São Paulo, domingo, 10 de outubro de 2004

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CRISE NO AR

Desde sua fundação, empresa alterna avanços e projetos malsucedidos

Vasp segue trajetória controversa

MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Congelamento tarifário, variações do dólar, uma incursão malsucedida em vôos internacionais, a entrada de companhias aéreas mais enxutas no mercado, as dificuldades em renovar sua frota. E uma história que, a partir da privatização da empresa, foi pontuada por lances controversos.
Essas são as razões, segundo especialistas, que reduziram a Vasp ao seu estado atual -em poucas semanas, a empresa acumulou um pedido de falência, enfrentou paralisações de trabalhadores, teve a operação de seis aeronaves suspensa e correu o risco de não ter sua concessão para voar renovada pelo governo. Sem falar na possibilidade de não decolar mais a partir do dia 13 por não pagar dívidas com a Infraero.
Os problemas estiveram presentes desde os primeiros anos da vida da companhia aérea. A Viação Aérea São Paulo foi fundada em 1933, criada por um grupo de empresários de São Paulo, e estatizada em 1935, quando os prejuízos operacionais evidenciaram a necessidade de investimentos: o governo do Estado se tornou o controlador da Vasp.
Ironicamente, 55 anos depois, quando foi privatizada, em 1990, a companhia acumulava uma dívida de US$ 750 milhões. No meio do caminho, falta de autonomia nas administrações, já que o poder público interferia diretamente nas decisões, quantidade excessiva de funcionários -a aérea chegou a ter 9.300 funcionários- e baixa ocupação de seus assentos.

Canhedo
Quando passou para as mãos de Wagner Canhedo, em 1990, por US$ 43 milhões, a aérea tinha cerca de 7.000 funcionários. A frota já era considerada antiga. O novo dono da Vasp, a quem os jornais na época atribuíam um patrimônio de US$ 1 bilhão, foi considerado uma espécie de salvador pelos trabalhadores, que se aliaram a ele na compra do controle da Vasp.
O empresário tinha quatro empresas de transporte de passageiros, a Wadel, de transporte de cargas, e negócios em mineração e agropecuária, entre outros.
No início, chegou a ser chamado pelos funcionários de "Midas", aquele que transforma em ouro tudo o que toca.
Ao final de um ano sob nova direção, a empresa aumentou sua frota de 32 para 58 aviões, mas aumentou a sua dívida em dólar. Nas rotas internacionais, teve a mais baixa ocupação da indústria.
A privatização da empresa passou a ser investigada: foi criada uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), que apontou irregularidades, como o fato de os bens que Canhedo deu em garantia de compra da aérea terem sido superavaliados pelo Estado de São Paulo, segundo a CPI. O governador na época era Orestes Quércia, que investiu US$ 53 milhões na companhia aérea às vésperas da venda.
A comissão apontou que a empresa fora vendida por 25% do seu valor, com um prejuízo de pelo menos US$ 150 milhões ao governo estadual. Em 1992, empregados da Vasp já ameaçavam fazer greve por falta de pagamento.
No mesmo ano, 22 aviões foram arrestados por falta de pagamento de leasing. A empresa tinha uma dívida de US$ 16 milhões com a Infraero, segundo os jornais.
Sem crédito, a Vasp chegou a recorrer aos Correios, que pagaram uma fatura antecipadamente.
Em 94 e 95, os resultados da empresa voltaram ao azul, após anos seguidos de prejuízo. A Vasp, na época a segunda maior empresa em participação de mercado, decidiu comprar a companhia aérea Lloyd Aéreo Boliviano. A Varig havia desistido do negócio por considerar a empresa inviável economicamente. A Vasp venderia a Lloyd em 2001.
Em 98, a empresa voltou a ter prejuízo. No ano seguinte, uma manobra reduziu a participação acionária do Estado, que tinha 40% da Vasp, a pó: duas empresas de Canhedo foram incorporadas à companhia, avaliadas em um valor aprovado apenas pelo acionista majoritário. A participação do Estado caiu para 4,6%.
Em 2000, após ter suas últimas quatro maiores aeronaves arrestadas, a empresa decidiu sair do mercado de vôos internacionais.
No mesmo ano, Canhedo chegou a negociar a venda da Vasp para a igreja evangélica Assembléia de Deus.
Nos anos seguintes, com uma frota menor e com uma política agressiva de promoções, a Vasp voltou ao azul. Mas as aeronaves antigas começaram a representar um problema cada vez maior.
A entrada da Gol no mercado, em 2001, também prejudicou a empresa. Com uma estrutura enxuta, a Gol forçou a Vasp a competir com os baixos preços da concorrente. A tentativa agravou ainda mais a já combalida situação financeira da companhia.
A Vasp tinha, ao fim de 2003, uma dívida de cerca de R$ 2,7 bilhões. A sua frota atual conta com 26 aeronaves, das quais 15 em operação. A GE (General Electric) pediu a falência da aérea. A boa notícia da semana passada foi a renovação, pelo governo, da concessão provisória que permite à Vasp continuar a operar.



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