São Paulo, domingo, 10 de janeiro de 1999

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DIAGNÓSTICO & RECEITA
Mesa virada

OSIRIS LOPES FILHO

A Federação brasileira, que vinha sendo erodida pela política financeira e tributária federal, ganhou novo alento. Finalmente, surgiu na arena nacional protagonista de densidade política e com coragem para defender a autonomia financeira dos Estados, como instrumento eficaz para a prestação dos serviços públicos aos seus habitantes.
A declaração do governador de Minas Gerais, Itamar Franco, de que vai suspender, por três meses, o pagamento da dívida estadual à União, mostra que a paz dos cemitérios, imposta pelo governo federal aos Estados e municípios, está chegando ao fim.
Foi uma tomada de posição leal. A situação de degeneração gradual, mas fatal, das finanças mineiras certamente terá influenciado essa atitude. É melhor antecipar, adotando remédios preventivos, do que tentar a cura, quando o final irreversível é o desenlace trágico. É preciso mais do que topete, muito peito, para a adoção dessa denúncia do acordo.
Vai obrigar a burocracia do Ministério da Fazenda a abandonar o expediente de empurrar com a barriga a crise, para enfrentá-la estabelecendo nova negociação da dívida.
O garrote às finanças estaduais, aplicado pelo governo federal, é de longa data. A elevação das taxas de juros, ocorrida até a negociação do ano passado, exponenciou o seu montante.
Na área financeira, o famigerado Fundo de Estabilização Fiscal abocanha recursos dos Estados e municípios. Apropria-se de 20% da arrecadação do IPI e do IR; retira da base da distribuição dos Fundos de Participação o IR retido na fonte pela União, suas autarquias e fundações, nos pagamentos feitos a terceiros; capa ainda 5,6% do IR, como conseqüência de alterações na sua legislação, feitas entre 1991 e 1993, cujos efeitos já foram totalmente superados.
Enfraqueceu a base do ICMS com a Lei Kandir, redisciplinatória desse imposto, ao estabelecer dentre outras benesses a sua não-incidência sobre todas as mercadorias exportadas, inclusive os produtos primários e semi-elaborados.
A elevação da Cofins, em 50%, e a proposta de prorrogação do CPMF e seu aumento em 90% fragilizam a arrecadação do ICMS, por saturação da mesma base tributária.
É o momento de efetiva discussão do pacto federativo. Não mais garantindo-se a parte privilegiada do leão para a União, mas assegurando solidariedade na partilha com os demais entes federados. Essa, a oportunidade que Itamar está proporcionando, ao virar corajosamente a mesa.
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Osiris de Azevedo Lopes Filho, 59, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.



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