São Paulo, terça-feira, 11 de março de 2008

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BENJAMIN STEINBRUCH

Crescimento ainda assusta


O país pode crescer mais em 2008 se houver uma pausa no conservadorismo teimoso das autoridades monetárias

AO DIVULGAR sua nota sobre a decisão do Banco Central de manter a taxa de juros em 11,25%, na semana passada, a Fiesp teve de pedir desculpas por ser "repetitiva e monótona". Não havia, como disse a nota, razões plausíveis para justificar a perda de mais uma oportunidade de baixar a taxa.
Também peço desculpas ao leitor para voltar ao tema. Mas confesso que gostaria muito de saber qual é a justificativa mirabolante do Banco Central para o fato de o Brasil voltar a ser o campeão mundial das taxas de juros -com a decisão da semana passada, os juros reais (descontada a inflação) no Brasil ficaram em 6,73% ao ano, superando a Turquia.
É preciso ter autocontrole para não enveredar pelo caminho da pilhéria ao comentar essa questão, que não tem nada de engraçado. É assunto sério. A manutenção da Selic nas alturas, num momento em que os juros americanos desabam, aumenta o diferencial entre a taxa interna e a externa, com estímulo ao ingresso de capital de curto prazo e conseqüente desvalorização do dólar. Além disso, as taxas elevadas vão tornando a dívida interna impagável, já passando de R$ 1,2 trilhão.
Há uma visível euforia no país com a manutenção do crescimento no primeiro bimestre. Pelo que se observou até agora, a crise americana não teve ainda nenhum efeito sobre o Brasil. Alguns analistas ("Valor", 3/3/08) sugerem que a economia brasileira já vive um ciclo de crescimento sustentável, ou seja, encontrou um ritmo pelo qual a expansão atual realimenta a futura por conta de investimentos realizados.
Esse otimismo é saudável por duas razões: primeiro porque a economia vai bem mesmo e segundo porque o otimismo combate o fator medo, um inibidor de negócios. Mas, no meio da euforia, passa quase despercebida a forte redução do superávit da balança comercial. No primeiro bimestre, o saldo ficou em US$ 1,8 bilhão, com queda de 66,3% ante o mesmo período de 2007.
A razão dessa queda é clara: as importações cresceram 55%, um ritmo muito mais forte que o das exportações (24%). As vendas externas continuam em alta, puxadas mais pela elevação dos preços das matérias-primas e menos pela expansão das vendas de manufaturados. É uma tendência preocupante, que estranhamente não atormenta o governo.
O país vai tranqüilamente assumindo o papel de grande fornecedor mundial de matérias-primas, tanto industriais como agrícolas, sem demonstrar aquela preocupação que já foi obsessiva no passado de agregar valor ao produto primário, para não "exportar" empregos.
A perda de negócios com manufaturados é evidente e se dá em razão da queda do dólar, que, por sua vez, decorre em parte da diferença entre os juros internos e externos. Esse não pode continuar sendo um problema desprezível na economia, porque deixará seqüelas graves.
Quando divulgar a ata sobre a decisão de manter os juros em 11,25%, o BC certamente vai dizer que fatores de risco para a trajetória futura da inflação continuam presentes na conjuntura macroeconômica. Ora, fatores de risco fazem parte da vida.
Precaver-se contra eles é natural, mas apavorar-se e ficar paralisado é doentio. E nem há ameaça de inflação que justifique tamanho pavor. Mesmo com o freio de mão puxado, o país cresceu em 2007 acima de 5%. Pode crescer mais em 2008 se houver pausa no conservadorismo teimoso das autoridades monetárias. Deve ter pesado na decisão de manter os juros a notícia de que a indústria cresceu 8,5% em janeiro ante o mesmo mês de 2007. É pena, mas crescimento ainda assusta.


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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