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Congresso descaracteriza
MPs e ameaça Orçamento
Em 60 dias, quatro medidas são alteradas para elevar gastos e reduzir receitas
Para analistas, ano eleitoral contribui para enfraquecer politicamente o governo; agenda legislativa para o futuro é uma incógnita
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Depois de ter sua agenda legislativa paralisada em 2005, o
governo passou a colecionar
derrotas no Congresso neste
ano eleitoral. Simples medidas
provisórias se converteram em
risco de aumento de gastos,
subsídios oficiais e vantagens
tributárias.
Em circunstâncias normais,
as MPs são o instrumento mais
corriqueiro e seguro para que o
Palácio do Planalto dite a pauta
do Legislativo. Só nos últimos
60 dias, porém, quatro delas
serviram para que a oposição se
aproveitasse de uma base governista à deriva e desafiasse o
presidente, e virtual candidato
à reeleição, Luiz Inácio Lula da
Silva a vetar propostas de alcance real ou aparentemente
popular.
A MP que corrige a tabela do
Imposto de Renda das pessoas
físicas passou a prever também
um parcelamento geral das dívidas das pequenas e grandes
empresas com o fisco; a que elevou o salário mínimo teve o
reajuste de 16,67% estendido
para os aposentados do setor
privado.
Outra medida, destinada a
estimular com benefícios fiscais a formalização dos empregados domésticos foi desvirtuada com a obrigatoriedade do recolhimento de FGTS (Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço) para esses trabalhadores
-que, para especialistas, vai
desencorajar as contratações
com carteira assinada.
Por fim, uma derrota já aceita pelo governo: a MP que renegocia dívidas de produtores rurais nordestinos teve seus benefícios multiplicados. Em
acordo com os parlamentares
ligados ao setor agrícola, o governo chegou a um meio-termo
com o compromisso de não vetar o aumento dos gastos originalmente previstos.
"O governo vem se enfraquecendo desde o ano passado
[quando veio à tona o escândalo
do mensalão], mas o ano eleitoral agravou a situação", avalia
David Fleischer, professor de
Ciência Política da Universidade de Brasília.
Como indicam as próprias
MPs, o surto de generosidade
fiscal pré-eleições começou no
Executivo, que montou para
2006 um Orçamento de gastos
recordes e medidas de desoneração tributária. O Congresso
não quer ficar atrás -ao menos, a oposição à esquerda e à
direita quer ver Lula e os políticos petistas se opondo a medidas de agrado do eleitorado.
Só a MP relativa às dívidas
agrícolas já implica um gasto
total estimado em R$ 4 bilhões,
R$ 1 bilhão acima do que o governo estava disposto a conceder no texto original. No reajuste de 16,67% dos benefícios
do INSS (Instituto Nacional do
Seguro Social), a conta chega a
R$ 7 bilhões neste ano.
Lula conta com o poder de
sancionar apenas parcialmente
os textos recebidos do Legislativo -com o inconveniente do
desgaste político- e a praxe do
Congresso de não pôr em votação com regularidade os vetos
presidenciais.
Agenda futura
A área econômica pode, assim, evitar o aumento de despesas sem previsão no Orçamento e a nova rodada de refinanciamento de dívidas tributárias, que seria a terceira desde
2000. O comportamento do
Congresso lança dúvidas, porém, sobre a agenda legislativa
do próximo governo, qualquer
que seja o vencedor das eleições.
"Os problemas do governo
Lula tendem a se agravar num
eventual segundo mandato",
diz acreditar o cientista político
Leôncio Martins Rodrigues, da
Unicamp.
Explica-se: o PT corre o risco
de encolher no Congresso, em
razão da desmoralização de sua
imagem de partido ético, e a
economia internacional deve
ser menos favorável, contribuindo menos para o crescimento brasileiro e a popularidade do presidente.
Ainda que não haja diferenças visíveis a olho nu entre as
diretrizes econômicas do governo petista e da oposição tucano-pefelista, o acirramento
da disputa pelo poder entre os
dois grupos pôs fim aos acordos
políticos que chegaram a ser
feitos, em 2003 e 2004, em torno de projetos como a reforma
da Previdência e a lei das PPPs
(Parcerias Público-Privadas).
Não por acaso, pararam no
Congresso as reformas tributária e sindical, a regulamentação
das agências reguladores e as
regras para o setor de saneamento. A reforma trabalhista e
a proposta de autonomia formal do Banco Central nem sequer saíram do Executivo.
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