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São Paulo, domingo, 11 de maio de 2003

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TENDÊNCIAS INTERNACIONAIS

Redes estratégicas criam ondas de acumulação

GILSON SCHWARTZ
ARTICULISTA DA FOLHA

A vança pouco e mal o debate sobre políticas de desenvolvimento no Brasil. O país continua na UTI, e o governo federal ainda está a meio caminho entre gerenciar uma herança e construir novos modelo e regulação.
Algum consolo vem de olhar para o resto do mundo e ver como outros países desenham e implementam políticas estratégicas mesmo (ou sobretudo) em períodos de crise.
Entre as organizações estatais mais bem-sucedidas no desafio de manter a visão estratégica no longo prazo está a Jetro (Japan External Trade Organization, a Organização de Comércio Exterior do Japão). Seu Instituto de Economias em Desenvolvimento acaba de publicar um estudo detalhado sobre processos de aglomeração industrial ("Industrial Agglomeration: Facts and Lessons for Developing Countries", editado por Mitsuhiro Kagami e Masatsugo Tsuji).
A aglomeração de indústrias, fenômeno conhecido também como formação de "clusters" ou distritos industriais, é objeto de pesquisas desde o século 19.
A aglomeração é um processo que obviamente se dá no espaço, é um aspecto da geografia econômica. Mas a internet e, de modo geral, as novas tecnologias de informação e comunicação promovem novas formas de organização que parecem colocar em segundo plano o enraizamento espacial, as vantagens de localização. Do telemarketing aos pólos de produção de software, a geografia econômica mundial e a divisão internacional do trabalho são redesenhados, criando novas oportunidades de desenvolvimento econômico.
Os estudos publicados pelo IDE sugerem, no entanto, que as oportunidades de acumulação de capital têm sido transformadas, mas não eliminadas por redes como a internet . Aliás, alguns dos indicadores de desenvolvimento de redes levantados pelos pesquisadores indicam algo surpreendente: os espaços de aglomeração que implementam redes digitais interativas são os que obtêm maiores índices de acumulação de capital e desenvolvimento.
Essas redes criam ondas de acumulação que surgem e se aprofundam principalmente em espaços urbanos ou regiões onde já é maior a facilidade para combinar contatos remotos com encontros "face a face".
A conclusão dos organizadores do estudo é clara: entre as tecnologias de informação e comunicação (virtuais) e os contatos humanos (reais) há uma relação de complementariedade, não de substituição. Os dois se tornam mais intensos e dinâmicos em conjunto. Foram comparados "clusters" no Japão, nos EUA, na Itália e no México.
O Brasil tem vários espaços de aglomeração industrial e em São Paulo há até vários "clusters" bem conectados por rodovias e, cada vez mais, por redes de alta velocidade.
Esforços obcecados em favor da descentralização industrial e do desenvolvimento regional fizeram nas últimas décadas a alegria de muita elite nordestina, como relembrou há alguns dias o presidente Lula. Podem ser uma estratégia condenada ao fracasso.
Investimentos, principalmente de governos e prefeituras, no desenvolvimento de redes digitais interativas que aprofundem ainda mais o paradoxo da acumulação onde já existem pólos de crescimento podem ser a aposta mais inteligente para dar saltos de desenvolvimento que beneficiem o país inteiro.
É uma conclusão pouco simpática e um tanto incorreta politicamente. Mas, a julgar pelos estudos dos especialistas, é assim que o capitalismo costuma funcionar.


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