São Paulo, quinta-feira, 15 de abril de 2010

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Moeda dos Brics é só um exercício intelectual, diz OMC

Segundo Pascal Lamy, que chega amanhã ao Brasil, a ideia de usar as próprias moedas é uma "expressão política" dos países

Lamy diz não ver problema na pauta comercial do Brasil, cujas exportações estão hoje concentradas em matérias-primas


LUCIANA COELHO
DE GENEBRA

A ideia debatida por Brasil, Rússia, Índia e China de passar a fazer comércio entre si com suas próprias moedas é um "exercício intelectual interessante" e uma "expressão política" dos quatro emergentes. E só, avalia o diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, Pascal Lamy, que desembarca amanhã à noite no Brasil.
Sua visita coincide com o fim, em Brasília, da cúpula dos Brics, que começa hoje e deve resvalar no tema da moeda.
"É uma escolha técnica. Haveria uma expressão política dos países emergentes nisso", disse Lamy anteontem. O francês que comanda a OMC há quatro anos e meio recebeu jornalistas brasileiros em seu amplo gabinete.
A entrevista, na qual ele elogiou o desempenho do Brasil durante a crise e a consolidação da economia nos últimos dez anos ou pouco mais, antecipou a agenda da viagem, que inclui um encontro com o chanceler Celso Amorim, no sábado, e uma visita a uma indústria produtora de álcool no Estado de São Paulo, no domingo.
Antes, ele passa pelo Chile e depois por Uruguai e Argentina, de onde segue para os EUA.
No Mercosul, espera ouvir propostas convergentes sobre o que manter na mesa de negociação e como reavivar a Rodada Doha para liberalizar o comércio global, que, a seu ver, segue sem prazo. "[Termina] quando houver um acordo sobre os 20 tópicos [centrais acordados como espinha das negociações]. No momento, ainda há 20 tópicos a discutir", diz, admitindo compartilhar da frustração geral com o impasse.
Ainda assim, Lamy diz não esperar que os países reduzam seus níveis de ambição sobre a rodada -porque, afinal, não há consenso nem sequer sobre como resumir os pontos. Em pauta desde 2002, a negociação "travou" há quase dois anos no que a maioria atribui à falta de vontade política nos EUA.
De qualquer forma, o economista ressalta o sistema e cita como exemplo de seu bom funcionamento o caso do algodão subsidiado americano, vencido pelo Brasil em novembro, após sete anos de debate. No momento, os dois países conversam para chegar a um acordo e evitar a aplicação de até US$ 830 milhões em sanções por Brasília, já engatilhadas.
Ele não acha que um eventual entendimento possa fragilizar a discussão sobre o algodão na esfera de Doha, como temem os países africanos produtores. Sem algodão, diz o francês, não se fecha a rodada.

Instrumento útil
Lamy não é a favor da retaliação, mas a vê como um instrumento útil para conter violações. "Se o Brasil pediu a retaliação e a retaliação cruzada [sanções em área diversa à disputa], é porque acredita que não teria como obter [o que quer] de outro jeito", afirmou, ao ser indagado se não havia um paradoxo em inibir restrições ao comércio usando exatamente restrições ao comércio.
Quanto à pauta comercial brasileira, cujas exportações hoje se centram em matérias-primas (e as importações, em manufaturados), o diretor da OMC não vê problemas.
"No fim das contas, a pergunta a um país como o Brasil é como se inserir no comércio internacional de uma forma que ele contribua para [gerar] emprego, e, num segundo momento, empregos bem pagos."


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