São Paulo, domingo, 09 de junho de 2002

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"FMI deveria pressionar por redução da dívida"

DE WASHINGTON

Leia a seguir a conclusão da entrevista concedida à Folha pelo economista Morris Goldstein, especialista em mercados internacionais de capitais.

Folha - O FMI poderia ou deveria ter pressionado mais o Brasil a reduzir sua dívida pública?
Morris Goldstein -
Deveria e poderia. Sei que é difícil obrigar um país a reestruturar sua dívida, principalmente quando o dinheiro está entrando. Nos próximos cinco anos, o FMI e as economias emergentes terão de mudar sua maneira de contrair dívidas e de lidar com elas, domésticas ou externas. Hoje o FMI não quer forçar o país a reestruturar para não ser acusado de estimular o calote. Então, a dívida vira um elefante na sala que as pessoas fingem não ver. Mas é o elefante que causa o problema.

Folha - Como o sr. acha que o secretário do Tesouro dos EUA, Paul O'Neill, agiria com o Brasil no caso de uma crise de pagamento? Como lidou com a Argentina, fechando os cofres e desprezando a hipótese de contágio?
Goldstein -
Eles tenderiam a ajudar o Brasil devido ao histórico recente de sucesso da política econômica e do bom andamento do programa com o FMI. Além disso, o Brasil é maior, e eles teriam mais medo de contágio.

Folha - E se Lula ganhar? O FMI e O'Neill ajudariam o país?
Goldstein -
Depende das políticas que Lula adotar. Se parecer a eles que a culpa da crise é do próximo governo, as chances de um novo pacote serão pequenas. Mas o Brasil está numa situação da qual não sairá apenas com um novo pacote do FMI. Precisa avançar para uma situação em que o perfil de sua dívida se torne sustentável. É por isso que o FMI e o Tesouro estão tentando encontrar um mecanismo alternativo para resolver dívidas de países emergentes.

Folha - Segundo autoridades brasileiras, economistas estrangeiros como o sr. nunca lidaram com a rolagem da dívida interna brasileira, não entendem sua dinâmica nem reconhecem a tradição oficial do país de administrá-la. Dizem que a dívida interna é grande, mas está nas mãos de investidores domésticos que não têm planos de fugir do país. Citam como exemplo as eleições de 1998, quando o BC e o Tesouro também foram obrigados a encurtar o perfil da dívida mobiliária, mas não houve uma reprogramação forçada da dívida.
Goldstein -
Todos os países têm peculiaridades que os fazem acreditar que são diferentes. Mas os investidores domésticos, como os estrangeiros, vêem a situação como ela é. Não quero desmerecer o Brasil. Acho que o país está numa situação muito melhor que a Argentina. E Malan e Fraga fizeram um trabalho estupendo no país. Mas a dívida externa brasileira sozinha é enorme se comparada com as exportações. Além disso, é muito mais indexada ao dólar do que era em 1998. Historicamente, países nessa situação dificilmente escapam da armadilha da dívida por muito tempo. Meu coração espera que o Brasil escape, mas minha cabeça sugere outra coisa.


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