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Imposto de Renda e o grande debate nacional
ALOYSIO BIONDI
A grande crise está aí, é hora
de reflexão. Ameaça ao país: já
começou o blablablá aparentemente "patriótico", de que é hora de união nacional, é preciso
aprovar tudo o que o governo
quer e "et cetera" e tal. Ora
bolas, nos últimos três anos
houve unanimidade cega, "carta branca total" ao presidente
Fernando Henrique e sua equipe, por parte de formadores de
opinião -de jornalistas e líderes empresariais.
Por isso mesmo, por causa
dessa "lavagem cerebral", a
opinião pública assistiu, inerte,
o país caminhar para o desastre. Não. Não é hora de "unanimidade" burra, mais. É hora de
debater. Questionar. Fazer análises corretas, utilizando estatísticas. Informar a sociedade.
E, principalmente, abrir espaço
para as vozes discordantes: nos
últimos três anos, elas foram
expulsas dos meios de comunicação.
Um exemplo ilustrativo? Todas as vezes em que a oposição
conseguiu convocar um ministro ou um presidente ou diretor
do Banco Central para depor, o
que aconteceu? Os meios de comunicação repetiram a rotina:
publicaram ou divulgaram páginas inteiras com as explicações das "autoridades". Perguntas feitas por deputados ou
senadores, questionando as versões oficiais? Nem uma linha.
Espaço, só para os porta-vozes
de Brasília.
Assim a sociedade foi engabelada. Assim o país caminhou
para o desastre. Assim se deu a
impressão de que a oposição, os
críticos, não tinham nada a dizer. E a equipe FHC reinou, absoluta, cometendo os maiores
disparates. Isso continua a
acontecer, neste momento de
"pacotes".
Dólares e IR
Engraçado, se não fosse trágico -já que a sociedade vai pagar o preço da crise. Agora, da
noite para o dia, surgem banqueiros, analistas, economistas,
dizendo que o Brasil precisa de
algo como US$ 60 bilhões em
1998. Metade para cobrir o
rombo do próprio ano. Metade
para renovar empréstimos dos
mais diversos tipos, tomados no
exterior pelo governo ou empresas privadas (crédito para importar, crédito para exportar,
crédito para especular no mercado financeiro).
É cômico comparar as análises "especializadas" de agora,
depois da crise, e as análises
dias antes da crise. Dizia-se que
estava tudo "cor-de-rosa". Tudo ótimo. Uai. Esses analistas
não viam, todos os meses, todos
os dias, estatísticas mostrando
o buraco em que o Brasil estava
se enfiando? Só agora descobriram o "rombo" de US$ 60 bilhões? Isso é análise econômica?
Ou religião dos adoradores irracionais da equipe FHC?
Do "pacote", o ponto que provocou indignação foi a elevação do Imposto de Renda. Não
é descabida a suposição de que
essa medida foi planejada exatamente para isso: provocar revolta, e ser então maquiavelicamente "trocada" pelo aumento da CPMF. A "troca" não
deve ser aceita. Dentro de um
verdadeiro debate, surgirá outra saída, totalmente diferente:
é preciso aproveitar o "pacote"
para mudar a vergonhosa política de cobrança do Imposto de
Renda implantada no país pela
equipe FHC, sem um tugido
nem mugido da opinião pública. O presidente FHC fez uma
reforma tributária às avessas.
Com a aprovação do Congresso, reduziu as alíquotas para os
ricos e riquíssimos, e aumentou
para a classe média e os mais
pobres. Deixou apenas duas alíquotas: ou o brasileiro paga
15%, ou paga 25%. Como esta
Folha mostrou ainda ontem, o
Imposto de Renda é realmente
progressivo, isto é, cobra-se
mais de quem tem rendimentos
maiores, no mundo todo. Chile?
Até 45%. México? Até 35%.
EUA? Até 40%. Coréia? Até
45%. Inglaterra? Até 45%.
O Congresso deve aproveitar
o "pacote" para rediscutir a
vergonhosa política fiscal brasileira. Começar a corrigir as
monstruosidades da equipe
FHC. Basta olhar o exemplo externo.
A saída?
O Japão, para impedir que as
importações destruam empresas e empregos locais, cobra imposto de 16% para a maioria
dos produtos estrangeiros ("tarifa modal", dizem os especialistas). A Coréia do Sul, 23%.
No Brasil, a tarifa ou imposto
que recai sobre a maioria dos
produtos (tarifa modal) é de
zero. Obra incrível da equipe
FHC, e não do ex-ministro Ciro
Gomes ou do governo Collor. O
"pacote" não mexeu nas tarifas. Manteve o mercado escancarado. Por isso mesmo, o rombo continuará, a crise avançará. O resto é blablablá.
Aloysio Biondi, 60, é jornalista econômico.
Foi editor de Economia da Folha. É diretor-geral do grupo Visão. Escreve às quintas-feiras no caderno Dinheiro.
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