São Paulo, sexta, 15 de janeiro de 1999

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A fórmula Chico Lopes

O Banco Central tinha duas saídas para flexibilizar o câmbio. A primeira, dar um reajuste grande e deixar o câmbio flutuar. A segunda, dar um reajuste menor e tentar manter o controle sobre as bandas. Em qualquer hipótese, BC e Fazenda deveriam preparar um plano de divulgação não apenas nacional, mas mundial. O plano não existiu.
Defensores da primeira hipótese invocavam o princípio de Maquiavel, segundo o qual o mal se faz de uma vez e o bem, aos poucos. Dando um reajuste próximo ao que o mercado esperava -entre 20% e 30%- as pressões adicionais por novos reajustes seriam aliviadas, e poderia ocorrer até uma apreciação posterior do câmbio. Além disso -sustentam esses analistas-, se o movimento é sempre para cima, a troco de que manter uma banda. Com a banda, seja qual for o teto dado, o mercado vai buscá-lo.
Risco havia em qualquer alternativa. A fórmula imaginada por Francisco Lopes antecipou os reajustes cambiais. Depois faria o câmbio desvalorizar-se mais lentamente, permitindo com isso uma redução nas taxas de juros praticadas pelo Banco Central -já que o componente de desvalorização futura poderia cair de 7% para algo em torno de 3%.
A nova fórmula de bandas cambiais "endógenas" prevê a mudança do teto e do piso a cada três dias úteis, de acordo com fórmulas matemáticas pré- definidas.
A fórmula proposta por Chico Lopes é de aumentar o teto da banda cambial sempre que o dólar estiver no piso; e de aumentar o piso sempre que o dólar estiver no teto. Se o dólar está no piso, significa mercado calmo: então amplie-se o teto. Se estiver no teto, mercado nervoso: então amplie-se o piso.
Simulações matemáticas com a fórmula indicam a seguinte situação.
1) Se a taxa permanecer no teto durante todo o ano (243 dias, ou 80 viradas), no final do ano o dólar estará em R$ 1,3542, representando uma desvalorização de 12,04% em relação a 30 de dezembro passado.
2) Se a taxa permanecer no meio, o dólar estará em R$ 1,2943, uma desvalorização de 7,08% -o mesmo que se teria com a política cambial anterior.
3) Na hipótese improvável da taxa permanecer no piso, a desvalorização será de 2,11%.
Portanto o ritmo de reajustes foi apenas antecipado, não significando ruptura forte com o ritmo anterior. Mas, para um mercado que se guia pelo cheiro, a fórmula exige um tempo maior para ser assimilada.
Homem da política monetária, Lopes pensou na melhor fórmula para dar previsibilidade aos juros. Mas faltava a previsibilidade no câmbio. Na Bolsa de Chicago, o dólar estava cotado ontem a R$ 1,42 para fevereiro, porque não se acreditava, em sã consciência, na capacidade do BC de segurar um reajuste modesto.
No Brasil, foi um dia de corrida intensa à procura de hedge. O mercado amanheceu relativamente tranquilo, mas andando sobre o fio da navalha. Durante o dia, boatos de dificuldades de um pequeno banco carioca e a saída do diretor de fiscalização, Gustavo Mauch, precipitaram o segundo round do ataque.
Como os mercados de câmbio futuros não operaram a contento -devido aos ajustes de preços feitos pela BM&F- o hedge ou foi com dólar pronto ou com depósitos interbancários. A visão do operador é que, se o câmbio desandasse, o BC teria de qualquer modo que elevar substancialmente as taxas de juros. Isso fez o futuro DI projetar taxas de 70% este mês.
O dia terminou com pessimismo generalizado entre os bancos estrangeiros e com as avaliações internacionais indicando que o país perdeu o primeiro roud da mudança de expectativas.
De qualquer modo, há mais fumaça do que fogo, por enquanto. A saída de dólares foi inferior ao que se temia e os bancos estrangeiros não exibem a velha vitalidade para produzir os maremotos causados em outras economias.
Os próximos dias serão de incerteza. Não existe mais a âncora cambial, já que o nível de reservas é baixo. E não existe por enquanto a âncora política, situação agravada pelo estresse do presidente, que se retirou para sua fazenda em Buritis.
O fim-de-semana vai ser crucial para refazer as expectativas. Será importante que governadores, lideranças políticas e o círculo próximo de amigos do presidente se unam neste momento, visando preparar a estratégia para segunda-feira.

E-mail: lnassif@uol.com.br



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