São Paulo, quinta-feira, 13 de março de 2008

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

"Euforia comedida"

O potencial de crescimento vinha sendo subestimado por muitos economistas, como os números parecem comprovar

AS ESTATÍSTICAS divulgadas ontem pelo IBGE confirmam que o desempenho da economia brasileira foi bastante bom no ano passado. Estamos escapando, finalmente, de um período de semi-estaganação que durou um quarto de século. Em 2007, segundo dados preliminares, o PIB por habitante cresceu 4% em termos reais, número não muito distante da taxa de crescimento per capita de longo prazo do período entre a Segunda Guerra Mundial e o início da crise da dívida externa da década de 1980.
Segundo o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, o momento é de "euforia comedida". Bem, por definição, euforia não pode ser comedida. Mas não importa. O oximoro do ministro é válido. O resultado de 2007 não chega a ser espetacular, o que justificaria uma "euforia eufórica", mas representa um progresso considerável. Esse progresso não teria sido possível, diga-se de passagem, sem a flexibilização gradual da política macroeconômica a partir de 2006.
Um aspecto merece destaque: a forte expansão da demanda interna, particularmente do investimento. A formação bruta de capital fixo, definida como o aumento do estoque de bens duráveis destinados ao uso das unidades produtivas, cresceu 13,4% em 2007, duas vezes e meia o ritmo de crescimento do PIB. Trata-se da maior taxa de expansão anual desde o início da nova série do IBGE, em 1996. Como se sabe, o aumento do investimento amplia ao mesmo tempo a demanda e a oferta agregadas, o que favorece a sustentação do crescimento ao longo do tempo. A expansão da capacidade produtiva facilita a conciliação entre crescimento econômico e controle da inflação.
Já o setor externo da economia teve influência negativa pelo segundo ano consecutivo. A taxa de crescimento das importações de bens e serviços foi mais que o triplo da taxa de crescimento das exportações no ano passado, o que reflete a persistente e problemática valorização do real.
Temos como sustentar esse crescimento ou até aumentá-lo ao longo dos próximos anos? Creio que sim.
O potencial de crescimento do país vinha sendo subestimado por muitos economistas, como parecem comprovar os números recentes.
A experiência começa a revelar como era enganosa aquela idéia, muito difundida entre nós, de que o Brasil só voltaria a crescer depois que implementasse uma série de difíceis reformas estruturais (previdenciária, tributária, trabalhista etc.). As reformas estruturais podem ser importantes, mas não constituíam precondição para a retomada do crescimento econômico. O governo Lula foi seduzido por essa idéia durante a maior parte do seu primeiro mandato, mas depois percebeu que estava marcando passo e deu mais ênfase à aceleração do crescimento.
Quais são os riscos? Destacaria três. Primeiro, há o risco de que um excesso de zelo na condução da política antiinflacionária venha a abortar o crescimento em curso. Segundo, a existência de gargalos na infra-estrutura de transporte e energia pode limitar a expansão da economia nos próximos anos. Por último, não se deve descartar um agravamento do quadro econômico internacional, o que afetaria a nossa capacidade de crescer -especialmente se esse agravamento coincidir com uma deterioração acentuada das nossas contas externas provocada pela valorização cambial.
Mas os riscos são administráveis e podem ser enfrentados com sucesso. Equilíbrio na política de combate à inflação, investimentos em infra-estrutura e reforço da nossa posição externa -esses são os elementos centrais para garantir a continuação do crescimento.


PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net


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