não daria certo por causa das "Perdas Internacionais".
71. O que eram as "Perdas Internacionais"?
72. Ninguém sabe até hoje o que são as "perdas internacionais". Querem a verdade? Não era nada. Era um
hedge político, uma opção gratuita. Se por algum motivo, nos próximos cinco ou dez anos, o Cruzado desse
errado, apenas um brasileiro tinha levantado a sua corajosa voz para denunciar a fragilidade do arranjo, apenas essa voz solitária e incompreendida. Pouco importa
que o desastre tivesse lugar por outras razões, totalmente incompreensíveis ao próprio profeta. O desastre
era a sua consagração.
73. Com o sucesso do Real, várias vozes se ergueram
neste mesmo estilo, e o objeto dessas manifestações,
com muita frequência, foi a política cambial: um "erro"
havia sido cometido, diziam, e, portanto, qualquer coisa que ocorresse nos cinco ou dez anos seguintes e que
viesse a prejudicar o Real seria um produto defasado
deste "erro original", dessas "perdas internacionais".
74. Inúmeras carreiras foram construídas, aqui e lá
fora, a partir dessa previsão da catástrofe, portanto se
aqui fôssemos conferir o Prêmio Leonel Brizola para os
profetas que acertam pelas razões erradas, mesmo sem
entender muito bem o que se passou, o número de candidatos seria imenso: os campineiros enfurecidos, os
grandes economistas gringos sem clientela no Brasil, alguns jornalistas obcecados com câmbio, alguns veículos de imprensa especializados em ver o lado ruim das
coisas, os amargurados de sempre, alguns especuladores profissionais, e por aí vamos.
75. O Real poderia ter caído vítima do El Niño, ou da
moratória russa (para não falar da crise da Ásia), eventos imprevisíveis e totalmente desligados da arquitetura do Real, e ocorridos cinco anos depois do alegado
"erro" na política cambial. E, no entanto, esses senhores, brasileiros e estrangeiros, críticos históricos do
Real pelos motivos mais desbaratados (e nem sempre
consistentes entre si), todos se apresentariam como os
heróicos analistas que, a despeito da opinião contrária
em larga maioria, jamais esmoreceram em prevenir que
o desastre estava próximo e que o Brasil caminhava para o abismo, e que o Pecado Original nos levaria à Danação.
76. O jornalista Jorge Caldeira, num texto clássico a
propósito de uma frase do Nelson Rodrigues ("Por que
somos um Narciso às avessas", "Exame", 30.08.1995)
argumentou que, no Brasil, o fracasso é uma indústria
pujante e organizada, pois o sucesso sempre cria injustiças (pois é destruição criadora) cuja reparação passa a
ser a razão de ser dessa indústria, que se empenha em
obter do governo as compensações pelo que lhes foi retirado. A "defasagem cambial" sempre foi um pretexto
para favores compensatórios (sempre foi de 30%, não
lembram?), mas depois do Real se tornou uma bandeira
poderosa, a chave para conquistas mais ambiciosas e
nos mais variados formatos. Na visão de Caldeira, todavia, com o
tempo e com o sucesso do real, a indústria do fracasso entraria em desespero e sua profecia era a organização de passeatas contra a estabilidade, onde as palavras
de ordem seriam "quero minha proteção", "inflação
já", "abaixo o real".
77. Qualquer semelhança entre esta visão, essa extraordinária premonição, e o ato promovido pela Fiesp,
naquela negra torre de mármore construída com dinheiro dos impostos que incidem sobre o emprego,
aquele monumento vivo ao custo-Brasil, sob a égide de
seu novo presidente, doutor Horácio Lafer Piva, em dezembro passado, não é mera coincidência: foi profetizado em 1995 pelo jovem biógrafo do Visconde de Mauá,
jornalista e historiador, um profundo conhecedor da
resistência das nossas elites em se mover e, quando é o
caso, mover-se para o lado errado, na direção do atraso.
78. Já em 1994, portanto, tínhamos esta poderosa
coalizão de interesses na qual a esquerda uniu-se à direita, em sentir-se ludibriada pelo sucesso do real e do
presidente Fernando Henrique Cardoso. Profetizar a
catástrofe em linguagem parnasiana e alardear o artificialismo da construção, os supostos "erros", e combater à sombra do anonimato das notinhas venenosas,
com os instrumentos da intriga e da fofoca, foi tudo o
que restou a todos esses cujos projetos políticos foram
destruídos pelo sucesso do real.
Os desafios do primeiro ano
79. Nós sempre soubemos que a parte mais difícil do
programa de estabilização era lidar com o seu sucesso
inicial. A verdadeira guerra começava agora, com as
medidas que iam dar sustentabilidade ao edifício recém-construído. Este é o momento onde os economistas já fizeram a sua parte, e os políticos precisam fazer a
sua, justo na hora em que os pendores para a complacência são os mais fortes.
80. Teríamos de enfrentar a crise do México, logo em
dezembro, num momento onde o superaquecimento
da economia parecia assustador e encontrava motivações na própria estabilidade (os ganhos de renda da população mais pobre e os horizontes abertos àqueles dispostos a se endividar, comprar um bem durável). Além
disso, a estabilidade começava a nos revelar os imensos
problemas existentes no sistema bancário. Não era uma
agenda muito fácil.
81. Em março de 1995, depois de alguns tropeços, estabelecemos a política de bandas cambiais e elevamos
os juros para conter os excessos do consumo. Vários
outros planos de estabilização tinham se esgotado neste
ponto. Tomamos as medidas impopulares que a situação requeria, e fomos adiante. Naquele momento, não
nos deixamos enganar por falsas soluções fáceis, a máxi
e a flutuação, nem por arroubos intelectuais sem sentido prático, e aceitamos a inexistência de "refeições gratuitas", um sábio axioma, que mesmo os economistas
demoram, por vezes, a assimilar.
82. Nessa altura tivemos de encarar de frente a fase
mais crítica do saneamento do sistema bancário, um
extraordinário desafio, que se desdobrou em diversos
capítulos fundamentais. O número preciso de liquidações, intervenções e outros regimes especiais é revelador: foram mais de 190 instituições, a maior parte bancos de todo tamanho. Nunca houve nada parecido nesse país, mas os prejuízos para depositantes foram muito
pequenos.
83. Conforme já observei, tínhamos problemas sérios com os bancos federais e estaduais, a começar pelo
nosso Banco do Brasil, cuja capitalização e reestruturação custou cerca de R$ 8 bilhões aos cofres públicos,
muito mais que o valor de seu patrimônio contábil. É
claro que pode ser dito que o BB quebrou porque mau
uso fizeram dele, e que o banco foi assumindo despesas
e responsabilidades que não eram suas, mas o Tesouro,
ou foi sangrado pela força de influências políticas. Alegações que também aparecem nas conversas sobre bancos estaduais. Pois bem, se é assim, o assunto é fiscal:
para que o Tesouro (federal ou estadual) não tenha a
tentação de usar um banco público para gastar além da
conta, é melhor então que não tenha banco.
84. A privatização do BB, a meu juízo, deve ocorrer
porém no futuro, pois agora temos uma agenda cheia
de bancos estaduais para vender. Logo adiante, será natural que alguns dos maiores bancos privados ultrapassem o BB em tamanho e competência, fazendo de sua
privatização um negócio natural para o acionista controlador (como será, por exemplo, a venda do Banespa).
* 85. O governo, desde o PAI, levou a sério o saneamento dos bancos federais e dele tratou consistentemente através do Comif, que coordenou a reestruturação do BB e também as providências que fizeram com
que a Caixa Econômica Federal deixasse de ser um problema para o BC. Quem sabe a abertura de seu capital e
a entrada de sócios estratégicos em alguns de seus conselhos sirvam para construir a partir da CEF um grande
banco hipotecário livre da cobiça dos políticos. O BC só
tem a aplaudir os trabalhos do Comif, que também alcançam o Basa e o Banco do Nordeste, que certamente
têm suas funções como instituições de fomento, mas
funções que não devem ser confundidas com o negócio
bancário, mistura que resultou letal para os bancos estaduais.
A tragédia dos bancos estaduais
86. O Proes, o programa de privatização, extinção e
saneamento dos bancos estaduais, é uma batalha em
andamento no sentido de erradicar uma doença: uma
doença chamada caridade com o dinheiro alheio.
87. O cálculo dos prejuízos causados pelos bancos estaduais ao longo de sua existência é estarrecedor, podendo ultrapassar os R$ 100 bilhões.
* 88. Subsídios e outras transferências efetuadas antes de 1992 podem ter atingido R$ 40 bilhões, em dinheiro de hoje. Afora isso, o sistema consumiu todo o
seu capital entre 1992 e o Real, e agora, no âmbito do
Proes e em esquemas específicos (como o de SP), refinanciamentos foram concedidos em valores que chegaram a R$ 47 bilhões e podem alcançar R$ 60 bilhões.
Diante desses prejuízos nada menos que monumentais,
o mínimo que podemos dizer é que a existência dessas
instituições põe em risco o sistema bancário e o equilíbrio fiscal.
89. O problema aí não reside na atividade de fomento, pois bancos de fomento existem em toda parte, como o BNDES, o Banco Mundial e o BID, por exemplo.
Qualquer banco é libre, evidentemente, para fazer o que
quiser com seu próprio capital, inclusive empréstimos a
fundo perdido. O problema é a instituição que usa recursos de terceiros para atividades de fomento. É caridade com o bolso alheio. É apropriação indébita. É crime. E foi isso que os bancos estaduais fizeram nesse
país. Por isso o presidente da República assinou uma
MP com o propósito de reduzir a presença do setor público estadual na atividade bancária. Por isso os bancos
estaduais devem desaparecer.
90. Nesse espírito os progressos já foram imensos e
conhecidos.
* 91. O maior dos bancos estaduais, o Banespa, foi federalizado e será em breve privatizado. Privatizamos o
Bemge, o Credireal, o Banerj, o Meridional e o Banco do
Estado de Pernambuco. Fechamos os bancos de Rondônia, Mato Grosso e Roraima. Arrecadamos pouco
diante dos prejuízos e refinanciamentos: não se cobre
nem 10% do prejuízo, mas o importante é extirpar a
doença.
* 92. Os próximos passos estão já determinados: temos acordos assinados para a federalização dos bancos
do Amazonas, do Ceará, de Goiás e do Piauí. Os governadores recém-eleitos dos Estados de Santa Catarina e
do Espírito Santo vieram ao BC manifestar sua intenção
de privatizar seus bancos. Estamos aguardando o posicionamento do GDF, que tem um problema e precisa se
decidir. Há vários outros na fila para privatizar, por sua
própria iniciativa, como os do Maranhão, Bahia e Paraná.
93. A maior contribuição que o Proes pode dar à sociedade brasileira não é nem a privatização dessas instituições, mas uma mudança conceitual importante: aos
olhos do BC não existem mais bancos estaduais. Existem apenas bancos. Bancos a serem tratados exatamente como os outros. O Proes teve como consequência enterrar para sempre o conceito que o banco estadual é diferente dos demais, e que tem "missões sociais" a executar, especialmente com recursos que não são seus. A
doutrina do BC nessa matéria é muito simples: banco
estadual não tem missão social nenhuma, quem pode
ser que tenha é agência de fomento, que não é banco,
não capta recursos de terceiros, e faz investimentos a
fundo perdido apenas com o dinheiro do seu acionista
controlador. Caridade (e fomento) não se faz com dinheiro alheio.
94. Há cinco anos atrás esse extraordinário progresso seria considerado impossível, mas está acontecendo,
graças à tenacidade e habilidade dos técnicos do BC e da
Fazenda, dentre os quais eu queria homenagear especialmente o meu amigo e companheiro diretor Paolo
Zaghen, e sua equipe, Vicente Nunes e Pedro Alvim especialmente, mas também os companheiros da Fazenda cumprindo maravilhosamente a sua parte do processo: doutores Pedro Parente, Amaury Bier e suas respectivas equipes, os agradecimentos meus e do Brasil
pelo esplêndido trabalho que vêm realizando.
* 95. Apenas gostaria de alertar que os progressos foram extraordinários, mas as forças trabalhando em
sentido contrário não estão mortas. Todo o pesadelo
pode ser recriado com imensa velocidade se não prestarmos atenção a alguns temas importantes, em especial dois: a disciplina das agências de fomento e a formação dos fundos previdenciários dos Estados. Se esses
temas forem mal regulamentados, as consequências
podem ser ainda piores que a sobrevivência dos bancos
estaduais. As agências de fomento não podem ter características de banco: em hipótese nenhuma devem ser
autorizadas a captar recursos do público, nem deter
contas de reserva bancária, e não podem administrar os
recursos dos fundos previdenciários, que, por razões
óbvias, não podem ser usados para fomento. Melhor seria que essas limitações fossem fixadas em lei.
O Proer e a supervisão bancária
96. As dificuldades de bancos do porte do Econômico, Nacional, Bamerindus, dentre outros, colocaram
em perigo as poupanças de milhões de brasileiros. O papel do BC não deve ser, nem foi, o de salvar bancos ou
banqueiros, mas de proteger correntistas, proteger a
poupança popular. Bancos são instituições que trabalham com recursos que não são seus. Cabe aos BC fiscalizá-los para que o dinheiro não seja mal utilizado. Em
casos de bancos que fizeram mau uso do dinheiro de
seus correntistas, a despeito de nossa fiscalização, construímos um programa, o Proer, que ajudava outros
bancos a assumirem as obrigações relativas aos depositantes desses bancos com problema, que eram, então,
fechados, liquidados e seus gestores e controladores
responsabilizados pelos prejuízos. O objetivo sempre
foi o de proteger o depositante.
97. Programas como o Proer foram feitos em muitos
países que passaram por crises bancárias. Pela sua própria natureza, essas crises nem sempre são previsíveis,
podem resultar de fraudes extremamente bem elaboradas, e seus custos para a sociedade podem ser catastróficos. Por isso, de nossa parte, nunca houve hesitação
em enfrentar o problema. Muito mais difícil foi enfrentar uma outra barreira, a da incompreensão.
98. A oposição quis fazer do Proer uma questão política, sem se dar conta do que representariam para o cidadão comum as agruras de uma crise bancária. O brasileiro que se lembra do Plano Collor conhece bem a
sensação de ver seus recursos bloqueados no banco, fora de seu alcance. Pois bem, o Proer evitou que cerca de
4 milhões de correntistas tivessem seu dinheiro preso
em prolongados processos de liquidação. Cada uma
dessas pessoas, que tinha uma conta no Econômico, no
Nacional e no Bamerindus, para ficar apenas nesses
três, deve sempre lembrar que, se não fosse o Proer, e se
dependesse desses valentes deputados da oposição, a
todo momento esbravejando contra o Proer, suas poupanças teriam desaparecido.
99. A obrigação do BC de proteger a poupança popular foi cumprida. O saldo devedor junto ao Proer, descontadas provisões, é de R$ 8,7 bilhões, para garantias
de R$ 19,0 bilhões. Há deficiências com a reserva bancária da ordem de uns R$ 12,4 bilhões, o que faz incerto o
resultado financeiro final do programa. Mas, de toda
maneira, é interessante notar que os prováveis custos finais do Proer serão uma fração ínfima dos curtos do
Proes, ou seja, do descalabro representado pelos bancos
estaduais. E para estes eu nunca vi nenhum pedido de
CPI.
* 100. Em boa medida, os prejuízos a depositantes foram diminuídos em função da criação do FGC, o Fundo
Garantidor de Créditos, um mecanismo que oferece
uma espécie de seguro de depósitos com recursos dos
próprios bancos. Valores até R$ 20 mil em depósitos
são protegidos, o que, nos casos onde a proteção foi utilizada, cobriu cerca de 95% dos depositantes. Foi um
extraordinário avanço institucional em nosso sistema,
e agora prestes a receber o apoio do Banco Mundial para o financiamento de contribuições ao FGC, possivelmente no valor de US$ 1,0 bilhão.
* 101. Só é lamentável que o FGC ainda não tenha podido utilizar os recursos do Recheque e do FGDLI, o
primeiro um fundo formado a partir de contribuições
dos bancos para o aprimoramento do uso do cheque, e
o segundo, formado dos recursos dos bancos que servem para a garantia da poupança. Esses recursos estão
presos por liminar concedida numa Adin, dessas feitas
pela oposição, alegando que os recursos do Recheque e
do FGDLI são recursos públicos, e que não poderiam
ser usados para este fim. A alegação da Adin é totalmente equivocada, e o STF está esperando a manifestação
do doutor Geraldo Brindeiro nesse sentido. Já fazem
quase dois anos da liminar e a manifestação do Ministério Público não ocorreu. Gostaria de fazer, aqui, de público, um apelo ao doutor Brindeiro, que entregue sua
manifestação para que essa liminar possa ser removida
e o mecanismo de proteção ao depositante possa ser reforçado.
102. O Proer, o FGC, a Central de Risco, as IGCs, a lei
9.447/97 e as incríveis mudanças efetuadas na área de
fiscalização do BC foram partes de uma verdadeira revolução ocorrida dentro do BC no sentido de implementar cada uma das 25 recomendações do Comitê de
Basileia sobre Supervisão Bancária. Nesse intervalo, inclusive, o BC se tornou acionista do BIS e passou a participar ativamente dos trabalhos do próprio Comitê. Eu
queria homenagear os arquitetos dessa transformação,
uma extraordinária equipe, cujo trabalho nem sempre
foi devidamente reconhecido fora desta Casa, e que eu
gostaria de resumir em alguns de seus comandantes:
doutor Claudio Mauch, hoje aclamado presidente da
Associação Latino Americana de Supervisão Bancária,
meus parabéns pelo trabalho realizado, doutor Gustavo
Loyola, meu antecessor, o nosso diretor de Normas,
que permanece, doutor Sergio Darcy e o doutor Luis
Carlos Alvarez, hoje aqui assumindo com todo merecimento a vaga de diretor de fiscalização. Minhas homenagens também aos membros do Comitê do Proer. Tenho enorme orgulho de ter podido ajudar nesse extraordinário trabalho. Se hoje nós temos um sistema
bancário sadio, tendo passado por todos os turbilhões
que passamos, internos e externos, o crédito cabe a esses senhores e senhoras.
Bancos estrangeiros
103. Em boa medida, a reestruturação do nossos sistema bancário se deveu à capacidade de o BC administrar o interesse de bancos estrangeiros entrarem no
mercado brasileiro. A Constituição limitou a participação estrangeira no sistema financeiro nacional e deu ao
presidente da República o poder de autorizá-la com base do interesse nacional. O presidente definiu que a entrada de estrangeiros deveria ocorrer em áreas onde o
nosso sistema necessitava de energias e deu ao CMN a
autoridade para utilizar as autorizações com esse espírito.
* 104. Com isso autorizamos fusões e aquisições envolvendo o HSBC, mas também outras feitas pelos bancos Santander, Bilbao Vizcaia, ABN-AMRO, Sudameris, Credit Agricole e tantos outros. Muitos problemas
foram evitados. Muitas soluções de mercado foram
montadas para evitar problemas, com isso fortalecendo
ainda mais o nosso sistema, a despeito de algumas resistências.
* 105. O valor arrecadado em contribuições para o
fortalecimento do sistema financeiro, em suas várias
possibilidades, já alcança mais de R$ 350 milhões, com
os quais várias liquidações foram encerradas, e vários
créditos de difícil recuperação no balanço do BC puderam ser recuperados. Meus agradecimentos aos gestores do sistema, ao diretor Sergio Darcy e sua equipe, e
aos antecessores na área de normas e autorizações,
doutor Alkimar Moura e, novamente, o doutor Claudio
Mauch.
A Diretoria de Assuntos Internacionais
106. A maior parte do tempo, de minha experiência
nesta casa, foi ligada aos assuntos internacionais e uma
das minhas maiores tarefas foi a de redefinir o papel do
mercado, e da mesa de operações do BC, na determinação da taxa de câmbio.
Gostaria de homenagear aqui o Depin, na pessoa dos
chefes com quem trabalhei: Ledir, o amigo Joubert Furtado, e muito especialmente à doutora Maria do Socorro Costa Carvalho, um monumento de competência,
seriedade, patriotismo e dedicação, que, repetidas vezes
assisti, na mesa de operações, enfrentando essa entidade toda poderosa, o mercado, o qual, todavia, nunca
deixou de se curvar a um BC que sabe o que quer. Conhecendo de perto o trabalho desses profissionais do
Depin comandados pela doutora Maria do Socorro
quero aproveitar a ocasião para um depoimento: no
Banco Central do Brasil nunca faltou operador. Às vezes, faltou foi comando.
107. O papel do mercado se ampliou nos últimos
anos porque desregulamentamos os mercados de câmbio, o que pode ser medido pela redução observada na
espessura da Consolidação das Normas Cambiais, trabalho que começou com o doutor Alcindo Ferreira,
grande funcionário público, o homem que conhece todos os segredos do câmbio, e que continuou com o doutor José Maria Carvalho e sua equipe, a todos o meu
agradecimento muito especial.
108. No Departamento de Câmbio, quando cheguei,
encontrei muitos problemas mal resolvidos na área de
ilícitos cambiais. Com a ajuda do doutor Alcindo, do
doutor Carvalho e especialmente do doutor Carlos Augusto Faias, coordenador do Grupo de Trabalho designado por mim para investigar as fraudes cambiais de
1988-89, que já havia produzido, inclusive, uma CPI,
conseguimos desmembrar a trama e punir os culpados,
ao menos na esfera administrativa. Nas decisões que
apliquei nos Processos Administrativos referentes a essas fraudes cambiais, apliquei as maiores multas de que
se tem notícia nesta casa, algumas superiores a US$ 200
milhões. Vencemos a letargia e os prazos de prescrição.
A impunidade não prevaleceu.
* 109. Chamo a atenção dos senhores, especialmente
dos amigos da imprensa, que essas decisões, quase 500
milhões em multas, devem estar chegando no Conselhinho (Conselho de Recursos do Sistema Financeiro) por
agora. Vamos acompanhar se essas decisões são ratificadas.
110. A desregulamentação cambial significou, dentro
do BC, uma mudança de vocação, que é tarefa muito difícil em qualquer órgão público. Mas teve lugar de forma exemplar tanto no Decam, que terá novos caminhos
agora que temos uma lei que dispõe sobre a lavagem de
dinheiro, quanto no Firce, departamento encarregado
da Fiscalização e Registro de Capitais Estrangeiros. A
implantação do Registro Declaratório Eletrônico, o trabalho com o GIE (Grupo de Investidores Estrangeiros),
o uso de restrições tributárias (IOF) ou administrativas
aos capitais de curto prazo e a incorporação do Censo
de Capitais Estrangeiros como rotina do departamento,
são exemplos dessa reciclagem.
111. Foi a partir dos recursos humanos e materiais do
Firce que começaram os lançamentos de bônus da República em 1995, ou seja, a nossa reentrada no mercado
internacional de capitais. Fizemos 16 lançamentos em
dez moedas diferentes, nas estruturas mais variadas, incluindo Euryens, Samurais, Caravelas, Bônus Paralelos,
Euromarcos, Eurolibras, Euroliras, Euro propriamente
dito, e bônus globais em dólares, incluindo o lançamento do nosso bônus de 30 anos, o BR-27, numa operação
de troca inovadora que ganhou diversos prêmios da imprensa especializada.
112. Viajamos o mundo inteiro contando as virtudes
do Plano Real e das perspectivas do Brasil. Meus agradecimentos aos amigos do Firce Marcio Cartier, Fernando Gomes, Luiz Carlos, Antonio Martins e também,
e muito especialmente aos amigos do Tesouro, Murilo
Portugal, Eduardo Augusto Guimarães e Fábio Barbosa.
* 113. Este trabalho foi precedido de um outro da
maior importância, o de encerrar as negociações da dívida externa da década passada com a emissão dos bônus "brady", processo que envolveu uma complexa
operação de aquisição de títulos do Tesouro Americano
em mercado para servirem de garantia colateral a alguns dos nossos bônus, duras negociações com o FMI,
que não nos apoiou nesse projeto, e o difícil acordo com
a família Dan. Meus agradecimentos ao doutor Sergio
Ruffoni, ao doutor José Linaldo Aguiar e respectivas
equipes pelo excelente trabalho.
Advogados
* 114. A administração pública é regida pelo princípio da legalidade, ou seja, ao contrário do que se passa
no setor privado, tudo é proibido exceto aquilo que está
expressamente autorizado em lei. Portanto, àqueles que
iniciam suas carreiras no setor público, eu recomendo
que um bom tempo seja dedicado ao diálogo com os advogados, sendo este, devo dizer, um dos maiores desafios que enfrentei.
* 115. Minhas homenagens aos amigos juristas do BC
a começar pelo meu amigo doutor José Coelho Ferreira,
procurador-geral do BC, aos demais membros de sua
equipe, doutores Carlos Alberto Radstrom, também os
colegas expatriados para o Ministério da Fazenda, doutores Luiz Carlos Sturzenegger e Daniel Rodrigues Alves. Tudo o que fizemos tem a marca desses senhores, a
marca do Bom Direito, graças ao que, o Plano Real não
sofreu ameaças nos tribunais, exceto por oportunistas
de ocasião, como os que questionaram o artigo 38 da lei
8.880, ou de profissionais da pilhagem ao Erário, como
os que procuram ressuscitar, mas com correção monetária que jamais tiveram, as apólices prescritas pelos decretos-lei 263/ 67 e 396/68, do então ministro Roberto
Campos.
* 116. Absurdos como este me fazem refletir sobre a
indústria de ações para pilhar os cofres públicos, e sobre maneiras pelas quais a União deveria tomar a iniciativa de processar aqueles que de má-fé abusam dos mecanismos da Justiça com o propósito do enriquecimento sem causa.
Instituições para a estabilidade e o desenvolvimento
117. No estágio atual do Plano Real, seis anos após a
criação da nova moeda, é preciso passar da teoria e da
retórica para a prática, no terreno da independência do
BC. Nas últimas duas décadas, a independência dos
bancos centrais avançou em todo o mundo e sem enfrentar maiores controvérsias, tendo lugar em governos
de esquerda ou de direita, no Ocidente e no Oriente,
pois teve como motivação uma tese muito poderosa: a
despolitização da moeda, algo que apenas engrandece a
democracia. Trata-se de o Parlamento confiar ao BC a
missão de defender o poder de compra da moeda nacional, ou seja, dar-lhe a autonomia operacional para cumprir esta missão, mas também a obrigação de prestar
contas à sociedade.
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