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OPINIÃO ECONÔMICA
Desnacionalização
BENJAMIN STEINBRUCH
Durante a longa crise argentina, muitas empresas
fecharam, outras encolheram e
outras ainda foram vendidas ao
capital estrangeiro.
Nada de novo. Elas foram vítimas do mesmo fenômeno que
atingiu empresas brasileiras nos
anos de crise econômica. Fragilizadas pela retração do mercado,
em conseqüência da recessão, pela falta absoluta de capital, pelos
juros elevados e pela desatualização tecnológica, muitas não
resistiram à difícil competição e
viraram presas fáceis para as
multinacionais.
Nas últimas semanas, por conta de problemas no relacionamento comercial e diplomático
com a Argentina, o Brasil foi alvo de críticas pelo que os vizinhos
chamam de "invasão brasileira".
Essa "invasão" nada mais é do
que um fenômeno natural, uma
espécie de lei da selva da economia globalizada. As empresas
brasileiras, mais bem posicionadas no mercado regional, começaram a comprar companhias
argentinas, entre elas algumas
tradicionais no país.
A Petrobras, por exemplo, comprou em 2002 a Perez Companc,
o principal grupo petrolífero argentino, por cerca de US$ 1 bilhão. A Belgo Mineira, que é da
Arcelor, adquiriu a siderúrgica
Acindar, e, recentemente, o grupo Camargo Corrêa anunciou a
negociação para a compra do
grupo cimenteiro Loma Negra.
Visto do lado brasileiro, esse fenômeno é positivo. Defendo há
muito tempo a necessidade de
internacionalização dos grandes
grupos brasileiros. A instalação
de unidades industriais no exterior ajuda a estimular exportações de matérias-primas e componentes, abre mercados para
produtos nacionais e proporciona lucros que podem ser remetidos para a matriz.
Mas, para quem observa o fenômeno do lado argentino, trata-se de um problema. Rejeito,
qualquer que seja o argumento,
a desnacionalização de setores
estratégicos, como os de siderurgia, petróleo e petroquímica, logística, mineração, geração de
energia e outros. Não tenho nenhuma procuração para dar palpites sobre a estratégia dos vizinhos do Mercosul, mas considero
que a desnacionalização desses
setores não é boa nem para o
Brasil, nem para a Argentina,
nem para nenhum outro país.
Também não cabem críticas a
empresários que venderam suas
empresas, aqui ou na Argentina.
Eles o fizeram, em geral, premidos por dificuldades financeiras.
Mas podemos entender perfeitamente a gritaria argentina contra a presença cada vez maior de
capitais brasileiros no país.
O papel da empresa nacional é
fundamental para o desenvolvimento dos países. A experiência
do apagão de 2001, por exemplo,
ainda está fresca na memória
dos brasileiros para mostrar que
não passa de uma ilusão a idéia
de que se pode entregar unicamente a empresas estrangeiras a
tarefa de expandir a oferta de
energia. Na hora da crise, algumas cancelaram investimentos e
ameaçaram deixar o país.
Uma ampla pesquisa feita recentemente pelo Ipea (Instituto
de Pesquisa Econômica Aplicada) revelou que também constitui uma ilusão a idéia de que as
filiais de companhias estrangeiras investem mais em tecnologia
do que as nacionais.
O trabalho analisou dados de
72 mil indústrias registradas no
Brasil, de todos os tamanhos. E a
conclusão foi surpreendente: as
nacionais investem 45% mais
que as filiais das estrangeiras em
pesquisa e desenvolvimento.
Além disso, essas indústrias que
apostam na inovação tecnológica lucram e exportam mais, pagam melhores salários, proporcionam empregos mais estáveis e
investem mais recursos na formação de mão-de-obra.
Não há, portanto, como recriminar os argentinos por conta da
gritaria contra a desnacionalização de suas empresas. Eles estão
manifestando apenas um nacionalismo sadio, aquele que visa a
proteger do assédio estrangeiro
setores estratégicos de sua economia. Um exemplo para nós, brasileiros.
Benjamin Steinbruch, 51, empresário,
é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho
de administração da empresa e primeiro
vice-presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo).
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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