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Governo brasileiro quer G20 como nova diretoria mundial
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
O governo brasileiro gostou
tanto de uma frase atribuída ao
ex-presidente norte-americano Bill Clinton ("Não se deve
desperdiçar uma boa crise")
que a está usando como argumento para sua principal reivindicação no âmbito do G20: a
crise é uma oportunidade imperdível para promover a reforma da governança global, tema
que emergiu incontáveis vezes
nos últimos muitos anos, mas
nunca foi avante.
Para o Brasil, a reforma é o
terceiro tema central para o
G20, ao lado dos dois que o presidente Barack Obama explicitou anteontem: programas globalmente coordenados de relançamento da economia, numa ponta, e reformulação da
regulação do sistema financeiro internacional, na outra.
O governo brasileiro simpatiza com os Estados Unidos na
questão do relançamento da
economia, com mais gastos públicos, mas fica mais perto dos
europeus, que pedem uma ampla reformulação da supervisão/regulação financeira, o que
encontra alguma resistência
entre os norte-americanos.
Mas o principal para o Brasil
é, em primeiro lugar, consolidar o G20, composto pelas 20
maiores economias do planeta,
como a sua nova diretoria econômico-financeira, em lugar do
G8 (os sete países mais ricos do
mundo e a Rússia).
O ministro Guido Mantega
vem defendendo, faz tempo, a
tese de que o G20, para ser de
fato relevante na crise, deveria
se transformar em um fórum
de líderes, em vez de ficar como
encontro periódico apenas de
ministros da Fazenda e presidentes de bancos centrais, como o foi desde o nascimento há
exatos dez anos.
A tese vingou: houve uma
primeira reunião de líderes
(Washington, novembro passado) e haverá outra em abril, em
Londres. Mas não está claro
que, daqui para a frente, esse
papel central do G20 será mantido ou se, passada a fase mais
aguda da crise, o G8 retomará
sua condição de diretoria informal do planeta.
Tanto é assim que, para a cúpula anual do G8, na Itália, em
julho, o governo italiano já
anunciou que haverá primeiro
uma reunião apenas entre os
oito para depois, no dia seguinte, incorporar o G5 (Brasil, México, África do Sul, Índia e China), participantes habituais nos
dois últimos anos, que, desta
vez, serão acompanhados pelo
Egito, para abrir o foro a um
país árabe.
Só cafezinho, não
Na reunião ministerial anterior do G20, em novembro,
Mantega já havia mandado o
recado de que o Brasil não quer
ser convidado "apenas para o
cafezinho".
Berlusconi, o anfitrião de
2009, está convidando para
três refeições, e não só o cafezinho, mas sempre fica a perspectiva de que o G8 decida primeiro o prato que depois levará
aos companheiros emergentes
de viagem.
"O G8 não vai ceder alegremente espaço", ouviu a Folha
na delegação brasileira que está em Londres. Mas está cedendo em várias outras áreas também importantes para a governança global.
Cedeu, por exemplo, em uma
sigla que raramente aparece
nos jornais, a Iosco (International Organization of Securities Comission, o grupo que
cuida da vigilância das Bolsas
no mundo). Até a crise, a direção da Iosco (seu comitê técnico) era composta de 15 países,
todos desenvolvidos. No mês
passado, Brasil, China e Índia
ganharam lugar no comando.
Aliás, a Iosco é citada como
modelo para a reforma da regulação financeira mundial. Ela
estabelece padrões globais que,
depois, cada país aplica nacionalmente. No Brasil, quem o
faz é a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), xerife da
Bolsa de Valores. Como há forte resistência nos Estados Unidos a permitir que uma entidade supranacional se incumba
de regular/supervisar os seus
mercados, o G20 tende a adotar o modelo Iosco: um mapa
do caminho global, mas aplicação nacional.
Também no FMI (Fundo
Monetário Internacional) e no
Banco Mundial estão em discussão propostas que dão mais
votos aos países emergentes,
embora, no caso do Fundo, a
nova distribuição de cotas
-que equivalem a votos- só
deva ser feita a partir de janeiro
de 2011.
Mas é a consolidação do G20
como gerente planetário, ainda
que informal, que tornaria
mais significativa a reforma da
governança global.
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