São Paulo, domingo, 14 de março de 2004

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Analistas divergem sobre alcance e momento ideal para mudança

DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo entre economistas que defendem mudanças no regime de metas de inflação, há dúvidas sobre como e quando implementá-las.
Alguns especialistas avaliam, por exemplo, que este não é o momento ideal para o governo modificar as regras do regime de metas.
"Acho que um momento em que o PT fica discutindo com o próprio PT os rumos da política econômica não é o ideal para mudanças desse tipo", diz Fernando de Holanda Barbosa, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas).
Outro ponto de discussão diz respeito a quais mudanças poderiam ser feitas. Nos países que adotam expurgos no índice de inflação, os preços excluídos variam. Alguns deixam de fora da meta apenas os efeitos que aumentos de juros têm sobre o índice, outros excluem as variações dos preços de petróleo e de alguns alimentos.
"As medidas de núcleo também apresentam problemas. É complicado decidir o que excluir no caso de um índice por exclusão ou o que o aparar no sistema de metas aparadas", diz José Júlio Senna, sócio-diretor da MCM Consultores.
Segundo Tito Nícias, economista do BC, seria errado, por exemplo, excluir da conta os preços administrados que, ironicamente, na opinião dele, são os maiores responsáveis pelas pressões inflacionárias que levaram ao descumprimento da meta nos últimos anos:
"O governo FHC fez uma privatização absurda que, em vez de buscar maximizar o bem-estar social, fez contratos corrigidos por índices indexados ao dólar que buscavam atrair compradores e maximizar a receita das vendas", diz Nícias, que faz doutorado na Universidade Oxford, no Reino Unido.
Apesar disso, Nícias é contra o expurgo dos preços administrados do núcleo inflacionário.
"Se você exclui os preços administrados, a inflação real, sentida pelos consumidores, será sempre maior que a inflação perseguida, porque esses preços apenas sobem", diz Nícias.

Horizonte
Alguns analistas acreditam que a mudança ideal no sistema seria o abandono do período fechado no calendário de um ano para o cumprimento da meta.
Os países que praticam o regime de metas de inflação perseguem seus alvos em períodos que variam, em média, de um (caso do Brasil) a três anos.
"Isso daria maior flexibilidade à política monetária", diz Alexandre Maia, economista-chefe da Gap Asset Management.
Outros economistas acreditam que basta o BC perseguir um ponto acima do centro da meta neste ano para resolver a ameaça de que os juros altos prejudiquem o crescimento.
"Eu defendi, em 2001 e 2002, que o BC tivesse adotado alguma medida de núcleo. Mas acabou-se optando por alargar a banda. Hoje, acho que isso já traz flexibilidade suficiente ao sistema", diz Sérgio Werlang, considerado um dos pais do regime de metas brasileiro, que deixou o BC em 2001.
Embora a política monetária restritiva tenha efeitos negativos sobre a economia, especialistas enumeram outros freios à retomada do crescimento.
"Falta melhorar muito a situação fiscal e promover uma abertura maior da economia", diz Paulo Leme.
Alexandre Bassoli, economista-chefe do HSBC, acrescenta que o afrouxamento da política monetária no Brasil teria efeitos limitados sobre a atividade econômica. Como há limites à expansão da economia impostos, por exemplo, por baixa capacidade instalada em alguns setores, a tendência é que, a partir de certo patamar de juros reais, as pressões inflacionárias voltem.
"O BC teria de aumentar os juros novamente. Além disso, a experiência mostra que os ganhos de um afrouxamento dos juros para fins de crescimento são efêmeros, e os custos, altos."



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