São Paulo, terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BENJAMIN STEINBRUCH

Uma pulga atrás da orelha


Há uma crescente percepção de que o real esteja exageradamente valorizado, por conta de especulação

HAVIA TEMPOS não se ouvia falar em "bolha", palavra que ressurgiu no vocabulário do economês nas últimas semanas. O professor da Universidade Princeton e Prêmio Nobel de Economia Paul Krugman esteve no Brasil no início de dezembro e deixou um alerta: "O Brasil está indo bem, mas isso não significa que se tornará uma superpotência econômica no ano que vem". Para esse economista, os mercados estariam agindo como se isso fosse ocorrer em 2010.
Krugman e outros economistas, quando falam em bolha, citam a valorização nas Bolsas de Valores, principalmente nos países emergentes, entre os quais o Brasil. Aqui, a Bolsa de Valores de São Paulo já subiu 85% no ano.
Os mercados de ações dos quatro Brics (Brasil, Rússia, Índia e China) receberam uma infusão de recursos de investidores estrangeiros de mais de US$ 65 bilhões de janeiro a novembro.
Nouriel Roubini, esse um professor acostumado a prever catástrofes, acha que a economia mundial corre o risco de sofrer um novo abalo. Tanto Krugman como Roubini estão de olho no mercado de câmbio. Para enfrentar a crise econômica internacional, os Estados Unidos reduziram sua taxa básica de juros quase a zero e a mantêm nesse nível.
Países europeus e o Japão fizeram o mesmo.
Isso deu força a um movimento que os financistas chamam de "carry trade". Os investidores tomam empréstimos a custo quase zero nesses países de juros baixos e aplicam o dinheiro com grandes margens em outras nações nas quais as taxas ainda são muito altas, como o Brasil -a taxa básica no Brasil é de 8,75% ao ano, e a dos Estados Unidos, de zero a 0,25% ao ano.
Em meio ao otimismo generalizado que reina na economia do país, o alerta sobre a formação de uma nova bolha surge como uma pulga atrás da orelha dos brasileiros. O resultado do PIB (Produto Interno Bruto) no terceiro trimestre, com um crescimento de 1,3% ante os três meses anteriores, decepcionou.
Embora as previsões para 2010 sejam ainda muito positivas, é preciso prestar atenção a uma observação bastante pertinente do professor Krugman. O boom econômico brasileiro, de acordo com o economista, não é suficiente para justificar o atual nível de valorização do real em relação ao dólar.
Há, portanto, uma crescente percepção de que a moeda brasileira esteja exageradamente valorizada, por conta de especulação. Seria muito importante que o governo brasileiro se esmerasse em cuidar desse problema. Na visão catastrofista de Roubini, por exemplo, a bolha atual poderá explodir se houver algum solavanco na economia mundial, com imediata valorização do dólar no mercado internacional. Na semana passada, o dólar já apresentou alta em razão das crises de Dubai e da Grécia.
Não é justo afirmar que as autoridades responsáveis pela política monetária e cambial estejam alheias ao problema do dólar. Já estabeleceram a cobrança de 2% de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) no ingresso de capital financeiro no país. O resultado dessa medida foi parcial: estancou a valorização do real, mas não repôs sua cotação para a faixa que seria confortável e remuneradora para o setor exportador.
Mas faltam novas iniciativas. Uma delas seria certamente a adequação da taxa básica de juros interna para atenuar a entrada de capital especulativo. Na semana passada, o Banco Central nem cogitou fazer isso. Perdeu mais uma oportunidade.


BENJAMIN STEINBRUCH , 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


Texto Anterior: Lula quer gás mais barato no Bolsa Família
Próximo Texto: Já falta mão de obra no setor de construção civil
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.