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ANÁLISE
Lentidão do governo dá peso político à crise
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Às vésperas de ver Brasília invadida por produtores rurais (mobilizados por entidades do Mato
Grosso), trabalhadores do campo
(organizados pela Contag) e governadores (que choram prejuízos políticos e financeiros em função de queda na renda nos seus
Estados), o governo diz ter "plena
consciência da crise que afeta o
setor rural", nas palavras do próprio ministro Roberto Rodrigues
(Agricultura).
Esse reconhecimento, entretanto, vem com um certo atraso e, segundo avaliações de técnicos do
próprio governo, só ajudou a fazer com que a crise financeira da
área ganhasse um dimensão política maior que o normal. Afinal,
2006 é um ano de eleição, o que
aumenta o poder de barganha nas
negociações com o governo.
Com ânimos bastante acirrados, dificilmente o governo conseguirá fazer algo que agrade realmente. A situação poderia estar
um pouco melhor se a medida
anunciada ontem tivesse sido
aprovada, por exemplo, em fevereiro, época em que a comercialização da soja foi iniciada.
De lá para cá, cerca de 25 milhões de toneladas foram vendidas e, agora, esse produtor só será
beneficiado pela alta no preço que
o governo espera provocar se ele
tiver fechado o contrato com preço a fixar na hora da entrega do
produto. Caso contrário, vai
amargar o prejuízo, intensificando a crise no interior do país, onde o presidente Lula quer ganhar
votos dos beneficiados por programas sociais.
O cenário crítico na agricultura,
especialmente no segmento de
soja, já estava claro nos números
apresentados constantemente
por Rodrigues à área econômica e
que mostravam que, ano após
ano, o caos se aproximava.
Em 2004, o valor bruto de toda
produção de soja brasileira foi de
R$ 35 bilhões, caindo para R$ 25
bilhões no ano seguinte e estimada em R$ 22 bilhões neste ano.
Nesse período, o volume permaneceu estável em torno de 50 milhões de toneladas, segundo confirmou o secretário de Política
Agrícola do Ministério da Agricultura, Ivan Wedekin.
A queda ocorreu devido ao aumento do custo e a queda no preço do produto. Por isso, é tão difícil descolar o anúncio de ontem
do momento eleitoral e, talvez por
isso também, Rodrigues e o secretário-executivo do Ministério da
Fazenda, Bernard Appy, tenham
passado mais tempo negando que
fosse uma medida eleitoral para
esfriar os protestos programados
para para terça em Brasília do que
explicando a proposta em si.
Appy negou ainda que o pacote
-que ainda será complementado no final do mês- esteja vinculado à mudança de gestão no comando da equipe econômica. É
público que o ministro Guido
Mantega (Fazenda) sempre esteve muito mais alinhado com as
idéias ditas "desenvolvimentistas" da ministra Dilma Rousseff
(Casa Civil) do que com as de seu
antecessor Antonio Palocci.
Essa combinação de fatores expõe bem a estrutura inusitada da
operação montada para garantir
R$ 1 bilhão aos produtores de soja
e que deixará a conta para ser paga no ano que vem. "Nunca vi restos a pagar programados. Isso é
uma novidade total. Não é uma
boa prática fiscal", diz Raul Velloso, especialista em contas públicas.
(SHEILA D"AMORIM)
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