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OPINIÃO ECONÔMICA
Crescimento sustentado ou vôo da galinha?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O desempenho da economia brasileira melhorou
sensivelmente nos últimos meses.
As projeções de crescimento do
PIB em 2004, antes na faixa de
3% a 3,5%, deslocaram-se para
cerca de 4%, com a indústria crescendo mais do que os outros setores. O mercado de trabalho começou a reagir. A imagem do governo voltou a melhorar. Apareceram resultados mais positivos nas
pesquisas de opinião pública divulgadas nesta semana.
A dúvida agora é a seguinte:
trata-se de mais um "vôo da galinha", semelhante às recuperações
de fôlego curto do período Fernando Henrique Cardoso? Ou estamos no início de uma fase de
crescimento sustentado?
Ninguém pode ter certeza. A capacidade de previsão dos economistas é notoriamente limitada.
Mas a comparação com o período
FHC não é inteiramente convincente. Há pelo menos uma grande
diferença entre a recuperação
atual e as anteriores: o fortalecimento da balança comercial e do
balanço de pagamentos em conta
corrente. Esse aspecto é fundamental, uma vez que as tentativas
de retomar o crescimento no governo anterior foram quase sempre interrompidas por problemas
nas contas externas do país.
Nessa área, o Brasil vem acumulando surpresas favoráveis. A
primeira foi a velocidade e a intensidade da reação da balança
comercial à depreciação cambial,
desde meados de 2002. A segunda, a resistência dos bons resultados comerciais à revalorização do
real ocorrida em 2003. Terceira: o
superávit comercial continuou
crescendo em 2004, a despeito da
retomada da economia. As importações vêm aumentando rapidamente, refletindo a retomada,
mas o ritmo de expansão das exportações tem sido ainda maior.
É bem verdade que a reativação
econômica é muito recente. O importante é gerar superávits comerciais expressivos (ainda que
não necessariamente tão altos
quanto os de 2003 e 2004) com a
economia crescendo sustentadamente em ritmo vigoroso, de 5% a
6% ao ano, pelo menos. Mas, como a razão exportações/importações está em nível elevado, é preciso que a taxa de crescimento das
importações supere a das exportações por larga margem e longo
período para que o superávit da
balança comercial venha a se reduzir de forma perigosa.
Atualmente, a vulnerabilidade
da posição externa decorre, sobretudo, da excessiva abertura da
conta de capitais, do perfil inadequado da dívida externa e do nível insuficiente das reservas internacionais do país. Apesar do excelente desempenho do balanço
de pagamentos em conta corrente
neste ano, a recomposição das reservas foi modesta. Portanto, se
houver forte deterioração do contexto mundial e uma nova rodada de choques vindos do exterior,
a fragilidade das contas externas
pode voltar a restringir o crescimento.
Mesmo assim, é inegável o progresso em matéria de ajustamento externo. A recuperação pode
até ser interrompida por fatores
internos, tais como restrições de
capacidade de produção, aumento da inflação ou rigidez excessiva
das políticas macroeconômicas.
Mas, no que diz respeito ao que
constituía o calcanhar-de-aquiles
da economia brasileira desde o
Plano Real -a fragilidade das
contas externas-, a nossa posição é hoje mais sólida.
É um forte motivo para admitir
que a recuperação em curso tenha boas chances de vingar. As
chances serão maiores se prosseguir o esforço de consolidação da
posição externa. Isso inclui não
relaxar na promoção das exportações (evitando, por exemplo,
novos períodos de apreciação
cambial), acelerar a recomposição das reservas internacionais e
aproveitar o período de calmaria
para disciplinar os movimentos
de capital e alongar a dívida externa.
Paulo Nogueira Batista Jr., 49, economista e professor da FGV-EAESP, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail -
pnbjr@attglobal.net
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