São Paulo, quinta-feira, 11 de agosto de 2005

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DUELO DE TITÃS

Dos primeiros quatro votos dos seis conselheiros do Cade, cada empresa recebeu dois; relator apóia posição da CSN

Disputa entre Vale e CSN começa empatada

CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O julgamento do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) no caso que coloca em lados opostos a CVRD (Companhia Vale do Rio Doce) e a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) começou com divisão entre os conselheiros do órgão.
Dos quatro que haviam votado até as 19h45 de ontem, dois foram favoráveis à mineradora, e dois, à siderúrgica. O relator do caso, Ricardo Cueva, defendeu solução que poderá transformar a CSN na grande concorrente da Vale no mercado de minério de ferro, caso seja aprovada pela maioria dos conselheiros do Cade.
Cueva propôs o fim da cláusula que dá preferência à CVRD na aquisição do minério de ferro da mina Casa de Pedra não utilizado por sua proprietária, a CSN. Com isso, a siderúrgica poderia concorrer com a mineradora dentro e fora do Brasil.
O voto de Cueva foi acompanhado pelo conselheiro Luís Fernando Rigato. Os que votaram em seguida, Luiz Carlos Prado e Roberto Pfeiffer, optaram pelo fim do direito de preferência apenas para o mercado interno, solução que é aceita pela CVRD.
Ainda faltava a manifestação dos outros dois integrantes do Cade, órgão responsável pela análise de atos que podem levar à concentração de setores do mercado nas mãos de uma empresa.

Julgamento histórico
O julgamento é um dos mais importantes da história do órgão e pode ter impacto em um setor crucial da economia, responsável pelo suprimento da matéria-prima usada na fabricação do aço, principal insumo da indústria.
O caso colocou em lados opostos a maior produtora mundial de minério de ferro, a CVRD, e a maior siderúrgica brasileira, a CSN, que até 2001 tinham participações acionárias recíprocas.
Quando as empresas venderam as participações cruzadas que tinham uma na outra, assinaram contrato que deu à CVRD a preferência na compra do minério da Casa de Pedra não utilizado por sua proprietária, a CSN.
Ontem, o Cade começou a julgar o acordo que levou ao descruzamento acionário das empresas e a compra de quatro mineradoras pela CVRD entre 2000 e 2001.
Em um voto lido durante quase três horas, Cueva considerou que as aquisições das mineradoras Caemi, Ferteco, Samitri e Coimex deram à CVRD um grau de concentração do mercado capaz de afetar seus clientes, que são as siderúrgicas.
"As operações têm potencial para prejudicar relações comerciais entre a Vale e as siderúrgicas", afirmou Cueva.
Para ele, a melhor saída para amenizar essa situação é o fim do direito de preferência da CVRD na mina Casa de Pedra, o que permitiria a entrada no mercado de uma empresa capaz de confrontar o poder da mineradora.
A Casa de Pedra é responsável por 11% do mercado nacional de minério de ferro. No ano passado, produziu 16 milhões de toneladas, das quais 8 milhões de toneladas foram vendidas pela CSN a outras companhias.
O fim da cláusula de preferência foi sugerido em parecer da SDE (Secretaria de Direito Econômico), que tem a função de analisar os atos de concentração e indicar possíveis soluções, que o Cade pode ou não acatar.
O restante do voto de Cueva foi bem mais favorável à CVRD que o parecer da SDE. O relator não acatou a sugestão de obrigar a mineradora a vender a participação superior a 20% que possui na ferrovia MRS Logística nem a de exigir a criação de uma subsidiária integral para administrar a EFVM (Estrada de Ferro Vitória-Minas), controlada integralmente pela CVRD.
A mineradora elevou sua participação na MRS a 37% quando adquiriu as mineradoras Caemi e Ferteco. A SDE sustentou em seu parecer que a mineradora passou a controlar os dois principais corredores ferroviários de transporte de minério de ferro do sudeste, o que poderia prejudicar os usuários e seus concorrentes.
A CVRD resiste a abrir mão do direito de preferência na mina Casa de Pedra nas exportações, sob o argumento de que a medida poderá beneficiar seus concorrentes internacionais. Segundo a mineradora, empresas de outros países poderiam comprar o minério brasileiro, considerado o melhor do mundo, e misturá-lo a seus produtos, melhorando sua qualidade.
O alto grau de concentração da CVRD no mercado se refletiu no enorme contingente que a empresa mobilizou para defesa de suas posições no Cade. Em seu voto, Cueva reclamou da profusão de pareceres econômicos apresentados pela empresa e das extensas manifestações de seus advogados.
Antes do início da leitura do voto, três advogados da CVRD fizeram sustentações orais para apresentar suas posições. A CSN foi representada apenas por um advogado, Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Havia ainda pelo menos seis assessores de imprensa trabalhando para a Vale ou escritórios de advocacia contratados por ela.
Na sua manifestação, José Ignácio Franceschini, um dos advogados da CVRD, alfinetou a CSN, sem citar o nome da empresa: reclamou dos "oportunistas" e criticou os que preferem brincar de "rouba monte" e se apropriar de investimentos alheios.


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