|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
PAULO RABELLO DE CASTRO
Tudo beleza?
Nem tanto. Embora o avanço da economia seja inegável, é preciso lembrar que nosso time joga a bola de sempre
MISTO DE ALEGRIA resignada
e simpatia espontânea,
"Tudo beleza?" é uma dádiva do Rio. Essa exclamação interrogativa é a que será usada pelo presidente do Banco Central do Brasil
quando se encontrar na Basiléia, na
Suíça, com os colegas de 30 outras
instituições monetárias. Com o Brasil está tudo beleza, e com vocês?
Dólar a dois reais, reservas do país
para além de US$ 120 bilhões, o Brasil volta a ficar bonito e gostoso para
100% dos consumidores.
O dólar baratíssimo entrega a inflação de 2007 dentro da meta
anual, eleva aos píncaros a popularidade do presidente, agrada aos investidores externos e engorda os resultados do setor financeiro. Não
fosse pela perturbadora falta de empregos atingindo milhões de jovens
brasileiros e a renitente reclamação
de industriais desgostosos com sua
baixa rentabilidade, seria o caso de
se gritar em uníssono "Sim, tudo beleza!".
Nem tanto. Embora o avanço da
economia do Brasil seja inegável, é
preciso lembrar que nosso time joga
a bola de sempre. O adversário é que
nos convida a um placar de vitória.
Se descontado o enorme crescimento mundial (5% ao ano), mesmo
após a revisão do PIB brasileiro, o
desempenho da era Lula apenas
iguala a de FHC, que fica em 70% da
expansão média do PIB mundial.
Ou seja, o modelito é o mesmo: as
premissas é que têm sido absurdamente favoráveis ao aumento do
conforto social. A pergunta que incomoda é: não estaríamos jogando
fora uma chance espetacular de reformulação do modelo econômico
que nos tem condenado à semi-estagnação?
É tempo de rever conceitos e estabelecer metas mais corajosas. O desafio da agenda 21 do Brasil é gerar
empregos para 18 milhões de jovens
-estes, os da faixa entre 20 e 25
anos-, dos quais quase metade permanece desempregada. Não adianta
o presidente dizer que essa é a geração que herdou a maldição disso ou
daquilo. Empregos se geram com a
remoção das obstruções ao empreendedorismo, à acumulação de
poupança e ao resultado positivo
das atividades produtivas.
Um plano baseado em três pontos
deveria alicerçar o PAC, transformando-o num pacto verdadeiro
com o Brasil produtivo: 1) baixar o
custo financeiro da produção; 2)
operar a simplificação tributária; 3)
democratizar o acesso popular ao
capital, a começar pela Previdência.
O que se sugere aqui é muito e é
pouco, porque restaria todo um outro plano de preparação educacional
e tecnológica do qual não começamos sequer a arranhar a superfície.
O PAC do setor privado começa
por nos perguntarmos, com mais inteligência e menos deslumbramento, por que ficamos tão espertos a
ponto de o real ser tão forte e as demais moedas tão fracas? Tem a ver
com nosso custo financeiro, que tem
remunerado o dinheiro, no Brasil,
até seis vezes mais que o seu custo/
risco lá fora.
Simplificar a tributação empresarial também é bem mais do que a
agenda de baixar alguns tributos para segmentos cuja competição chinesa os está arrebentando. A tributação é para todos, assim como deve
ser sua simplificação e desoneração.
Finalmente, a democratização do
capital. Para tanto, a remoção dos
obstáculos (leia-se, INSS, FGTS, PIS
etc.) que hoje desviam o curso das
poupanças para longe da sua acumulação em fundos do próprio trabalhador é a revolução que falta aos
desconfiados jovens, para quem a
exclamação "tudo beleza" não passe
de "caô de bacana".
PAULO RABELLO DE CASTRO, 58, doutor em economia
pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do
Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora
de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria
econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da
Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias,
nesta coluna.
rabellodecastro@uol.com.br
Texto Anterior: Presidente do Banco Mundial pede mais tempo para apresentar defesa Próximo Texto: Risco: Dirigente do BC chinês diz temer bolha em Bolsa local Índice
|