São Paulo, domingo, 09 de agosto de 2009

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ALBERT FISHLOW

É a economia, companheiro?


Será lastimável se, uma vez mais, os países evitarem a necessária reforma do sistema financeiro mundial


O MUNDO às vezes parece estranho. Tudo isso aconteceu na última semana: Kim Jong-il, o ditador moribundo da Coreia do Norte, queria tanto uma conversa direta com o ex-presidente norte-americano Bill Clinton que libertou duas repórteres da prisão imediatamente.
Ahmadinejad conseguiu tomar posse para o seu segundo mandado presidencial no Irã, mas apenas depois de um processo que pareceu unir direita e esquerda em oposição a que assumisse. Chávez, tendo fracassado em seus esforços para reconduzir ao cargo o presidente Zelaya, de Honduras, agora ameaça conflito com a Colômbia.
Mesmo Berlusconi voltou a receber atenção, quando uma de suas muitas "amigas" mais jovens prometeu contar tudo, com base nas gravações secretas que tem em seu poder. Até o Brasil parece estar administrando uma nova crise de agosto, desta vez envolvendo o ex-presidente Sarney, com a reabertura dos trabalhos do Senado.
Esse caso pode pelo menos ser relacionado a sérias questões políticas da campanha presidencial iminente. É claro que ela não deveria começar antes do ano que vem, mas já está em curso. Algumas pessoas, cansadas de toda a atenção dedicada às notícias econômicas nos últimos 18 meses, sem dúvida receberam a mudança com agrado.
O temido retorno a uma depressão mais séria, desta vez difundida de forma mais ampla pelo mundo, não aconteceu. Todos os muitos livros escritos sobre o colapso do sistema financeiro internacional estarão em breve sendo vendidos por preços mais baixos. Acompanhado pela recuperação das Bolsas de Valores em toda parte, o encorajador relatório sobre o desemprego nos Estados Unidos ofereceu novo sinal de um futuro econômico mais brilhante.
Seria lastimável, no entanto, se uma vez mais, como aconteceu ao final da crise asiática dos anos 90, os países continuassem a evitar a reforma financeira necessária. Ou se presumissem que regulamentação nacional independente será suficiente.
Existe um mercado mundial, hoje, não apenas de bens e serviços, mas principalmente de finanças. As transações se expandiram exponencialmente, e em formas inovadoras -"credit default swaps", por exemplo-, que são conceitualmente brilhantes, mas também potencialmente desastrosas. A reforma regulatória tinha posição de destaque na agenda do Grupo dos 20 (G20) em sua mais recente reunião, no começo de abril. Voltará a tê-la em setembro.
Comunicados não são suficientes -tampouco atenção exclusiva aos detalhes técnicos, que são muitos. A questão envolve decisões políticas, inerentemente. Que autoridade deve ser conferida ao banco central, em comparação com outros potenciais participantes? Ou será que o banco central deve ser subordinado a uma nova autoridade central? E mais, por fim: como tornar essas decisões nacionais consistentes em termos internacionais?
Essas questões não serão colocadas em discussão séria nos próximos meses. Eleições na Alemanha e no Japão interferirão. A saúde ocupará posição central nos Estados Unidos. Os problemas internacionais, como a questão Israel-Palestina, Afeganistão, Paquistão, Iraque e Irã, para mencionar apenas alguns poucos, não exatamente desapareceram. Mas um dia teremos de retornar ao tema do sistema financeiro internacional. Ter escapado uma vez mais, e a alto custo, não equivale a uma resolução final.

Tradução de PAULO MIGLIACCI

ALBERT FISHLOW, 73, é professor emérito da Universidade Columbia e da Universidade Berkeley. Escreve quinzenalmente, aos domingos, nesta coluna.

afishlow@uol.com.br



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