São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Jabuticaba


A elevada taxa de juros internos atrai capital especulativo; essa é uma jabuticaba que só existe aqui

INFORMAÇÕES conflitantes fascinam o observador da cena econômica atual. O Brasil, que conseguiu dois graus de investimento em um mês, virou território seguro para o investidor internacional. É fartamente elogiado lá fora. Pela primeira vez, desde sempre, conseguiu superávit nominal nas contas do setor público -R$ 6,885 bilhões no primeiro quadrimestre.
Observe-se que nessas contas estão incluídos também os encargos de R$ 54,8 bilhões com juros da dívida pública. As taxas de desemprego são as menores em dez anos; as reservas monetárias estão perto de US$ 200 bilhões; a inflação é de apenas 5,2%, a despeito das pressões externas; a Petrobras não pára de descobrir jazidas de petróleo; o PIB (Produto Interno Bruto) cresce mais de 5% em base anual; as reservas florestais despertam cobiça mundial; a produção de alimentos aumenta num mundo faminto, com um exclusivo programa de energia renovável.
Tudo isso ocorre no Brasil de hoje. Mas, a despeito disso, há uma enorme preocupação com o futuro imediato. A recessão americana já não produz pânico, mas ainda ameaça. As cotações do barril de petróleo chegaram quase a US$ 140 e há uma generalizada pressão de custos decorrente da elevação de preços das commodities.
Por aqui, as contas externas entraram no vermelho. Nos primeiros quatro meses do ano, apresentaram déficit acumulado de US$ 14 bilhões, o maior da história. A balança comercial da indústria, que teve superávit de US$ 5,5 bilhões no primeiro trimestre de 2007, já opera com pequeno déficit.
Esse desempenho negativo tem tudo a ver com a apreciação do real, já que a cotação do dólar é a mais baixa desde 2001. E a valorização do real, por sua vez, tem tudo a ver com a elevada taxa de juros internos, a maior do mundo em termos reais, que atrai capital especulativo. Uma jabuticaba, que só existe aqui.
Mesmo sendo a mais comportada entre os países emergentes, a inflação interna traz justa inquietação, principalmente entre observadores mais ortodoxos. Por isso, o Banco Central aumentou a taxa básica de juros para 12,25% ao ano na semana passada, medida que terá indiscutível impacto no crescimento da produção e do consumo. Diante de efeitos perversos das medidas ortodoxas, respondeu-se com mais ortodoxia.
Enquanto isso, Ben Bernanke, nos Estados Unidos, recusa-se a elevar a taxa de juros americana. Em artigo brilhante no "The New York Times", o economista Paul Krugman diz que Bernanke está sendo "golpeado" porque os ortodoxos o consideram "fraco" no combate à inflação. Krugman contesta a "nova sabedoria convencional", que acha a inflação atual mais ameaçadora do que o colapso financeiro e a recessão econômica. Bernanke tem atuado até agora para evitar essas duas últimas, embora revele preocupação com a inflação.
O veredicto da ortodoxia diz que a atitude de Bernanke poderá levar a uma espiral inflacionária igual à dos anos 1970, com seguidas altas de preços e salários. Krugman discorda, porque não vê reivindicações salariais no momento. Ele sugere que a inflação cairá sozinha no momento em que a alta das commodities der uma trégua.
Esse é o debate do momento. Informações conflitantes abrem espaço para previsões animadoras ou catastróficas, dependendo do humor ou da ideologia do analista. E assim seguimos. Façam suas apostas. Apesar de algumas decepções, visto a camisa do primeiro time, o dos otimistas.


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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