São Paulo, Quinta-feira, 09 de Setembro de 1999
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LUÍS NASSIF

O pacto potiguar

Enquanto o governo federal brinca de desenvolvimento, os Estados fazem. Os exemplos do Ceará e da Bahia -e de Minas Gerais, antes da era Itamar- indicam que, quando a região consegue fechar pactos de desenvolvimento e montar planos de longo prazo, os objetivos são alcançados.
O caso mais recente é o do "Pacto Potiguar" de desenvolvimento, montado em torno da Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte e de seu presidente, Abelírio Vasconcellos da Rocha, o Bira Rocha. É um modelo a ser seguido por outros Estados que aspiram ao desenvolvimento pelas próprias pernas.
O Rio Grande do Norte é um Estado "sui generis". Nada tem que o destaque em relação aos vizinhos, nem grandes feitos nem grandes desgraças. Tem a melhor renda "per capita" do Nordeste, com seus 2,5 milhões de habitantes.
Quando teve início a disputa pela refinaria da Petrobras no Nordeste, o Rio Grande do Norte viu que, no campo político, teria pouca chance perto dos vizinhos. O caminho encontrado foi recorrer a um trabalho eminentemente técnico. Primeiro, identificaram-se as vantagens comparativas do Estado: a maior produção de petróleo em terra do país, com gás e hidrocarboneto; 96% da produção nacional de sal marinho e 100% das chamadas águas-mães (um tipo de água marinha que tem evaporação perfeita e permite produzir sal marinho sem a necessidade de ingredientes adicionais); calcário, sílica e água em abundância na barragem Armando Ribeiro. Tudo isso a uma distância de apenas 70 km2.
Dispondo dessas vantagens, o passo seguinte foi a contratação de uma consultoria internacional para identificar os produtos competitivos, para a montagem de um Pólo de Gás e Sal.
Dessa combinação, resultaram quatro núcleos centrais de produção. O primeiro, a Petroquímica, com o Pólo Industrial de Guamaré, investimento da Petrobras. O segundo, um projeto de soda-cloro. O terceiro, de magnésio e derivados. E o quarto, de barrilha e derivados.
O passo seguinte foi contatar bancos internacionais, que pudessem prospectar investidores para os diversos projetos. Ainda estão sendo prospectados investidores para o projeto de soda-cloro. Para o projeto de magnésio, o francês Paribas identificou o Daimler e a Ferrostaal. Houve atraso, com a crise russa.
Todas essas indústrias são eletrointensivas. Por isso, a viabilização do projeto dependia da montagem de uma central termoelétrica, utilizando o gás produzido pela Petrobras no Estado. Os preços iniciais eram proibitivos -R$ 2,44 o m3, contra R$ 1,25 dos preços internacionais. A Petrobras não concordou em reduzir o preço. Houve uma guerra surda, na qual a arma do Estado foi ameaçar aumentar violentamente o preço do Rima (o laudo de impacto ambiental, exigido para cada posto). Ocorre que a Petrobras tem 3.000 postos em terra. O preço do Rima ficou tão alto que correspondia à metade do valor do ICMS sobre a produção de gás. Caminha-se para um acordo pelo qual a Petrobras fornecerá 2 milhões de m3 a R$ 1,25.
Dentro desse esforço coordenado, o Pacto conseguiu a privatização do porto e investimentos de R$ 56 milhões na sua modernização, metade dos quais do governo federal e a outra metade da iniciativa privada. Com isso, ficam acentuadas as vantagens logísticas do Estado, o mais próximo ponto da Europa e da Ásia. De navio, ganha-se de seis a sete dias sobre São Paulo. De Boeing, três horas.
A partir dessa visão de desenvolvimento, os potiguares estão trabalhando por uma revisão da política de incentivos ao Nordeste. Todos os incentivos são baseados em renúncia fiscal. A proposta é substituir esse modelo por conversão de dívida externa para projetos exportadores, com câmbio diferenciado -modelo que é aceito pela Organização Mundial do Comércio. A conversão seria sobre percentual das exportações do ano anterior, a fim de dar "funding".
O Pacto Potiguar, assim como os demais, é a prova de que o primeiro passo para uma política de desenvolvimento são idéias claras e coesão política do Estado em torno delas.


E-mail: lnassif@uol.com.br



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