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Serviços de recolocação crescem na crise
Contratos com consultorias de "outplacement", que ajudam a demitir e recolocar pessoal, aumentaram 20% em novembro
Empresas contratam mais assessorias para demitir sem manchar sua imagem; para especialistas, cortes são muito maiores que crise
RENATO ESSENFELDER
DA REDAÇÃO
Poucos setores escaparam da
onda de cortes das últimas semanas no país. Bancos, construtoras, montadoras e indústrias pesadas e ligadas a commodities em geral demitiram.
Boas notícias só para quem ajuda a administrar o enxugamento: o número de contratos com
consultorias de "outplacement" -que auxiliam na demissão e na recolocação de funcionários- cresceu em média
20% no mês passado no país.
"Em outubro sentimos até
um leve declínio nos contratos,
mas novembro foi um mês acima da média, com crescimento
de entre 15% e 20% no número
de contratos. Mais empresas
estão demitindo executivos",
diz José Augusto Minarelli,
presidente da Lens & Minarelli,
uma das primeiras consultorias
de "outplacement" do país.
Segundo ele, que trabalha
com cortes no alto escalão -em
que o potencial de economia às
companhias é maior-, também o tempo estimado para a
recolocação de pessoal cresceu.
Se até setembro a estimativa
era de seis meses de caça a uma
vaga, agora o prognóstico é o de
que a busca se estenda entre
nove meses e um ano.
No outra ponta do processo
de corte -a admissão-, o movimento foi simétrico. "Outubro e novembro foram meses
recorde de aplicação de currículos em nossa base de dados.
O crescimento foi de cerca de
25%", afirma Paulo Pontes,
presidente da Michael Page no
país -grupo internacional de
recrutamento focado em "middle management", o meio da pirâmide funcional.
A maior procura pelo serviço
não se traduz, contudo, em
mais vagas disponíveis. Pelo
contrário. "Diminuiu o número
de postos no mercado", diz
Pontes. Como reflexo, ele mesmo diz que teve de se adequar
aos novos tempos, dispensando
20 de seus 170 colaboradores
-reflexo da gangorra que agora
pende mais para os serviços de
demissão do que para os de
contratação no país.
E, curiosamente, a maioria
dos novos currículos em busca
de oportunidade é de profissionais ainda empregados -mas já
temerosos dos impactos da crise sobre os seus atuais empregadores.
No Grupo Foco, também dedicado a "hunting" (seleção de
talentos), a proporção foi similar. "A oferta de executivos no
mercado aumentou 20% em
novembro", contabiliza Leyla
Galetto, diretora-executiva da
Stanton Chase International,
divisão de recrutamento de altos executivos do grupo.
Segundo ela, as empresas não
deixaram de contratar diretores e presidentes -vagas estratégicas demais para serem extintas sem prejuízo ao negócio.
Nos escalões inferiores, o impacto foi maior.
Superdosagem
Especialistas em gestão de
pessoas consultados pela
Folha são unânimes em afirmar, contudo, que o remédio
tem sido muito mais amargo
que a doença até agora.
"É preciso saber distinguir o
que é a crise do mercado e o
que é a crise da empresa. As
companhias também estão
usando a crise como desculpa
para rever os seus quadros",
avalia Sofia Esteves do Amaral,
presidente do grupo DMRH,
que atua no recrutamento de
diversos níveis profissionais.
"As empresas aproveitaram a
crise para demitir funcionários
que estavam havia tempos a
perigo", concorda Galetto. "A
maior preocupação agora é
com o efeito manada: companhias que tinham boas perspectivas acabam reduzindo investimentos. Os cortes ficam
preventivos", completa Pontes.
Mas outro fator que deve ser
levado em conta, diz Galetto, é
a intensificação de operações
de fusão e aquisição entre empresas -especialmente em
tempos de ativos muito depreciados na Bolsa de Valores. Esses processos naturalmente levam à integração entre equipes, à detecção de redundâncias e aos enxugamentos.
O segmento de treinamentos
corporativos, que viveu um
boom nos últimos anos e no
qual pipocaram formatos exóticos (palestras com militares,
caminhadas sobre brasas,
acampamentos na mata como
forma de integrar e motivar
trabalhadores), foi o primeiro a
sentir o baque. "Nessa área, a
queda chega a 50%", diz Amaral, relatando também recuo de
10% nos contratos da DMRH
para preenchimento de vagas
em novembro -embora a relação com o cenário econômico
não esteja ainda clara para ela.
"Pode ser efeito da crise ou
apenas sazonal."
Mas um efeito duradouro da
crise, estima, será a revisão das
práticas de remuneração muito
agressivas e do perfil dos profissionais mais visados, que
precisarão lidar melhor com
crescentes pressões (leia texto
abaixo). "Há três meses, o investimento motivava a contratação. Hoje, procura-se gente
boa para gerenciar a crise que
está aí", afirma Pontes.
Para ele, o bom momento da
indústria de "outplacement"
deve virar. "Em um primeiro
momento, as empresas buscam
assessoria para demitir e manter a boa imagem. Em um segundo momento, o serviço declina, porque é dispendioso."
"A crise passará logo, e as
empresas que não estiverem
preparadas vão perder a retomada", diz Amaral -que avalia
que a partir do segundo semestre de 2009 a gangorra do trabalho penderá novamente para
o lado das contratações.
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