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ARTIGO
A mais nova odisseia da Grécia
THOMAS FRIEDMAN
DO "NEW YORK TIMES", EM ATENAS
Para o líder de um país cujas
finanças vêm causando susto
ao planeta há meses, o primeiro-ministro grego, George Papandreou, ostenta uma calma
quase zen, digna de Obama.
Ele acaba de retornar de reunião com os demais líderes da
União Europeia, que decidiram
tentar evitar o colapso da Grécia e racha no bloco por meio de
uma demonstração de força esmagadora -prometendo quase
US$ 1 trilhão em apoio à economia de qualquer país-membro
que venha a ter dificuldades.
Mas, em um almoço cujo cardápio incluía peixe grelhado e
salada grega, Papandreou deixou claro que está ciente de que
o acordo da UE não é uma simples troca de dinheiro de resgate por cortes orçamentários.
Não: se considerarmos com
atenção o que será preciso para
que a Grécia corrija sua economia, estamos falando de uma
troca de verbas de resgate por
uma revolução. Todo o sistema
econômico e político do país terá de mudar, se a Grécia quiser
cumprir sua parte do trato.
Papandreou diz que está
pronto e que o mesmo se aplica
ao país. "As pessoas apelam para que eu mude o país, sabem
que mudanças são necessárias.
Ninguém desejaria perder essa
oportunidade."
Em um restaurante instalado
no topo de um edifício, com vista para a Acrópole, peço que Papandreou me conte como foi
ser alvo de caçada para o pessoal das transações eletrônicas
de títulos por seis meses.
"Por conta da crise de 2008,
todos os agentes de mercado se
tornaram mais avessos a riscos,
e por isso eles atiram rápido",
diz o primeiro-ministro de centro-esquerda, eleito em outubro para consertar a bagunça.
Os agentes do mercado são
"como um animal ferido, que
recua ante o menor movimento. Por isso, qualquer boato pode tornar realidade as profecias
desfavoráveis que contém".
Comparar os protagonistas
do mercado de títulos a bestas
selvagens talvez seja injusto para com as bestas, ele sugere. Esses mercados "nem mesmo são
humanos, hoje. Algumas dessas
coisas funcionam de forma
computadorizada e operam em
modo automático" ao perceber
qualquer sinal de problema.
"Agora teremos uma folga",
disse Papandreou, não para relaxar, mas para que o governo
inicie "as profundas mudanças
-a pequena revolução" na forma pela qual o país é governado, com ênfase na mudança do
sistema de incentivos, de modelo que estimulava os gregos a
procurar empregos públicos vitalícios a outro cujo foco será
estimular a iniciativa privada.
O gabinete do país já aprovou
elevar a idade de aposentadoria
mínima dos funcionários públicos dos 61 para 65 anos. Os
salários médios do funcionalismo foram reduzidos em 20%, e
as aposentadorias, em 10%.
O imposto por valor adicionado subiu de 19% para 23%, e
os tributos sobre combustíveis,
álcool e tabaco subiram 30%.
O governo quer reduzir o número de municípios de mil para
400 e o de companhias estatais
de 6.000 para 2.000, para poupar dinheiro e reduzir a burocracia. Até o momento, o deficit
já caiu 40% ante o de 2009.
Mas Papandreou, cujo carro
oficial é um híbrido Prius, diz
que, para sustentar essas dolorosas reformas, os gregos precisam se tornar participantes do
processo. E isso só acontecerá
se houver senso de "justiça"
-os gregos querem ver processos contra os grandes sonegadores- e se o povo sentir que
seus líderes têm visão.
"Precisamos dar um sonho a
este país", para que os sacrifícios façam sentido.
"Vamos trazer as melhores
práticas da Europa e do mundo
para reformar o país", diz Papandreou. "É difícil, e haverá
protestos, mas será um dos períodos mais criativos que a Grécia terá vivido."
Será que a Grécia é capaz de
uma revolução cívica? As chances parecem precárias, mas não
será necessário consultar o
FMI para determinar a resposta. Basta observar os jovens. Se
em seis meses eles estiverem
emigrando, aposte contra a
Grécia. Se os vir decidindo ficar, talvez seja hora de comprar
um ou dois títulos gregos.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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