São Paulo, domingo, 14 de setembro de 2008

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Em crise, Parmalat busca fazer caixa

Retração do mercado e alta no preço do leite obrigam empresa a fechar fábricas, vender ativos, marcas e fazer demissões

Dificuldades são comuns a outras empresas do setor; para analistas, queda de 93% no valor dos papéis da companhia é exagerada

CRISTIANE BARBIERI
DA REPORTAGEM LOCAL

Fechamento de fábricas, venda de marcas e ativos, demissões, prejuízos acumulados, ações virando pó. Pela segunda vez em sua história, a Parmalat vive no Brasil um filme de horror empresarial.
Só que, agora, dizem controladores e analistas de mercado, apesar de o roteiro parecer o mesmo, a situação da empresa é completamente diferente e o final da história, por conseqüência, poderá ser outro.
Se, em 2004, a crise foi impulsionada pela expansão desmedida e desvios de caixa atribuídos aos controladores italianos, desta vez, as causas das dificuldades são diferentes e, em alguns pontos, comuns a outras empresas do setor. Segundo especialistas em agronegócio, as dificuldades começam com o fato de que a retração do consumo, causada pela inflação, foi somada à alta no preço do leite.
No caso da Parmalat, no entanto, o cenário recessivo pegou a empresa num momento de aquisições e forte endividamento. Com fluxo de caixa negativo, demanda por capital de giro e os R$ 500 milhões obtidos na abertura de capital já investidos, restou à controladora da Parmalat, o fundo de investimentos Laep, cortar despesas.
"A expansão acelerada foi um erro de gestão", afirma André Gordon, sócio-gestor da GTI Administração de Recursos.
Houve ainda outros agravantes. O escândalo da fraude do leite, no qual cooperativas foram acusadas de adicionar soda cáustica e água oxigenada ao produto, pouco antes da abertura de capital do Laep, também afetou suas vendas.
Além disso, a Parmalat também foi punida ao optar pela emissão de BDRs (Brazilian Depositary Receipts) em vez de ações no Novo Mercado. Com a quebra e a prisão dos controladores da empresa de agronegócio Agrenco, ficou claro para os investidores que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), tem controle reduzido sobre os emissores de BDRs.
"O Laep foi punido pela imagem ruim dos BDRs", diz Gordon. "Além disso, por ser um fundo de private equity [investimentos em empresas fechadas], o Laep se comunica mal com o mercado."
Outro agravante do cenário foi a venda, no início do mês, das ações do Laep que estavam nas mãos do fundo de investimentos americano Gavião. Sozinho, o fundo era dono de 24,36% da empresa. As ações foram vendidas ao UBS de Londres e ainda estão no mercado. "Ao vender um lote desse tamanho, num momento em que ninguém está interessado na empresa, os papéis caíram mais ainda", diz Gordon.
Na sexta-feira, as ações da Laep eram cotadas a R$ 0,59. Na virada do ano, o papel valia R$ 8,20.
Segundo analistas, a queda é exagerada. Apesar de as ações disponíveis somarem R$ 85 milhões, os ativos do Laep valem quatro vezes esse valor.
A marca Parmalat também é uma das mais valiosas do setor e a empresa é a única a ter distribuição nacional. Além disso, os planos da Integralat, outra empresa do grupo que pretende estruturar a produção de leite, devem começar a dar resultados até o meio de 2009, quando a empresa terá 26 mil vacas de maior produtividade.
O Laep também está preocupado em fazer caixa. Nas últimas semanas, fechou fábricas, colocou o jato corporativo à venda e vendeu a Poços de Caldas pelos mesmos R$ 50 milhões com os quais a comprara, quatro meses antes.
Também pediu permissão à Justiça para leiloar equipamentos herdados da antiga Parmalat, seguindo o plano de reestruturação anunciado na conferência de investidores. "O Laep está fazendo aquilo em que realmente é bom -reestruturar empresas", diz Gordon.

Formalização do setor
A Parmalat também tem atuado, junto às demais empresas do setor, para tentar formalizar o mercado leiteiro, um dos mais atrasados do agronegócio brasileiro. Os processadores de leite têm feito pressão junto a supermercados, fornecedores, entidades de classe e governo para tentar reduzir a informalidade, a sonegação e, principalmente, aumentar a fiscalização em empresas que não seguem os procedimentos estabelecidos pela legislação sanitária.
A empresa também admitiu mudar a classe de suas ações. "A vantagem [do BDR] é que podemos controlar a companhia mesmo não tendo 51% dela", afirmou Marcus Elias, presidente do Laep em recente conferência de investidores.
Como pensavam em fazer mais emissões, o capital dos controladores seria diluído e o controle poderia ser perdido. "Mas o mercado está muito antipático à estrutura de BDR", disse Elias aos investidores. "Estamos levando isso em consideração e [estudamos] eventualmente mudar a estrutura de BDR e unificar as ações."



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