São Paulo, sábado, 09 de setembro de 2006

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GESNER OLIVEIRA

Desburocratização ou morte!

Urge fazer plano de redução e simplificação tributária; no mundo globalizado, só assim se pode atrair investimentos

UMA BOA e uma má notícia durante a Semana da Pátria. A má notícia: o Brasil está na 121ª posição em um conjunto de 175 países classificados pelo Banco Mundial de acordo com a qualidade do ambiente de negócios. A boa notícia: foi aprovada na Câmara o projeto de Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, diminuindo um pouco o pesadelo de impostos e burocracia para segmento importante do setor produtivo.
Os resultados do Banco Mundial estão disponíveis em www.doing business.org. A avaliação leva em consideração o grau de dificuldade que os empreendedores enfrentam em cada país para abrir e fechar empresas, registrar e transferir propriedade, obter crédito e cumprir contratos.
Nova Zelândia, Cingapura e Estados Unidos estão nas três primeiras posições, equivalente a classificar-se para a Libertadores em linguagem de Campeonato Brasileiro. Talvez o Brasil não consiga tanto em quatro anos. Mas dá para sair da zona de rebaixamento. Tailândia, Chile e África do Sul, por exemplo, estão entre os 30 primeiros. Na América Latina, além do Chile, México (43ª) e Uruguai (64ª) estão em posições menos vexatórias do que a brasileira. Uma meta realista para o Brasil seria conquistar um lugar entre os 50 primeiros colocados até 2010.
Isso requer plano de ação que infelizmente não existe na atualidade nem tampouco é objeto de debate eleitoral. Seguem duas idéias. A primeira é a de fortalecer as ilhas de facilitação de negócios e coordenação das burocracias, difundindo experiências bem-sucedidas em algumas cidades e Estados.
A segunda é uma espécie de disque-denúncia para a "burrocracia", definida como aquele conjunto de exigências burocráticas irracionais que não servem para nada; a não ser, é claro, para gerar privilégios e corrupção. Mas não basta constatar o absurdo. É preciso expurgá-lo em vez de pensar de forma resignada que "no Brasil é assim mesmo...". Uma força-tarefa mista de Executivo e Legislativo das diferentes esferas de governo poderia manter acesa a chama da desburocratização.
A aprovação do projeto de lei geral para micro e pequenas empresas constitui avanço. A proposição prevê razoável simplificação e beneficia cerca de 5 milhões de micro e pequenas empresas que respondem por 20% do PIB e 60% dos empregos formais. O chamado "supersimples" em particular permite a unificação de nove obrigações: seis impostos federais (IRPJ, IPI, CSLL, PIS/Pasep, Cofins e INSS), um estadual (ICMS), um municipal (ISS), além das contribuições para as entidades privadas de formação profissional e de serviço social. A mera enumeração desses itens dá uma idéia da dor de cabeça existente para quem pretende produzir no Brasil.
O maior benefício da desburocratização é a redução da informalidade. O cipoal de regras e os enormes custos tributário e previdenciário no Brasil constituem fortes incentivos econômicos para a empresa recorrer ao mercado informal. O mesmo Banco Mundial estima que a informalidade no Brasil represente cerca de 40% do PIB. Tal fenômeno condena o país ao crescimento medíocre ao inibir o investimento e limitar o acesso ao crédito.
Ações que atenuem a derrama fiscal e desburocratizem a economia contribuem para o Brasil crescer rápido e de forma sustentada. O foco na micro e pequena empresa é justificável pelo fato de os custos administrativos e contábeis pesarem proporcionalmente mais sobre o faturamento das pequenas do que das grandes empresas. A desburocratização ajuda também a aumentar a concorrência nos mercados ao reduzir barreiras à entrada de novas empresas.
No entanto, a desoneração das pequenas é insuficiente por si só para resolver o problema. É insustentável manter regimes tributários radicalmente distintos por muito tempo. Isso termina por gerar mais distorções. É urgente, portanto, desenhar um plano de redução e simplificação da carga tributária para a próxima década.
No mundo globalizado não há outro caminho para atrair investimentos e gerar empregos. A substituição do tempo burocrático pelo tempo econômico se tornou questão de sobrevivência.


GESNER OLIVEIRA , 50, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e Economia e ex-presidente do Cade. Internet: www.gesneroliveira.com.br
gesner@fgvsp.br


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