São Paulo, domingo, 11 de setembro de 2005

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CRISE NO AR

Enviada aos EUA para evitar arresto de aviões, Márcia Cunha diz que recuperação está 90% nas mãos dos credores

Prazo é inviável para salvar Varig, diz juíza

BRUNO LIMA
DA REPORTAGEM LOCAL

O prazo restante para a recuperação da Varig é inviável para salvá-la, diz a juíza Márcia Cunha, 42, que, com outros três colegas, acompanha o processo da aérea, que já tem mais de 30 volumes.
Amanhã, a Varig entrega à Justiça o seu plano de recuperação. Em 90 dias, termina a blindagem criada pela lei e os credores poderão tomar bens da companhia. A prorrogação do prazo, que é vedada pela lei, será, segundo a juíza, o maior desafio a enfrentar.
Enviada aos EUA para conversar com a Justiça americana -que recebeu pedidos da empresa de leasing ILFC para arrestar 11 aviões da Varig-, ela afirma que o sucesso da recuperação judicial depende 90% dos credores.
Leia trechos da entrevista que a juíza concedeu à Folha.

Folha - Como foi a visita aos EUA?
Márcia Cunha -
A audiência foi pública, com a presença de credores americanos, duas empresas de leasing [entre elas a ILFC], a Varig e as pessoas que quiseram assistir ou até participar pelo telefone.

Folha - A sra. teve uma conversa reservada com o juiz americano?
Cunha -
Tive. Mas, pelas normas americanas, não se pode falar sobre o caso concreto. Se quiséssemos conversar, poderíamos, mas a conversa teria de ser gravada. Nós nos limitamos a conversar sobre as leis americana e brasileira. Pude mostrar a ele as semelhanças. Isso não foi inédito para os americanos, já houve audiência com um juiz inglês no caso de uma empresa de navegação.

Folha - E na Justiça brasileira?
Cunha -
No intercâmbio sobre um caso concreto, não conheço [outros casos]. Com a globalização, isso vai ter de acontecer mais. Não que seja necessária a presença, talvez possa ser por videoconferência. Se os negócios são internacionais, é importante haver intercâmbio entre as Justiças e desenvolver leis semelhantes. Não adianta tentar recuperar a empresa aqui se um juiz do outro lado do mundo retira os aviões. Um juiz não influencia a decisão do outro. Minha intenção foi mostrar as limitações da lei brasileira, que impediriam a Varig de cumprir seu compromisso lá.

Folha - A sra. pediu mais prazo?
Cunha -
Eu não pedi nada, expliquei por que [o cumprimento] seria impossível agora. Disse que muito provavelmente a Varig terá condições de pagar [no futuro]. A liquidez depende de prazos da lei brasileira, que impede a venda de ativos para pagar o débito sem autorização dos credores e do juiz.

Folha - A sra. viajou de Varig?
Cunha -
Sim, até para dar credibilidade. Cheguei na segunda [dia 5] e saí de lá no dia seguinte.

Folha - Na classe executiva?
Cunha -
Foi. Conversei com o juiz americano e voltei.

Folha - Por que há quatro juízes trabalhando em conjunto?
Cunha -
É um trabalho hercúleo. É uma lei nova e são muitos interesses envolvidos. Cada um tem o processo e mais a sua vara inteira para carregar. Como o juiz titular se aposentará em outubro, evitaremos a quebra da continuidade.

Folha - Por que haverá uma solenidade para a entrega do plano?
Cunha -
É um momento importante, envolve um interesse público fenomenal, são milhares de empregos. Milhares de pessoas aposentadas dependem do fundo de pensão Aerus. Há empregos indiretos, há empresas-satélite que dependem da Varig. A repercussão na economia e no moral do brasileiro é muito grande.

Folha - Qual é a sensação de ter o destino da Varig nas mãos?
Cunha -
É uma responsabilidade grande, mas, se a Varig vai quebrar ou não, não sabemos. O espírito da lei é recuperar a empresa viável. Quanto antes a empresa que não é viável for à falência, melhor para a sociedade.

Folha - A Varig é viável?
Cunha -
Acho que ela tem muita viabilidade, tem tudo para se recuperar. Mas só vou poder dizer isso após a análise do plano.

Folha - Há chance de estender o prazo de 180 dias para o processo?
Cunha -
Essa vai ser a decisão mais difícil. A lei diz que esse prazo é improrrogável.

Folha - Esse prazo é viável para uma empresa do porte da Varig?
Cunha -
Não acredito que seja.

Folha - De quem depende o sucesso da recuperação?
Cunha -
Depende de muita gente, daí a dificuldade. Depende basicamente de os credores quererem. Diria que 90% está nas mãos deles. Depende de ativos que possibilitem isso e depende de dinheiro novo. O que está nas mãos do Judiciário, ele está fazendo.

Folha - A nova fase será difícil?
Cunha -
A aprovação do plano é complicada. Pode ser que os credores não queiram a recuperação da forma como a Varig propuser.

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