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BENJAMIN STEINBRUCH
Crescimento ainda assusta
O país pode crescer mais em 2008 se houver uma pausa no conservadorismo teimoso das autoridades monetárias
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AO DIVULGAR sua nota sobre a
decisão do Banco Central de
manter a taxa de juros em
11,25%, na semana passada, a Fiesp
teve de pedir desculpas por ser "repetitiva e monótona". Não havia, como disse a nota, razões plausíveis para justificar a perda de mais uma
oportunidade de baixar a taxa.
Também peço desculpas ao leitor
para voltar ao tema. Mas confesso
que gostaria muito de saber qual é a
justificativa mirabolante do Banco
Central para o fato de o Brasil voltar
a ser o campeão mundial das taxas de
juros -com a decisão da semana
passada, os juros reais (descontada a
inflação) no Brasil ficaram em 6,73%
ao ano, superando a Turquia.
É preciso ter autocontrole para
não enveredar pelo caminho da pilhéria ao comentar essa questão, que
não tem nada de engraçado. É assunto sério. A manutenção da Selic nas
alturas, num momento em que os juros americanos desabam, aumenta o
diferencial entre a taxa interna e a
externa, com estímulo ao ingresso de
capital de curto prazo e conseqüente
desvalorização do dólar. Além disso,
as taxas elevadas vão tornando a dívida interna impagável, já passando
de R$ 1,2 trilhão.
Há uma visível euforia no país com
a manutenção do crescimento no
primeiro bimestre. Pelo que se observou até agora, a crise americana
não teve ainda nenhum efeito sobre
o Brasil. Alguns analistas ("Valor",
3/3/08) sugerem que a economia
brasileira já vive um ciclo de crescimento sustentável, ou seja, encontrou um ritmo pelo qual a expansão
atual realimenta a futura por conta
de investimentos realizados.
Esse otimismo é saudável por duas
razões: primeiro porque a economia
vai bem mesmo e segundo porque o
otimismo combate o fator medo, um
inibidor de negócios. Mas, no meio
da euforia, passa quase despercebida
a forte redução do superávit da balança comercial. No primeiro bimestre, o saldo ficou em US$ 1,8 bilhão, com queda de 66,3% ante o mesmo
período de 2007.
A razão dessa queda é clara: as importações cresceram 55%, um ritmo
muito mais forte que o das exportações (24%). As vendas externas continuam em alta, puxadas mais pela
elevação dos preços das matérias-primas e menos pela expansão das
vendas de manufaturados. É uma
tendência preocupante, que estranhamente não atormenta o governo.
O país vai tranqüilamente assumindo o papel de grande fornecedor
mundial de matérias-primas, tanto
industriais como agrícolas, sem demonstrar aquela preocupação que já
foi obsessiva no passado de agregar
valor ao produto primário, para não
"exportar" empregos.
A perda de negócios com manufaturados é evidente e se dá em razão
da queda do dólar, que, por sua vez,
decorre em parte da diferença entre
os juros internos e externos. Esse
não pode continuar sendo um problema desprezível na economia, porque deixará seqüelas graves.
Quando divulgar a ata sobre a decisão de manter os juros em 11,25%,
o BC certamente vai dizer que fatores de risco para a trajetória futura
da inflação continuam presentes na
conjuntura macroeconômica. Ora,
fatores de risco fazem parte da vida.
Precaver-se contra eles é natural,
mas apavorar-se e ficar paralisado é
doentio. E nem há ameaça de inflação que justifique tamanho pavor.
Mesmo com o freio de mão puxado, o país cresceu em 2007 acima de
5%. Pode crescer mais em 2008 se
houver pausa no conservadorismo
teimoso das autoridades monetárias. Deve ter pesado na decisão de
manter os juros a notícia de que a indústria cresceu 8,5% em janeiro ante o mesmo mês de 2007. É pena,
mas crescimento ainda assusta.
BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
bvictoria@psi.com.br
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