São Paulo, quarta-feira, 09 de maio de 2007

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PAULO RABELLO DE CASTRO

Tudo beleza?

Nem tanto. Embora o avanço da economia seja inegável, é preciso lembrar que nosso time joga a bola de sempre

MISTO DE ALEGRIA resignada e simpatia espontânea, "Tudo beleza?" é uma dádiva do Rio. Essa exclamação interrogativa é a que será usada pelo presidente do Banco Central do Brasil quando se encontrar na Basiléia, na Suíça, com os colegas de 30 outras instituições monetárias. Com o Brasil está tudo beleza, e com vocês? Dólar a dois reais, reservas do país para além de US$ 120 bilhões, o Brasil volta a ficar bonito e gostoso para 100% dos consumidores.
O dólar baratíssimo entrega a inflação de 2007 dentro da meta anual, eleva aos píncaros a popularidade do presidente, agrada aos investidores externos e engorda os resultados do setor financeiro. Não fosse pela perturbadora falta de empregos atingindo milhões de jovens brasileiros e a renitente reclamação de industriais desgostosos com sua baixa rentabilidade, seria o caso de se gritar em uníssono "Sim, tudo beleza!".
Nem tanto. Embora o avanço da economia do Brasil seja inegável, é preciso lembrar que nosso time joga a bola de sempre. O adversário é que nos convida a um placar de vitória. Se descontado o enorme crescimento mundial (5% ao ano), mesmo após a revisão do PIB brasileiro, o desempenho da era Lula apenas iguala a de FHC, que fica em 70% da expansão média do PIB mundial.
Ou seja, o modelito é o mesmo: as premissas é que têm sido absurdamente favoráveis ao aumento do conforto social. A pergunta que incomoda é: não estaríamos jogando fora uma chance espetacular de reformulação do modelo econômico que nos tem condenado à semi-estagnação?
É tempo de rever conceitos e estabelecer metas mais corajosas. O desafio da agenda 21 do Brasil é gerar empregos para 18 milhões de jovens -estes, os da faixa entre 20 e 25 anos-, dos quais quase metade permanece desempregada. Não adianta o presidente dizer que essa é a geração que herdou a maldição disso ou daquilo. Empregos se geram com a remoção das obstruções ao empreendedorismo, à acumulação de poupança e ao resultado positivo das atividades produtivas.
Um plano baseado em três pontos deveria alicerçar o PAC, transformando-o num pacto verdadeiro com o Brasil produtivo: 1) baixar o custo financeiro da produção; 2) operar a simplificação tributária; 3) democratizar o acesso popular ao capital, a começar pela Previdência.
O que se sugere aqui é muito e é pouco, porque restaria todo um outro plano de preparação educacional e tecnológica do qual não começamos sequer a arranhar a superfície.
O PAC do setor privado começa por nos perguntarmos, com mais inteligência e menos deslumbramento, por que ficamos tão espertos a ponto de o real ser tão forte e as demais moedas tão fracas? Tem a ver com nosso custo financeiro, que tem remunerado o dinheiro, no Brasil, até seis vezes mais que o seu custo/ risco lá fora.
Simplificar a tributação empresarial também é bem mais do que a agenda de baixar alguns tributos para segmentos cuja competição chinesa os está arrebentando. A tributação é para todos, assim como deve ser sua simplificação e desoneração.
Finalmente, a democratização do capital. Para tanto, a remoção dos obstáculos (leia-se, INSS, FGTS, PIS etc.) que hoje desviam o curso das poupanças para longe da sua acumulação em fundos do próprio trabalhador é a revolução que falta aos desconfiados jovens, para quem a exclamação "tudo beleza" não passe de "caô de bacana".


PAULO RABELLO DE CASTRO, 58, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

rabellodecastro@uol.com.br


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