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DUELO DE TITÃS
Dos primeiros quatro votos dos seis conselheiros do Cade, cada empresa recebeu dois; relator apóia posição da CSN
Disputa entre Vale e CSN começa empatada
CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O julgamento do Cade (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica) no caso que coloca
em lados opostos a CVRD (Companhia Vale do Rio Doce) e a CSN
(Companhia Siderúrgica Nacional) começou com divisão entre
os conselheiros do órgão.
Dos quatro que haviam votado
até as 19h45 de ontem, dois foram
favoráveis à mineradora, e dois, à
siderúrgica. O relator do caso, Ricardo Cueva, defendeu solução
que poderá transformar a CSN na
grande concorrente da Vale no
mercado de minério de ferro, caso
seja aprovada pela maioria dos
conselheiros do Cade.
Cueva propôs o fim da cláusula
que dá preferência à CVRD na
aquisição do minério de ferro da
mina Casa de Pedra não utilizado
por sua proprietária, a CSN. Com
isso, a siderúrgica poderia concorrer com a mineradora dentro e
fora do Brasil.
O voto de Cueva foi acompanhado pelo conselheiro Luís Fernando Rigato. Os que votaram
em seguida, Luiz Carlos Prado e
Roberto Pfeiffer, optaram pelo
fim do direito de preferência apenas para o mercado interno, solução que é aceita pela CVRD.
Ainda faltava a manifestação
dos outros dois integrantes do
Cade, órgão responsável pela análise de atos que podem levar à
concentração de setores do mercado nas mãos de uma empresa.
Julgamento histórico
O julgamento é um dos mais
importantes da história do órgão
e pode ter impacto em um setor
crucial da economia, responsável
pelo suprimento da matéria-prima usada na fabricação do aço,
principal insumo da indústria.
O caso colocou em lados opostos a maior produtora mundial de
minério de ferro, a CVRD, e a
maior siderúrgica brasileira, a
CSN, que até 2001 tinham participações acionárias recíprocas.
Quando as empresas venderam
as participações cruzadas que tinham uma na outra, assinaram
contrato que deu à CVRD a preferência na compra do minério da
Casa de Pedra não utilizado por
sua proprietária, a CSN.
Ontem, o Cade começou a julgar o acordo que levou ao descruzamento acionário das empresas
e a compra de quatro mineradoras pela CVRD entre 2000 e 2001.
Em um voto lido durante quase
três horas, Cueva considerou que
as aquisições das mineradoras
Caemi, Ferteco, Samitri e Coimex
deram à CVRD um grau de concentração do mercado capaz de
afetar seus clientes, que são as siderúrgicas.
"As operações têm potencial
para prejudicar relações comerciais entre a Vale e as siderúrgicas", afirmou Cueva.
Para ele, a melhor saída para
amenizar essa situação é o fim do
direito de preferência da CVRD
na mina Casa de Pedra, o que permitiria a entrada no mercado de
uma empresa capaz de confrontar
o poder da mineradora.
A Casa de Pedra é responsável
por 11% do mercado nacional de
minério de ferro. No ano passado,
produziu 16 milhões de toneladas,
das quais 8 milhões de toneladas
foram vendidas pela CSN a outras
companhias.
O fim da cláusula de preferência
foi sugerido em parecer da SDE
(Secretaria de Direito Econômico), que tem a função de analisar
os atos de concentração e indicar
possíveis soluções, que o Cade pode ou não acatar.
O restante do voto de Cueva foi
bem mais favorável à CVRD que o
parecer da SDE. O relator não acatou a sugestão de obrigar a mineradora a vender a participação superior a 20% que possui na ferrovia MRS Logística nem a de exigir
a criação de uma subsidiária integral para administrar a EFVM
(Estrada de Ferro Vitória-Minas),
controlada integralmente pela
CVRD.
A mineradora elevou sua participação na MRS a 37% quando
adquiriu as mineradoras Caemi e
Ferteco. A SDE sustentou em seu
parecer que a mineradora passou
a controlar os dois principais corredores ferroviários de transporte
de minério de ferro do sudeste, o
que poderia prejudicar os usuários e seus concorrentes.
A CVRD resiste a abrir mão do
direito de preferência na mina Casa de Pedra nas exportações, sob o
argumento de que a medida poderá beneficiar seus concorrentes
internacionais. Segundo a mineradora, empresas de outros países
poderiam comprar o minério
brasileiro, considerado o melhor
do mundo, e misturá-lo a seus
produtos, melhorando sua qualidade.
O alto grau de concentração da
CVRD no mercado se refletiu no
enorme contingente que a empresa mobilizou para defesa de suas
posições no Cade. Em seu voto,
Cueva reclamou da profusão de
pareceres econômicos apresentados pela empresa e das extensas
manifestações de seus advogados.
Antes do início da leitura do voto, três advogados da CVRD fizeram sustentações orais para apresentar suas posições. A CSN foi
representada apenas por um advogado, Tércio Sampaio Ferraz
Júnior. Havia ainda pelo menos
seis assessores de imprensa trabalhando para a Vale ou escritórios
de advocacia contratados por ela.
Na sua manifestação, José Ignácio Franceschini, um dos advogados da CVRD, alfinetou a CSN,
sem citar o nome da empresa: reclamou dos "oportunistas" e criticou os que preferem brincar de
"rouba monte" e se apropriar de
investimentos alheios.
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