São Paulo, domingo, 11 de março de 2007

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Pouca pesquisa ameaça liderança no álcool

Esfera privada concentrou investimentos no setor nos últimos anos; até o fim de 2006, foco da gestão Lula era o biodiesel

Risco é que outros países, como os EUA, descubram técnicas de produção com outras matérias-primas ou que tenham menor custo


IURI DANTAS
HUMBERTO MEDINA
CLAUDIA DIANNI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O baixo nível de investimento em pesquisa com álcool pode ameaçar a posição do Brasil nesse mercado no médio prazo.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, o risco está em que outros países, principalmente os Estados Unidos, que já programam investimentos bilionários em pesquisa no setor, descubram antes formas economicamente viáveis para produzir álcool com outras matérias-primas ou de maneira mais barata.
O investimento em álcool começou no governo militar, com a criação do Proálcool em 1975. O programa era tocado com recursos federais, mas naufragou a partir da segunda metade dos anos 80, quando faltou produto e o consumidor perdeu a confiança no combustível. Em 1990, no governo Fernando Collor de Mello, foi extinto o IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool) e, a partir daí, o governo praticamente saiu de cena.
Nos últimos anos, os investimentos brasileiros no setor sucroalcooleiro foram basicamente privados, voltados para novas variedades de cana-de-açúcar e aperfeiçoamentos do processo produtivo.
A indústria sofreu novo impulso em 2003, com o lançamento do primeiro veículo "flex fuel", capaz de rodar com álcool e gasolina. A parceria assinada na última sexta com os Estados Unidos abre a perspectiva de mais aporte de capital para o setor.
O governo teria injetado diretamente R$ 4 milhões em pesquisa desde a extinção do IAA, segundo as contas da Ridesa (Rede Interuniversitária Para Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro). O valor global, somado ao do setor privado, não é mensurável.
Sediada em universidades federais e com cerca de cem pesquisadores, a Ridesa mantém, com recursos privados, 313 unidades de pesquisa espalhadas pelo país. Ela desenvolveu aproximadamente 57% das variedades de cana-de-açúcar plantadas no Brasil.
Os 43% restantes vieram de pesquisas -que também foram custeadas pela iniciativa privada- no CTC (Centro de Tecnologia Canavieira), em São Paulo, onde está 60% da lavoura de cana-de-açúcar do país. A indústria investiu US$ 5,3 milhões no centro para obter esses resultados.
Todas essas variáveis de cana possuem direitos autorais protegidos pela legislação em vigor. Em 2012, começam a vencer os primeiros prazos legais e alguns desses tipos vão se tornar de domínio público.
Além dos usineiros, o investimento em cana e álcool vem basicamente de organismos estrangeiros: US$ 3,75 milhões do GEF (fundo global do ambiente, em inglês), US$ 600 mil da União Européia e US$ 400 mil da agência nacional de energia da Suécia.
Mesmo a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), reconhecida pela excelência em pesquisa, só deu a largada em investimentos em biocombustíveis há um ano. Confirmados, há R$ 10 milhões para quatro grandes linhas de pesquisa, uma delas em etanol.

Foco no biodiesel
"A iniciativa privada cuidou do investimento em pesquisa nos últimos 34 anos. Agora, a Embrapa está entrando nessa área", disse Frederico Durães, chefe da Embrapa Energia.
Representante dos produtores, a CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) defende um forte investimento do governo em pesquisa.
"Não me recordo de nenhuma medida de impacto do governo na área de cana e etanol. O que aconteceu no Brasil é que o próprio setor sucroalcooleiro fez acordo com a indústria automobilística, estimulando a produção para o carro flex", afirmou Antonio Donizeti Beraldo, coordenador de comércio externo da entidade.
Até o final de 2006, embora mencionasse o etanol, o foco principal da política de combustíveis renováveis do governo era o biodiesel.
A prioridade ao etanol ficou mais forte quando o presidente americano, George W. Bush, anunciou que iria investir no produto como alternativa ao petróleo na matriz energética americana. Desde o início de sua gestão, as ordens do presidente Lula a sua equipe foram inequívocas: o mais importante era o biodiesel.


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