São Paulo, domingo, 09 de junho de 2002

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PERDAS E DANOS

Até o final de ano vencem US$ 10,8 bi de dívidas de empresas e bancos no exterior; falta refinanciamento

Fica difícil para empresas "rolar papagaios"

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

As empresas e bancos brasileiros que têm US$ 10,8 bilhões de dívidas que vão vencer no mercado internacional, até o final do ano, já enfrentam dificuldades para rolar (refinanciar) esses "papagaios".
"Não há linhas para refinanciar esses débitos no exterior. O crédito está rarefeito, os bancos só estão refinanciando empresas de primeira linha", diz Marcos Camargo, diretor de mercado de capitais do BankBoston.
As taxas de juros pedidas na rolagem das dívidas, mesmo para empresas de primeira linha, estão subindo e os prazos concedidos estão cada vez menores. Além disso, muitas instituições estão exigindo um pacote de garantias aos devedores que inclui seguro de risco político e caução (comprometimento de bens em garantia).
A pior situação, segundo Camargo, é a das empresas de segunda e terceira linhas que, no passado, emitiram títulos da dívida e hoje não têm recursos para resgatá-los. Como os demais especialistas ouvidos pela Folha ele prefere não citar quais são as companhias nessa situação.
"A economia entrou em retração, essas empresas perderam receita e estão em dificuldades. Algumas delas, se conseguirem oferecer novas garantias, podem até refinanciar a dívida; outras, que se alavancaram demais [tomaram muito dinheiro proporcionalmente ao seu capital" vão quebrar", acrescenta Camargo. Ele diz, no entanto, não acreditar em "risco sistêmico".
Também os bancos locais que emitiram títulos lá fora para captar recursos estão sentindo o aperto. "Os bancos grandes sempre tiveram acesso fácil ao mercado, mas os menores estão tendo problemas de refinanciamento. Nas últimas semanas piorou a situação de rolagem da dívida dos pequenos", diz Rafael Guedes, diretor-geral de FitchRatings, agência de classificação de risco.
A dificuldade de rolagem da dívida externa das empresas é consequência do estreitamento do crédito internacional para o país, que começou no final do ano passado, e se acentuou nas últimas duas semanas em consequência das turbulências sofridas pelo mercado financeiro local.
As eleições, e a possibilidade de mudança na política econômica, estariam por trás do estreitamento do crédito para o país, segundo especialistas ouvidos pela Folha. Mas há, também, movimentos oportunistas de instituições financeiras internacionais.
"Há bancos segurando o crédito agora, esperando que as taxas subam mais até o final do ano para emprestar por um custo maior", diz Ernesto Meyer, vice-presidente de operações estruturadas de corporate do BNP Paribas.
A rigor, o crédito para mercados emergentes, como o Brasil, começou a minguar após o 11 de setembro quando o dinheiro que voa pelo mundo buscou o porto seguro dos títulos do tesouro americano. O cenário político interno ajudou a fechar as torneiras dos agentes financeiros, mas dificuldades setoriais também estão impactando o crédito.
Empresas do setor elétrico, que perderam receita com o racionamento e carregam pesadas dívidas em dólar, estariam com maior dificuldade para rolar os débitos que vencem nos próximos meses.
É o caso da Eletropaulo, que tem um vencimento de US$ 400 milhões em eurobonds e R$ 100 milhões em debêntures no segundo semestre. "Se o candidato do governo continuar patinando nas pesquisas, a empresa não conseguirá rolar a dívida", diz Gustavo Alcântara, analista do banco Prosper.
Segundo Alcântara, a geração de caixa da Eletropaulo também não é suficiente para saldar essa dívida. "A situação da empresa é difícil, já que não pode nem recorrer aos acionistas controladores", observa. A americana AES, que controla a Eletropaulo, passa por dificuldades e suas ações caíram 90% em um ano, segundo o analista. Procurada pela Folha, a empresa não se manifestou.
Também no setor de telecomunicações, que enfrenta uma crise de excesso de capacidade e baixa demanda, algumas companhias estariam com dificuldades de rolagem de suas dívidas.
Mesmo o setor siderúrgico, que por ser exportador sempre usufruiu de crédito fácil, já sofre restrições. Os fabricantes de aços planos, que podem ver suas vendas encolherem por conta do protecionismo dos EUA, já estariam enfrentando restrições ao crédito e problemas para rolar as dívidas.


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