São Paulo, quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

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Pressão reabre debate sobre o BC independente

Decisão não surpreende analistas, apesar de verem espaço para corte na taxa de juro

Analistas vêem redução de juro já no início de 2009, com recuo nos índices de inflação, expectativas dentro da meta e desaceleração da demanda


TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Dado o conservadorismo habitual do Banco Central, o mercado financeiro recebeu sem surpresas a manutenção dos juros em 13,75%, apesar de ter aumentado nos últimos dias a parcela dos analistas que esperava um corte de 0,25 ponto na taxa Selic. Como os diretores admitiram que discutiram a possibilidade de reduzir a taxa, a expectativa é que isso aconteça já no início de 2009.
No entanto analistas voltaram a discutir o grau de independência do BC diante das pressões sofridas dentro e fora do governo. Com a decisão unânime do BC, analistas discutem se a autoridade monetária fez questão de reafirmar sua posição conservadora como forma de responder a essas pressões.
Para Fausto Gouveia, economista da Infra Asset, essa dúvida pode até ter levado o BC a uma atitude mais conservadora, com o objetivo de demonstrar que "continua no comando" da situação. "Tem realmente esse mal-estar. Boa parte do lado petista está atirando para tirar força do Banco Central. Pelas características do Henrique Meirelles [presidente do BC], a pressão pode, sim, ter levado a uma decisão mais conservadora. Sempre que ele se sentiu pressionado, veio uma decisão unânime e seca indo contra o governo."
"[Se cortasse o juro agora] Poderia criar algum ruído no mercado de que o BC pode ter cedido, em parte, às pressões do governo. Analisando um contexto mais amplo, todo o histórico desse BC e do Copom, diríamos que eles sempre foram muito pouco suscetíveis a esse tipo de pressão", disse Silvio Campos Neto, economista do banco Schahin.
Um dos poucos a esperar um corte nos juros, o economista-chefe do banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, afirma que o BC deixou claro que deve reduzir os juros já em janeiro. Gonçalves diz que não havia argumentos técnicos para a manutenção da taxa Selic em 13,75% e reconhece que havia muito tempo que uma reunião do Copom não era precedida de tanto rumor. Para Gonçalves, chama a atenção o fato de os diretores terem votado coesos em um momento de dúvida como o atual.
"É um sinal muito ruim eles votarem fechados [pela manutenção]. Em outros Carnavais, já houve dissenso a respeito do ritmo [dos juros] -e hoje existe argumento técnico para a turma do dissenso. Se você fecha [vota unânime], vai jogar o argumento técnico pela janela porque está sendo pressionado? Mas eles se saíram bem [com o texto] em relação à pressão. Porque está combinado: em janeiro, baixa [a taxa]. E ao mesmo tempo vão ajudar na descompressão no mercado de juros. O efeito disso é que os juros futuros vão ceder."
Para Gouveia, ao admitir a possibilidade de corte, o BC sinalizou que deve reduzir os juros no início de 2009. "Os números da inflação vieram controlados, as commodities caíram, não tem pressão inflacionária. Já tinha espaço para reduzir os juros [ontem]."
"Os sinais apontam para uma possibilidade de queda no início do ano que vem. Talvez fosse um pouco prematuro [reduzir ontem] diante de alguns fatores de risco de curto prazo, como a taxa de câmbio. De toda maneira, o espaço para a queda do juro já está se consolidando. A gente estava imaginando para abril, mas pode ser para janeiro", disse Campos Neto.
Fernando Cardim, economista da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), afirma que não havia argumentos técnicos para justificar a manutenção dos juros diante da desaceleração que está por vir. "Estão indo não apenas contra o restante do governo, mas na contramão do mundo inteiro. O temor de uma fuga de capitais e os efeitos que isso pode ter sobre a taxa de câmbio intimidam o governo e reforçam a mão do BC. Mas isso é uma ferida auto-infligida, algo que caberia ao governo Lula ter corrigido, mas que não o fez."
Para Cardim, a decisão do Copom arrisca levar o país a um "colapso desnecessário". "Ajuda a alimentar o pânico, a contrair o crédito e a reduzir a possibilidade de uma passagem menos dolorosa pela crise."
"O corte nos juros terá de vir em janeiro. Os executivos de finanças estão sentindo na pele a forte retração, com a freada na atividade industrial e a queda de importações e exportações", disse Walter Machado de Barros, presidente do conselho do Ibef (Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças).


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