São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 2006

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BENJAMIN STEINBRUCH

A bola está quicando


A área ambiental é uma oportunidade para o Brasil se apresentar como parceiro desejável ao mercado dos EUA

A INVASÃO americana no Iraque, para combater e eliminar o terrorismo, feita em nome da paz, já sacrificou quase três vezes mais pessoas do que as duas bombas atômicas detonadas sobre o Japão na Segunda Guerra Mundial.
Talvez isso justifique a avalanche democrata que atingiu os EUA na semana passada. Nas eleições legislativas, o partido republicano de George W. Bush perdeu a maioria que mantinha havia 12 anos na Câmara e no Senado. Além disso, os democratas passaram a ter 28 governadores, e os republicanos, 22. Para a totalidade dos analistas, a principal causa da derrota republicana foi a intervenção militar de Bush no Iraque, que, além de provocar centenas de milhares de mortes, expôs um esquema de desvios milionários de recursos para a reconstrução do Iraque.
A derrota acachapante de Bush não foi boa notícia para o Brasil. Ela veio no momento em que o reeleito governo Lula prepara uma reaproximação comercial com os EUA, para corrigir um erro cometido nos últimos anos, quando buscou ampliar o intercâmbio com o mundo emergente e perdeu terreno no mercado americano.
Por definição, os democratas, que agora vão dominar o Congresso, são mais protecionistas que os republicanos. Essa é a lógica, embora ela nem sempre prevaleça. Bush, por exemplo, no seu primeiro mandado, foi mais protecionista do que o democrata Bill Clinton e impôs pesadas taxações sobre a importação de aços, que prejudicaram diversos países exportadores, entre eles o Brasil.
De qualquer forma, no próximo biênio, uma fase de preparação para as eleições presidenciais de 2008, os democratas tenderão a bloquear qualquer iniciativa generosa de Bush em relação a parceiros comerciais emergentes. Falarão sempre mais alto os lobbies regionais, principalmente agrícolas.
Um tema que afeta diretamente o Brasil é a renovação do SGP (Sistema Geral de Preferências), programa comercial que expira em 31 de dezembro e beneficia países em desenvolvimento com isenções tarifárias em suas exportações para os EUA. No ano passado, produtos brasileiros no valor total de US$ 3,5 bilhões foram exportados para o mercado americano via SGP. Esse fluxo comercial poderá ser prejudicado se o programa não for renovado pelo Congresso americano, porque as exportações passarão a ser taxadas em 8% para ingressar nos EUA.
Alguns líderes republicanos já defendiam a exclusão do Brasil do SGP. Com a maioria democrata, mesmo que Bush se empenhe em manter o Brasil entre os países que recebem a preferência comercial -o que é pouco provável, porque o tema não desperta interesse na diplomacia comercial americana-, enfrentará dificuldades no Congresso.
Será, portanto, um biênio difícil, no qual o bloqueio de iniciativas do presidente Bush poderá se tornar uma constante no Congresso. Os acordos comerciais de livre comércio, que Bush procurou estimular na América Latina, podem entrar em compasso de espera, e um eventual entendimento com o Mercosul torna-se totalmente improvável.
Caberá então ao Brasil, nesse período, um esforço comercial redobrado para se apresentar como parceiro desejável ao mercado americano. Há oportunidades, por exemplo, na área ambiental. Bush não perdeu as eleições apenas por causa do Iraque. Entre outras razões, está a política que adotou na área ambiental.
Em sua gestão, os EUA se recusaram a aderir ao Protocolo de Kyoto, pelo qual os países aceitam reduzir as emissões de gases que provocam o aquecimento global em 12% até 2012.
A questão ambiental entrou no foco das preocupações do cidadão americano. Arnold Schwarzenegger, republicano, foi reeleito governador da Califórnia porque se afastou de Bush e adotou ambiciosa legislação ambiental em seu Estado para reduzir o efeito estufa. Dez em cada dez personalidades dos EUA que visitam o Brasil elogiam o programa brasileiro do etanol. Nessa área, a bola está quicando para o Brasil.


BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
bvictoria@psi.com.br


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