São Paulo, quarta-feira, 12 de agosto de 2009

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PAULO RABELLO DE CASTRO

Podemos crescer sem educação?


Precisamos de uma revolução em infraestruturas e aprendizagem para crescer 6%, como seria o ideal

A OPORTUNA entrevista à Folha (10/08/09) do colega Martin Carnoy, doutor por Chicago e professor em Stanford, não deixa dúvida quanto ao tamanho do desafio brasileiro de superar a barreira da sua falta de escolaridade e treinamento. O otimismo quanto ao potencial do Brasil na próxima década tem até razão de ser. Mas podemos crescer sem avanço sério na educação?
Pelas contas dos economistas, é possível projetar um crescimento médio anual do PIB em 4% entre 2010 e 2020. Mas essa meta, extraoficial, pois o governo não publica nada, não será suficiente para garantir o destaque do Brasil perante outros Brics, especialmente China e Índia. Só uma comparação: o Brasil manejou relativamente bem o choque da crise mundial e encerrará 2009 com um crescimento pouco superior a zero; mas China e Índia terão desempenhos superiores a 5%!
Dá para competir com esses gigantes? Acho que sim, mas nunca no ritmo atual de acumulação de capital. O Brasil está duplamente desenquadrado, tanto em termos de expansão do capital físico (plantas industriais, plataformas de serviços e infraestruturas físicas) quanto, principalmente, no tocante ao seu capital humano, via educação. Aqui entra o oportuno alerta de Carnoy. O aumento da produtividade de tudo que integra o crescimento, como gente, máquinas e organização, depende, em sua essência, do "saber fazer" e do "fazer com eficácia". A falta de escolaridade (horas e anos de escola) e a carência de substância educacional (conteúdos fracos e ineficácia na aprendizagem) transformaram nosso país numa espécie de depósito de "ferro velho" educacional. Nada a ver com a dedicação e o sacrifício pessoal de muitos mestres, Brasil afora. Mas a eficácia no aprendizado deixa a desejar -e muito!- até nos Estados mais equipados da Federação, em São Paulo ou no Rio de Janeiro. O que se ensina não se assimila. Parte dos alunos pouco interesse tem nos conteúdos oferecidos. O nível de estímulo dos alunos é zero por não inferirem nenhuma conexão das matérias com o mundo que enxergam pela frente.
A sociedade brasileira, permissiva e esbanjadora de tempo -o fator de produção mais precioso!-, parece contar mais com as assistências de governo (bolsas disso ou daquilo) do que com o retorno do próprio trabalho. As elites, desmanchadas no caldo da corrupção, confirmam a suspeita geral de que produzir e trabalhar, só se não houver outro remédio...
Confio, apesar de tantas forças negativas, em que algo poderoso nos empurrará a rever, proximamente, nosso pífio arranjo produtivo e educacional. Essa pressão vigorosa provém de uma circunstância demográfica -a chegada da geração mais numerosa de todos os tempos, de jovens adultos brasileiros, buscando o mercado de trabalho. Serão cerca de 70 milhões de entrantes nos próximos 25 anos, empurrando-nos a "construir uma nova São Paulo", inteira e acabada, a cada cinco anos! A segunda circunstância é o quase fim do "rentismo financeiro" criado pela maior taxa de juros do mundo, que fez o Brasil empacar por décadas. Esses dois fenômenos, gente jovem e juros mais baixos, operarão um milagre de estímulo "natural".
Qual será nosso nível de resposta? Ao ritmo atual, apenas mais do mesmo. Para crescer a 6%, como seria ideal, precisamos de uma revolução em infraestruturas e aprendizagem. Candidato nenhum ainda tocou nesse ponto.


PAULO RABELLO DE CASTRO , 60, doutor em economia pela Universidade de Chicago (Estados Unidos), é vice-presidente do Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.

paulo@rcconsultores.com.br


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