São Paulo, terça-feira, 09 de setembro de 2008

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Alívio para os EUA não garante melhora no Brasil

Em meio a incertezas nos mercados, analistas vêem EUA atraindo mais capital

Dólar deve seguir em alta pelo mundo enquanto as commodities, cruciais ao Brasil, podem punir o país no médio prazo


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Economistas e analistas de mercado acham que o socorro dos EUA aos mercados deve estancar a depreciação de títulos americanos e dos bancos do país, criando condições para a retomada do crédito e do consumo nos EUA. Mas, sobre o Brasil, dizem que o cenário ainda é incerto e pode piorar, pois o alívio nos EUA deve atrair capital daqui para lá.
Isso porque os EUA já sofrem com a crise desde meados do ano passado, quando ações e papéis de dívidas começaram a derreter, e só há quatro meses esse movimento chegou ao Brasil e a outros emergentes da América Latina e da Ásia.
Foi o que ocorreu ontem quando as Bolsas americanas e européias subiram, enquanto algumas latino-americanas e a chinesa (Xangai) seguiram em queda. A alta da Bovespa no início do dia foi vista por analistas como uma "janela de saída" para alguns investidores venderem ações com preço melhor do que na semana passada.
Na avaliação de Marcelo Ribeiro, estrategista da Pentágono Asset, os EUA devem "arrumar a casa" nos próximos meses, o que pode elevar preços de papéis da dívida do governo americano e as cotações do dólar -inclusive no Brasil.
"A primeira reação ontem foi que a intervenção voltava a fortalecer as commodities e enfraquecia o dólar. O real chegou a subir. Só que, logo em seguida, viram que esse pacote fortalece a economia americana. Durante um ano as expectativas [nos EUA] foram deterioradas. Agora vamos começar a precificar os problemas no resto do mundo", disse Ribeiro.
Não ha consenso sobre o rumo dos preços das commodities e do fluxo de dinheiro para países emergentes. Uma das vozes dissonantes é a do economista americano Marc Faber, que em relatório ontem afirmou que o euro e o preço de algumas commodities podem ter caído demais. "A fraqueza das ações do setor financeiro está contaminando os demais ativos do mundo. O dólar se fortaleceu, e algumas ações e commodities ficaram com preços muito depreciados. Pode vir uma recuperação nas próximas semanas", disse.
Já Márcio Holland, economista da FGV (Fundação Getulio Vargas), está mais pessimista. "A cada dia fica mais claro para muitos otimistas de plantão que a crise mundial é muito mais séria, mais profunda e será mais prolongada do que se imagina. Economias como a brasileira, altamente dependente de commodities, sentirão no médio prazo muito mais a crise. O comportamento do mercado mostrou que o Brasil está mais volátil do que qualquer outra parte do mundo, mesmo pagando as maiores taxas de juros", disse Holland.
Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, a intervenção esta longe de resolver a crise mesmo nos EUA ou de diminuir as incertezas globais. "As Bolsas vão comemorar por uns dias. O sinal decisivo, porém, continua em algum lugar entre o mercado de trabalho e os preços dos imóveis nos EUA. E isso ficara para o próximo governo", afirmou.
Gonçalves discorda dos que acreditam que a intervenção foi um prêmio para as duas agencias e para os bancos americanos. Ele lembra que os acionista de Fannie Mae e Freddie Mac viram suas ações virarem pó, pois serão os últimos beneficiados -atrás de credores, do Tesouro- se a carteira dessas empresas melhorar.
Especialista em risco, Alexandre Jorge Chaia, do Ibmec-SP, destaca que, mais uma vez, o governo dos EUA "passou a mão" na cabeça dos bancos que assumiram riscos demasiados. "Foi uma declaração de que podem fazer as besteiras que quiserem, que serão salvos", disse.
Para o Brasil, Chaia vê mais liquidez para as empresas e os bancos captarem no exterior, mas afirma que ainda é cedo para estimar o impacto na Bovespa. "Ninguém tem muita noção no Brasil do impacto do pacote. Vimos os juros [na BM&F] subindo, mas não tinha motivo para isso. Para o Brasil, não foi um dia muito bom. Cria oportunidade de saída da Bolsa e para repensar os investimentos como um todo", disse.


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