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ANTONIO CARLOS LEMGRUBER
A nova política monetária
Não é verdade que o BC conduza a taxa de juros pensando só na inflação, e o mesmo pode ser dito do Fed
OS ÚLTIMOS TRABALHOS acadêmicos sobre inflação e política monetária estão começando a demonstrar um descompasso total. A política monetária dos
bancos centrais -vide Brasil e até
mesmo Estados Unidos- se baseia
cada vez no regime de metas de inflação. Ou seja: o banco central deve
atuar com a taxa de juros e os agregados monetários tendo em vista
basicamente uma meta inflacionária. Curiosamente, porém, as novas
discussões sobre a inflação num
mundo globalizado têm enfatizado
cada vez mais aspectos não-monetários, tais como a influência de importações de países como China e
Índia bem como a própria taxa de
câmbio.
Digamos que a inflação no Brasil
esteja muito abaixo das metas por
causa da ajuda do câmbio apreciado.
E que, nos EUA, a inflação está acima das metas por causa de taxas de
juros reais ainda situadas em níveis
baixos em conjunto com forte expansão monetária e creditícia.
Normalmente, se os bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos
acreditassem realmente nos seus
modelos monetários, estariam
atuando da seguinte maneira: juros
mais baixos no Brasil e juros mais altos nos EUA.
Acontece que, na verdade, as autoridades monetárias brasileiras estão
"gostando" da taxa de câmbio apreciada, e as autoridades norte-americanas, das importações baratas e estão preocupadíssimas com uma
possível recessão.
Não é verdade, portanto, que o
Banco Central do Brasil conduza a
taxa de juros pensando apenas na
inflação, e o mesmo pode ser dito
para o Federal Reserve. O Banco
Central do Brasil não baixa mais rapidamente os juros porque sabe que
o câmbio vai desvalorizar e -mesmo que isso seja muito bom para o
crescimento econômico- é ruim
para a inflação, como ficou demonstrado em 1999 e 2002.
Já o Federal Reserve não sobe
mais rapidamente os juros porque
sabe que pode haver uma profunda
recessão alimentada pela crise no
setor imobiliário.
Os dilemas de política econômica,
portanto, continuam a existir. De fato, na prática, bancos centrais se
preocupam com a inflação e também com o crescimento econômico
e com o balanço de pagamentos.
A suprema ironia, em nossa opinião, é que o governo do PT percebeu que inflação baixa dá mais voto
do que desemprego baixo. E, nos Estados Unidos, o governo republicano raciocina de maneira oposta: a
economia em recessão é que tira
votos.
Curiosamente, os petistas parecem menos preocupados do que os
republicanos nos Estados Unidos
com o crescimento econômico. E
mais satisfeitos com a inflação muito baixa. Afinal, só os desempregados são afetados pelo desemprego,
enquanto a inflação afeta a todos: é
100% contra 10%. Quem ganha eleição no Brasil é a inflação baixa, enquanto, nos EUA, é o desemprego
baixo -o que se explica pelas histórias passadas dos dois países nas últimas décadas desde 1950.
O fato é que a inflação não acabou
-nem no Brasil nem nos Estados
Unidos nem na China. Nem tampouco os ciclos econômicos. O que
aconteceu entre 2003 e 2007 no
mundo e no Brasil não é uma tendência permanente. Pelo contrário,
lá pelos idos da década de 60, dizia-se também que os ciclos econômicos
tinham acabado graças à aplicação
das idéias keynesianas.
Recentemente, andaram dizendo
que foi a tal da "supply-side economics" do período Reagan que preparou o terreno para a incrível expansão econômica dos últimos 20 anos
(no mundo, não no Brasil). Nosso
comentário é mais simplista: é a teoria macroeconômica que foi-se sofisticando em direções opostas. De
um lado, a maior importância das
expectativas racionais. De outro, a
maior importância do setor externo
e da globalização.
Mas a inflação vem por aí de novo
no Brasil e no mundo, mesmo que
seja em níveis mais civilizados. Pena
que o espetáculo do crescimento esteja terminando na maioria dos países -com exceções como China e
Índia- e que o Brasil tenha perdido
esse bonde da história nos últimos
20 anos. O Plano Real foi tão bem
feito que os seus autores pensaram
realmente que as questões fiscais e
monetárias eram irrelevantes. Era
só uma questão inercial. Somos agora um país sem inflação e sem crescimento econômico. Uma ironia
quando se olha para o período
1950-1980.
ANTONIO CARLOS LEMGRUBER, 59, é economista, PhD
pela Universidade de Virginia (EUA), e foi presidente do
Banco Central do Brasil em 1985.
Hoje, excepcionalmente, não é publicada a coluna
de PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
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