São Paulo, segunda-feira, 10 de julho de 2006

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Chávez gasta US$ 4 bi em ajuda regional

Venezuelano compra títulos de países como Argentina e Equador e vende petróleo mais barato para latino-americanos

Gastos para ampliar sua influência na AL reduzem os investimentos dentro da Venezuela, o que prejudica a indústria de petróleo local


6.jul.2006 - Reuters
Kirchner (Argentina), Chávez (Venezuela), Morales (Bolívia) e Duarte (Paraguai), em Caracas


SHEILA D"AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

Além de vender petróleo mais barato para os parceiros da América Latina, o governo da Venezuela já injetou mais de US$ 3,5 bilhões na Argentina e no Equador nos últimos 12 meses e prometeu desembolsar outros US$ 200 milhões para Paraguai e Costa Rica.
Entre dólares e barris de petróleo, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, tenta se cacifar como líder na América Latina, e seu discurso populista vai ganhando espaço, escudado na defesa da amizade e integração econômica entre os países, um discurso, ao menos, parecido com o brasileiro.
A boa notícia para o Paraguai foi divulgada estrategicamente na terça-feira. Mesmo dia em que foi formalizada a entrada da Venezuela no Mercosul e que a imprensa internacional deu destaque às críticas do presidente paraguaio, Nicanor Duarte, ao Brasil e à Argentina, principais parceiros do bloco.
O custo dessa união pregada por Chávez vem sendo pago pela população da Venezuela. Uma economia em que a principal fonte de riqueza é o petróleo deveria, na avaliação de especialistas ouvidos pela Folha, investir no aumento da produção, já que o preço do produto bate sucessivos recordes.
"Com o barril a US$ 75, faz sentido aumentar a produção e, como conseqüência, elevar a receita de um país tão carente", destaca o analista Alberto Ramos, especialista para América Latina do banco Goldman Sachs, em Nova York.
Em vez disso, diz ele, os investimentos anuais do governo venezuelano nessa área variam de US$ 3 bilhões a US$ 3,5 bilhões, o mínimo necessário para manter a atual produção. "E assim mesmo, ela [a produção] vem caindo marginalmente. A Venezuela esbanja recursos que precisaria para investir na economia", afirma Ramos.
Como não há transparência nas transações, os analistas destacam a dificuldade em mensurar toda essa movimentação de Chávez na região. As estimativas são de que entre 200 mil a 250 mil barris de petróleo são distribuídos, diariamente, a custo subsidiado.
Oficialmente, a Venezuela -que produz cerca de 2,5 milhões de barris por dia - diz que entrega o produto a preço de mercado. No entanto, financia as condições de pagamento em alguns casos e, em outros, troca por gado ou serviços.
Na lista de beneficiados estão Argentina, Paraguai, Cuba, Uruguai e países do Caribe. No caso de Cuba, metade das exportações ao país é financiada em até 15 anos a juros de 1% a 2% ao ano. O resto, a Venezuela permuta com prestação de serviços em educação e saúde. No caso da Argentina, o país entrega petróleo em troca de gado.
A estratégia de Chávez de comprar apoio na região começou a ser colocada em prática no segundo semestre de 2005, quando Caracas passou a atuar como uma espécie de corretora da Argentina. Isso porque Chávez começou a adquirir títulos da dívida argentina que, em seguida, eram repassados a bancos locais e vendidos a investidores estrangeiros.
A intermediação foi necessária para evitar que os recursos obtidos com uma captação no mercado internacional da Argentina fossem direcionado automaticamente para quitar dívidas do governo com credores ainda do período da moratória de 2001. "É um movimento para expandir a sua influência e se aproximar dos países que têm dificuldades no mercado internacional", diz Ricardo Amorim, economista para América Latina do banco WestLB, em Nova York.

Títulos
Desde o ano passado, Chávez gastou US$ 3,5 bilhões com a Argentina. Outros US$ 20 milhões foram para comprar títulos do Equador. Inicialmente, o venezuelano pretendia comprar mais. "No entanto, o Equador ficou com medo de a Venezuela fazer os preços desabarem no momento seguinte porque revenderia os papéis no mercado", explica Ramos.
Já os US$ 100 milhões que serão desembolsados para o Paraguai servirão para comprar uma dívida com a hidrelétrica de Itaipu. Além disso, mais US$ 100 milhões serão usados para comprar dívidas da Costa Rica.
Apesar das investidas financeiras, Chávez vem sofrendo algumas derrotas políticas. Os candidatos apoiados por ele perderam nas eleições do México e do Peru. "No México, a porta vem sendo fechada com uma orientação de livre mercado", diz Paulo Leme, estrategista para mercados emergentes da Goldman Sachs.
Segundo ele, com essas derrotas, Chávez deixou de ocupar um espaço diplomático importante, o que diminuiu as possibilidades dele se fortalecer ainda mais num futuro próximo.


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